Será que o público brasileiro tem preconceito com games nacionais?
Desenvolvedores de maior destaque do Brasil falam sobre como suas produções são recebidas pelos compatriotas
Com quatro jogos para PC, a série "Momodora" é sucesso de crítica - com notas acima de 8 na mídia especializada - e já vendeu mais de 150 mil cópias em todo o mundo. Porém, segundo o site SteamSpy, apenas 4,3% desses jogadores moram no Brasil.
Detalhe: "Momodora" foi criado pelo brasileiro Guilherme "rdein" Martins, que assume ser um ilustre desconhecido em terras nacionais: "Tenho mais reconhecimento lá fora", diz o jovem de 24 anos, que prefere até usar o inglês nas redes sociais.
A ideia de que jogos nacionais não são bons é coisa do passado: além de "Momodora", há vários títulos de renome feitos no Brasil, como "Horizon Chase", "Chroma Squad" e tantos outros que já caíram nas graças do público internacional. Assim, fica a questão: por que o público brasileiro não joga mais as produções de seu próprio país?
De acordo com os próprios desenvolvedores e responsáveis pelas produtoras nacionais, há muito preconceito de uma porcentagem imatura do público brasileiro.
"Sempre me chamou a atenção como uma porcentagem - não sei se muito numerosa, mas muito barulhenta - de brasileiros critica o que é brasileiro, talvez porque desde crianças estejam educados a valorizar mais o que vem de fora, ou a desvalorizar o produto feito no país", diz Jesús Fabre, assessor da Aquiris.
O estúdio é responsável por "Ballistic Overkill", game de tiro recém lançado, e por "Horizon Chase", um verdadeiro sucesso que ganhou o título de melhor jogo do Big Festival 2016 e já chegou à marca de mais de 5 milhões de downloads - sendo que o Brasil está entre os três principais países em cópias vendidas do mundo.
A questão da falta de reconhecimento é reverberada por outros produtores: "Boa parte dos jogadores nacionais não conhece ao menos dez jogos nacionais e isso os levam a pensar que as produções daqui ainda são fracas", comenta Jasiel Macedo, da Skyjaz Games, desenvolvedora de "Pesadelo: O início", jogo de terror que caiu nas graças do youtuber "PewDiePie".
Para Jasiel, jogos de qualidade duvidosa feitos no passado podem ter queimado o filme do setor ante aos brasileiros: "Por mais que existam estúdios sérios e focados em entregar um melhor produto, ainda esbarramos em produções amadoras feitas por entusiastas que passam uma imagem errada sobre o desenvolvimento brasileiro", explica Jasiel.
"A galera quer um 'Call of Duty' brasileiro, um 'Halo', mas isso não vai sair", diz Amora Bettany, desenvolvedora do estúdio MiniBoss, para quem o preconceito existe porque o público espera games iguais aos produzidos lá fora: "Só que não faremos jogos iguais, não somente por conta da diferença do dinheiro e porte que o pessoal do exterior possui, mas também é importante lembrar que nosso estilo é diferente.
Segundo Thais Weiller, da JoyMasher, a recepção é positiva em geral. A desenvolvedora trabalha em produções com visual retrô de 8 bits como "Oniken" e "Odallus: The Dark Call", que fez um grande sucesso de crítica e conquistou o coração dos saudosistas.
"O público nos trata muito bem, não temos o que reclamar. Lá fora costumamos ter mais reconhecimento, mas não acredito que seja falta de receptividade dos brasileiros, e sim que o público daqui para nosso tipo de jogos é menor", diz Thais.
De acordo com Saulo Camarotti, fundador da Behold, a positividade do público foi uma construção lenta e contínua de comunidade. "Quando começamos em 2009, não existia ainda a cultura do jogo independente por aqui. As pessoas entendiam que jogo era AAA ou joguinho de celular."
A Behold Studios desenvolveu o sucesso "Chroma Squad", que tem mais de 250 mil jogadores pelo mundo, e outros games importantes como "Knights of Pen and Paper", que até já recebeu continuação.
"Com o tempo, fomos construindo uma comunidade de fãs, e muitos foram se identificando com a 'brasilidade' dos nossos jogos, que hoje são muito bem recebidos dentro do grupo de jogadores indie", explica Saulo.
De acordo com o fundador da Behold, a produção nacional é principalmente dividida em duas vertentes, sendo a primeira composta pelos pequenos produtores que fazem jogo como produto "que são focados em free-to-play, Facebook, mobile. E esse mercado de fato não tem uma comunidade gamer por trás. Na verdade a comunidade de console e PC rejeita esse tipo de produção."
Já a segunda vertente está presente nos PCs e consoles, mas ainda são games diferentes do que se vê normalmente na mídia, como os AAA. Temos jogos nacionais com pixel art, nostálgicos, abordando temáticas mais profundas e psicológicas.
"E eles também não combinam com os tradicionais gamers de grandes produções internacionais", continua Camarotti. "Basicamente, as duas principais vertentes que o Brasil produz não são atraentes para os gamers."
O caminho é longo, mas o cenário aos poucos está se modificando, o apoio para as produtoras nacionais está aumentando e o público é mais receptivo: "Quando começamos, há cinco anos, esse preconceito era bem mais recorrente", lembra Thais, da JoyMasher.
"Hoje parece ter diminuído bastante. A produção brasileira está muito mais diversificada e esse tipo de crítica é bem mais rara. Acho que hoje tem um jogo brasileiro para cada tipo de jogador", finaliza a desenvolvedora.
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