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Morre Rita Lee, a Rainha do Rock, aos 75 anos

De Splash, em São Paulo

09/05/2023 11h01Atualizada em 09/05/2023 12h52

Morreu aos 75 anos a cantora, compositora e escritora Rita Lee, a eterna Rainha do Rock. A informação foi divulgada no perfil oficial da artista no Instagram e na página de seu marido, Roberto de Carvalho.

Rita Lee deixa o marido, Roberto de Carvalho, os três filhos, Beto, João e Antônio.

No comunicado oficial, a família afirma que Rita Lee morreu nesta segunda-feira (8) em sua casa, em São Paulo, "cercada de todo o amor da família, como sempre desejou". O velório será nesta quarta-feira (10), das 10h às 17h, e será aberto ao público.

"Comunicamos o falecimento de Rita Lee, em sua residência, em São Paulo, capital, no fim da noite de ontem, cercada de todo o amor de sua família, como sempre desejou. O velório será aberto ao público, no Planetário do parque Ibirapuera, na quarta-feira, dia 10, das 10h às 17h. De acordo com a vontade de Rita, seu corpo será cremado. A cerimônia será particular. Nesse momento de profunda tristeza, a família agrade o carinho e o amor de todos."

Rita Lee: veja fotos da carreira da artista

Rita Lee, a eterna rainha do rock

Nascida em 31 de dezembro de 1947 em São Paulo, Rita Lee Jones de Carvalho é filha de Charles Fenley Jones, um dentista descendente de imigrantes norte-americanos, e de Romilda Padula, filha de imigrantes italianos. Caçula de duas irmãs e transgressora desde que se lembra, ela cresceu na Vila Mariana, bairro da zona sul de São Paulo que considerou especial durante toda a sua vida, e onde morou até o nascimento do primeiro filho, Beto Lee.

Durante a infância, Rita teve aulas de piano, mas não pensava em seguir a carreira musical. Os dotes artísticos, embora já existentes, a levaram a querer ser atriz. Durante um período, chegou a cursar comunicação social na USP (Universidade de São Paulo), mas abandonou a faculdade para seguir sua paixão pela música.

O interesse pela música surgiu na adolescência, quando descobriu Elvis Presley, Rolling Stones, Beatles entre outros. Começou a se apresentar em clubes locais junto a amigos.

Com canções com referências que variavam de Paul Anka, Maysa, Carmen Miranda a Cauby Peixoto, Rita fez parte de vários grupos musicais amadores, até que, eventualmente, chegou a um sexteto musical chamado justamente "Os Seis". Com a saída de três integrantes, sobraram Rita, Arnaldo Baptista e Sérgio Dias. Era o início do emblemático Os Mutantes.

Rita ficou com "Os Mutantes" durante seis anos, período mais psicodélico de sua carreira, em que seis álbuns foram gravados. A banda acompanhou Gilberto Gil na apresentação no 3° Festival de Música Popular Brasileira, fez parte do disco-manifesto "Tropicália ou Panis et Circensis" e deu origem a algumas das canções mais simbólicas e importantes da música brasileira, como "Ando Meio Desligado", "A Minha Menina" e "Balada do Louco", por exemplo.

A expulsão dos Mutantes veio junto ao fim de seu casamento com Arnaldo Baptista, que durou de 1968 a 1972. Neste período, ela já havia gravado alguns discos de forma solo, com composições em parceria com os companheiros de banda e composições exclusivas e individuais.

"Rainha do Rock"

Após a saída dos Mutantes, Rita tentou brevemente fazer uma dupla com a amiga Lúcia Turnbull. A recepção morna na única apresentação ao vivo fez Rita decidir que precisava de uma banda para acompanhá-la, e foi assim que ela chegou até a banda Tutti Frutti, liderada pelo guitarrista Luis Sérgio Carlini.

Rebatizada após um show montado para o relançamento da carreira da cantora, em 1973, a banda foi lançada com o nome Rita Lee & Tutti Frutti, por sugestão da gravadora, e acompanharia os anos de consagração do lugar de Rita no cenário do rock brasileiro.

Sucessos como "Ovelha Negra", "Agora Só Falta Você", "Esse Tal de Roque Enrow" e "Jardins da Babilônia" são deste período da carreira de Rita. Ao todo, foram quatro álbuns de estúdio ("Atrás do Porto Tem uma Cidade", "Fruto Proibido", "Entradas e Bandeiras" e "Babilônia"), além de dois álbuns ao vivo, incluindo "Refestança", com Gilberto Gil.

Casamento com Roberto de Carvalho

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Roberto de Carvalho posta foto ao lado de Rita Lee
Imagem: Reprodução

Rita conheceu o também músico Roberto de Carvalho por volta de 1976, e iniciou com ele uma parceria que perdurou até o fim de sua vida. Os dois foram morar juntos e, grávida do primeiro filho, Rita foi presa por porte de maconha. Ao fim da prisão, com Rita irritada com o cenário musical brasileiro e o "Clube do Bolinha", saiu com Gilberto Gil na turnê Refestança.

Em 1977, deu à luz Beto Lee. Em 1979 nasceu seu segundo filho, João. Em 1981, nasceu o terceiro, Antônio.

A união com Roberto de Carvalho foi da intimidade aos palcos, e os dois passaram a se apresentar juntos no período considerado o mais "pop" da carreira de Rita — tanto no sentido musical da palavra, com um ritmo mais diverso, quanto em termos de popularidade. Foi no álbum de 1979 que vieram sucessos como "Mania de Você", "Doce Vampiro" e "Chega Mais".

Foi também desta fase que vieram os hits "Lança Perfume", "Orra Meu", e "Baila Comigo". Neste período, Rita se aproximou bastante da TV, participou de especiais para a Globo e afastou-se do que considerou atitudes radicais do rock e da MPB.

A reinvenção é uma marca forte da carreira de Rita. Durante as décadas de auge de sucesso, ela foi considerada uma figura essencial em termos de inovação musical, o que permanece até os dias de hoje.

Com a passagem dos anos e a transformação dos projetos, Rita não ficou estagnada em um único gênero, e mostrou uma versatilidade ímpar. Do rock à bossa nova e ao pop, a artista flertou com a new wave, a MPB e ritmos eletrônicos, com a capacidade de se reinventar e mesclar gêneros nacionais e estrangeiros de forma poucas vezes vista no mundo da música.

Sua importância vai além dos palcos, e a posição de prestígio que tem como uma das precursoras do rock nacional, sobretudo do ponto de vista de uma figura feminina que "invadiu" um ambiente dominado por homens, a tornou uma das mulheres mais influentes na música e na cultura brasileiras. Pioneira no uso de sintetizadores em músicas com Os Mutantes, ela se tornou referência para mulheres que usaram guitarra no palco a partir dos anos 1970.

Vida boêmia e cuidados com a saúde

Além da prisão por porte de maconha, que segundo a própria Rita teria sido plantada pela polícia na época da ditadura militar, a cantora costumava voltar para os vícios em drogas e álcool, e nunca escondeu este período de sua vida. Ela passou por internações em clínicas de reabilitação e, em sua autobiografia, declarou que as bebidas eram o maior pesadelo: "Não havia mais espaço para cannabis, meu negócio era destilado. O melhor de tudo, ou pior, é que álcool era legalizado."

Em entrevista concedida ao Conversa com Bial em 2017, Rita contou que estava limpa há 11 anos, e que tomou a decisão de se afastar dos vícios com o nascimento de sua primeira neta, Izabella.

"Estou limpa há 11 anos, desde que minha neta nasceu. Canalizei minha energia e estou achando muito louco esse negócio de ser careta," disse. "Atitude rock é cuidar da minha horta, dos tomatinhos, da alface, da couve, do rabanete. Lá em casa, eu cuido dos bichos e da faxina. O Roberto cuida das plantas e é o cozinheiro."

Longe da agitação

Rita Lee se aposentou dos palcos em 2012, mas, segundo ela mesma, jamais se aposentaria da música. "Aposento-me de shows, da música nunca. Quem me viu ontem pode bem atestar minha fragilidade física. Saio de cena absolutamente paixonadacocês."

Desde então, Rita passou a morar com Roberto de Carvalho em um sítio no interior de São Paulo.

Sou uma profissional [da quarentena]. E, de repente, me vi envelhecendo. E o envelhecer para mim foi uma surpresa, porque eu nunca fui velha na vida. Fiquei com vontade de viver minha velhice afastada dos palcos. Não dividindo isso com o público.
Rita Lee, em entrevista ao Fantástico, em 2020

Descoberta do câncer

O câncer que acometeu o pulmão esquerdo da cantora foi descoberto em maio de 2021, durante exames de rotina. Em abril de 2022, familiares divulgaram a notícia de que ela estava curada.

Em seu livro "Rita Lee: Uma Autobiografia", ela refletiu sobre a morte. E escolheu a frase que queria em seu epitáfio:

Ela nunca foi um bom exemplo, mas era gente boa.

"Quando eu morrer, posso imaginar as palavras de carinho de quem me detesta. Algumas rádios tocarão minhas músicas sem cobrar jabá, colegas dirão que farei falta no mundo da música, quem sabe até deem meu nome para uma rua sem saída. Os fãs, esses sinceros, empunharão capas dos meus discos e entoarão "Ovelha Negra", as TVs já devem ter na manga um resumo da minha trajetória para exibir no telejornal do dia e uma notinha no obituário de algumas revistas há de sair. Nas redes virtuais, alguns dirão: "Ué, pensei que a véia já tivesse morrido, kkk". Nenhum político se atreverá a comparecer ao meu velório, uma vez que nunca compareci ao palanque de nenhum deles e me levantaria do caixão para vaiá-los. Enquanto isso, estarei eu de alma presente no céu tocando minha autoharp e cantando para Deus: 'Thank you Lord, finally sedated'".