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Psicólogas apoiaram atores de série sobre Boate Kiss: 'Voltei destruído'

Elenco e equipe de filmagens da série "Todo Dia a Mesma Noite" - Guilherme Leporace/Netflix
Elenco e equipe de filmagens da série 'Todo Dia a Mesma Noite' Imagem: Guilherme Leporace/Netflix

De Splash, em São Paulo

23/01/2023 04h00

"Por Justiça. Por memória. Para que nunca se repita". Esses são os lemas do coletivo de famílias e vítimas da boate Kiss, que também embalam a série "Todo Dia a Mesma Noite", lançada para dar uma nova luz à tragédia que matou 242 pessoas em Santa Maria (RS) no dia 27 de janeiro de 2013.

A produção estreia no catálogo da Netflix na próxima quarta-feira (25).

Para Daniela Arbex, que escreveu o livro que dá origem à série e já falou algumas vezes sobre o quão doloroso foi o processo de pesquisa, é importante que as pessoas entendam que ela não está no lugar de vítima. Para a diretora-geral Julia Rezende e o roteirista Gustavo Lipsztein, é importante que a série acesse um lugar de memória e luta.

"Eu me sinto muito privilegiada quando alguém me entrega o que tem de mais poderoso, de mais importante na vida, que é a sua memória afetiva. Então, a gente poder pegar essa memória afetiva dessas pessoas e contar essa história de uma forma tão digna, tão respeitosa e tão delicada, é um privilégio", compartilha Arbex, em entrevista a Splash.

"Quando eu fiz o livro, eu tive sequelas, mas isso me deu maturidade para entender lá na frente que esse não era o meu papel. Eu sou uma contadora de histórias, então eu tenho que me colocar no lugar dessa narradora que tem esse privilégio."

Esse lugar de privilégio também traz responsabilidades, não apenas com a história que Daniela tem em mãos, mas com a forma de contá-la. A decisão de transformá-la em um seriado torna tudo ainda mais delicado.

Como manter o equilíbrio emocional diante da missão de filmar cenas tão difíceis?

"A história não era focar no incêndio", esclarece Gustavo. "Era focar nos personagens, nas pessoas, que não são números. São pessoas indo fazer algo corriqueiro do dia a dia, jovens indo a uma festa, que nem em qualquer cidade do Brasil ou do mundo. Todos com suas aspirações para aquela noite. São pessoas, indivíduos. Depois, focar na luta por Justiça."

Mesmo assim, a questão técnica de como filmar um incêndio existe, e isso envolve não apenas os preparos técnicos mas a questão emocional que abala toda uma equipe.

"Foi uma filmagem minuciosamente estudada. Levamos quase três semanas para filmar essa sequência", conta Julia.

"Havia muitos cuidados técnicos, de segurança da equipe que estava no set, e um grande trabalho de pós-produção para fazer fogo e fumaça."

Equipe de psicólogas

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Série 'Todo Dia a Mesma Noite' contou com psicólogas para filmar cena do incêndio
Imagem: Guilherme Leporace/Netflix

A diretora, mais conhecida por títulos que navegam pela comédia, como "Depois a Louca Sou Eu" (2019) e "Meu Passado Me Condena" (2013), conta que houve uma preocupação com o preparo psicológico dos atores.

"Antes do início das filmagens, tivemos um encontro muito bonito com duas psicólogas do Instituto Entrelaços, do Rio de Janeiro, especializado em luto. E elas fizeram um encontro com toda a equipe e todo o elenco da série. Éramos 100 pessoas em uma reunião virtual com elas, em que elas abriram espaço para que cada pessoa pudesse trazer suas angústias em relação a esse assunto."

"Elas nos deram ferramentas para lidar com esse tema que, claro, abalava emocionalmente a todos nós. Mas elas nos deixaram mais fortes e, ao mesmo tempo, a gente estava muito de mãos dadas. Estávamos muito conectados no set, nos apoiando", recorda.

"Às vezes, vinha alguém que falava assim: 'Nossa, hoje tá difícil'. E a gente se apoiava [dizendo]: 'Vamos, a gente tem que contar'. Essa sensação de que tínhamos um norte nos guiava o tempo todo."

'Voltei destruído para casa'

Thelmo Fernandes e Débora Lamm interpretam os pais Pedro e Sil em 'Todo Dia a Mesma Noite' - Guilherme Leporace/Netflix - Guilherme Leporace/Netflix
Thelmo Fernandes e Débora Lamm interpretam os pais Pedro e Sil em 'Todo Dia a Mesma Noite'
Imagem: Guilherme Leporace/Netflix

Para Thelmo Fernandes, que interpreta um dos pais, Pedro, contar com a presença da família e o apoio dos amigos foi essencial. Ele recorda um dos momentos em que se sentiu mais abatido.

"Houve dias muito difíceis. Para mim, particularmente, foram as gravações do ginásio", conta, sobre o momento em que os pais vão em busca dos corpos dos fillhos. "Voltei destruído para casa. A Débora [Lamm] estava lá junto também, foram dois dias em que eu cheguei, olhei para o meu filho e falei 'Cara, não foi você'."

O ator credita à preparação de elenco, feita por Helena Varvaki, toda a compostura atingida.

"Ela falava muito isso durante a preparação, que é importante que a gente trabalhe essa coisa do afeto, a interação das famílias. Porque isso dá a sustentação para segurar a barra depois."