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Opinião

Dominar tecnologia e minar rivais: o que EUA tramam com megaplano de IA?

O Governo dos Estados Unidos lançou na segunda-feira (30) uma ordem executiva que detalha a visão da Casa Branca sobre inteligência artificial. O texto distribui trabalho para uma série de agências reguladoras e departamentos, que deverão, em prazos de 90 a 240 dias, preparar relatórios e tomar providências sobre temas de IA nos mais diversos setores.

Dominar e vigiar o progresso rival: o que diz a ordem executiva?

O texto da ordem executiva segue a linha adotada por várias outras estratégias sobre inteligência artificial: entre as propostas, há aquelas que procuram aproveitar as oportunidades e aquelas que visam a reduzir os riscos envolvidos no desenvolvimento e na aplicação de IA. Inovação responsável é a bola da vez.

Uma das ações mais destacadas no texto é a exigência para os desenvolvedores de sistemas avançados de IA compartilharem os resultados de testes de segurança e outras informações cruciais com o governo dos EUA. No campo de convergência entre biotecnologia e IA, a ordem procura ainda criar mecanismos de controle sobre a criação de materiais biológicos potencialmente perigosos.

Como a proliferação de conteúdo gerado por IA levanta preocupações sobre autenticidade e desinformação, o Departamento de Comércio ficou responsável por desenvolver orientações para autenticar conteúdo e marca d'água, permitindo que todos possam identificar claramente um conteúdo gerado por IA.

Iniciativas para desenvolver padrões de identificação e de autenticidade de conteúdo online vêm sendo debatidas por diversos países.

Na esteira do combate à desinformação criada por IA, o Japão vem incentivando essa discussão no contexto do Processo de Hiroshima, uma iniciativa do G7 para endereçar os principais desafios sobre inteligência artificial.

O governo americano também reconheceu que a IA pode intensificar riscos à privacidade por extrair, identificar e explorar dados pessoais. Nesse ponto, a Casa Branca conclamou o Congresso para aprovar legislação sobre privacidade e proteção de dados. A relação (e a tensão) entre o Executivo e Legislativo é um elemento que pode definir o futuro de vários dos pontos da ordem.

A proximidade histórica de Joe Biden com o tema da proteção aos trabalhadores também é sentida na ordem executiva. O texto enfatiza a necessidade de se desenvolver princípios e melhores práticas para maximizar os benefícios da IA para os trabalhadores. Aborda questões como transformações nas atividades de diversas profissões, vigilância no local de trabalho e vieses em aplicações de IA.

De olho na concorrência

A publicação da ordem executiva vem em um momento em que a corrida pela inovação no campo da inteligência artificial está a todo vapor. Por um lado, o texto norte-americano menciona a cooperação com outras nações para estabelecer estruturas internacionais robustas para aproveitar os benefícios da IA e gerenciar seus riscos. Por outro, enfatiza a necessidade de manter a liderança global dos Estados Unidos no tema.

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Nesse contexto, a ordem comanda que os diferentes setores do governo expandam a capacidade para receber imigrantes altamente qualificados, com experiência em áreas críticas, para estudar, morar e trabalhar nos Estados Unidos. Critérios existentes de vistos, entrevistas e avaliações devem ser modernizados e simplificados.

A disputa pela dianteira na corrida da inovação mira especialmente os avanços chineses. Chama a atenção a obrigação para provedores de processamento em nuvem, como Amazon, notificarem o governo caso entidades estrangeiras usem sua infraestrutura para treinar grandes modelos de IA.

Executivo e Legislativo

Na saída de reunião com Biden sobre a ordem executiva, o líder da maioria no Senado, o democrata Chuck Schumer, disse que o texto "é um bom começo, mas que o trabalho deve continuar através da edição de uma lei". Para o senador, há limites do que o Executivo pode fazer nessa área e o próximo passo precisaria ser dado pelo Congresso.

Schumer apontou que o texto a ser aprovado no Congresso deveria contar com o apoio de democratas e republicanos, e o foco deveria ser garantir o investimento necessário para implementar as medidas da ordem. Segundo ele,

Se não fizermos investimentos, vamos ficar atrás da China Chuck Schumer, senador norte-americano e líder da maioria no Senado

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E o Brasil?

A relação entre Executivo e Legislativo no tema de inteligência artificial não é estranha ao cenário brasileiro.

Por aqui, o Senado Federal vem debatendo a regulação da IA por meio de uma comissão temporária interna. Ela aprecia os textos do PL nº 21/20 (já aprovado na Câmara) e do PL nº 2338/23 (decorrente do trabalho de juristas dedicados ao assunto). O grupo tem até o final do ano para preparar uma proposta a partir dos projetos existentes e das contribuições feitas em uma série de audiências públicas.

Do outro lado, o governo prepara um posicionamento do Brasil sobre o tema da inteligência artificial para a reunião do G20, que acontece em setembro de 2024, no Rio de Janeiro. Nas audiências do Senado, não faltam vozes que defendam que a regulação da IA não deveria vir agora por uma lei geral, mas sim por medidas de diferentes agências reguladoras e órgãos governamentais.

O curso natural das coisas é todas essas iniciativas caminharem simultaneamente. O Congresso vai avançar com uma proposta legislativa, o governo vai apresentar uma visão geral no encontro internacional e as diferentes agências e órgãos vão disciplinar o impacto de inteligência artificial em suas áreas de atuação. Os processos sobre regulação de IA no Brasil seguirão juntos, misturados e — tomara que — coordenados.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

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