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Thiago Stivaletti

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Os cinco melhores filmes brasileiros de 2022

Taís Araújo e Alfred Enoch em "Medida Provisória", de Lázaro Ramos - Divulgação
Taís Araújo e Alfred Enoch em "Medida Provisória", de Lázaro Ramos Imagem: Divulgação

Colunista do UOL

18/12/2022 04h00

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É preciso dizer (e comemorar): foi um ano glorioso para o cinema brasileiro. Quando a gente achava que a cultura estava toda desmontada neste governo que já vai tarde, que os projetos estavam parados, que agora todo o povo do audiovisual já estava trabalhando em massa em séries para Netflix, Prime Video, HBO Max... Eis que os filmes nacionais fizeram bonito, selecionados e premiados em festivais do mundo todo - rolou até um Leopardo de Ouro no Festival de Locarno para "Regra 34", de Julia Murat, que estreia em janeiro nos cinemas.

E, para além dos tapetes vermelhos, a diversidade impressionou. Vimos histórias de todos os tipos, feitas com os mais diversos orçamentos - de um filme todo rodado num apartamento, como "Seguindo Todos os Protocolos", até o Rio de Janeiro transformado num cenário sinistro e ultrarracista na distopia de "Medida Provisória". Os filmes brasileiros de 2022 mostraram mais força do que as séries nacionais de ficção no streaming - uma prova de que a verdadeira criatividade nem sempre pode depender do aval das grandes empresas privadas do setor, e precisam sim dos mecanismos federais de incentivo, que (não custa dizer mais uma vez) não servem para "encher o bolso de alguns artistas", como a extrema direita adora dizer.

Abaixo, minha lista dos cinco filmes brasileiros que mais tocaram meu coração neste ano que está terminando:

5. Medida Provisória - Desde a retomada em 1995, já temos uma longa tradição de atores-diretores: Selton Mello ("O Palhaço), Wagner Moura ("Marighella"), Leandra Leal ("Divinas Divas"), Matheus Nachtergaele ("A Festa da Menina Morta"). Foi a vez de Lázaro Ramos estrear com uma bela distopia racista, adaptação de uma peça de teatro que mostra um governo de direita radical que edita a tal medida do título, que determina que os negros "sejam convidados a se retirar do Brasil" e voltar para a África. Podia ser uma ficção científica sinistra, mas o filme tem humor e uma leveza que convivem lado a lado com a escrotidão de toda a situação. Afinal, ninguém como o brasileiro para ainda conseguir rir em plena lama. Num período de crise das salas de cinema, o interesse pelo filme foi tamanho que ele chegou à bela marca de mais de 460 mil espectadores pagantes. Na Globoplay.

4. Seguindo Todos os Protocolos - Num bairro de classe média do Recife, Fábio, um jovem gay, amarga a solidão da pandemia em seu apartamento enquanto morre de pânico com a possibilidade de contrair o coronavírus. Quando a carência explode, ele dá um jeito de reencontrar os boys da sua vida tomando os cuidados mais absurdos que se pode imaginar. Com baixíssimo orçamento, o diretor Fábio Leal dá conta dá solidão da vida gay e do terror pandêmico do governo Bolsonaro sem deixar o humor de lado. No iTunes, ClaroTV+ e VivoPlay.

A Mãe - Divulgação - Divulgação
Marcélia Cartaxo vive Maria em "A Mãe", de Cristiano Burlan
Imagem: Divulgação

3. A Mãe - Diretor premiado por documentários como "Mataram Meu Irmão", Cristiano Burlan contou uma das histórias que mais acontecem no Brasil todo dia. Maria, uma ambulante nordestina do centro de São Paulo, um dia vê seu filho desaparecer sem deixar rastros. Ele estaria metido com o crime, ou morreu em algum acidente? Se morreu, foi na mão de bandidos ou da própria polícia? Como se pode imaginar, esta última se mostra pouco disposta a ajudar. Mas Maria tem sua força de mãe para ir até o fim na busca pelo filho. Um filme curto, seco, cortante, que oferece à paraibana Marcélia Cartaxo mais um grande papel depois do premiado "Pacarrete". Em breve no streaming.

Paloma - Divulgação - Divulgação
Ridson Reis e Kika Sena em cena do filme "Paloma", de Macelo Gomes
Imagem: Divulgação

2. Paloma - O Brasil é o país que mais mata pessoas trans no mundo. É importante mostrar a violência contra esse grupo, mas o diretor pernambucano Marcelo Gomes ("Cinema, Aspirinas e Urubus") inverte a aposta e mostra a rotina banal de Paloma, uma mulher trans que cuida de seu filho pequeno e tem apenas um sonho simples: casar na igreja com o homem que ama. A atriz Kika Sena brilha neste filme que mostra que gente é tudo igual - e a maioria das pessoas só quer lutar por sua felicidade sem machucar ninguém. Na Globoplay.

Pequenos Soldados - Reprodução - Reprodução
Johnny Massaro em cena de "Os Primeiros Soldados"
Imagem: Reprodução

1. Os Primeiros Soldados - Esta foi a grande surpresa do ano. O pequeno grande filme rodado em Vitória por Rodrigo de Oliveira mostra o início da pandemia de aids nos anos 80, quando ainda não havia tratamento eficaz para a doença, e os poucos medicamentos já testados demoravam a chegar no Brasil. Um estudante de biologia (Johnny Massaro), uma perfomer trans (Renata Carvalho) e um estudante de cinema (Vitor Camilo), todos soropositivos, decidem criar uma pequena rede de proteção para cuidarem um do outro. É um filme impregnado de ternura e melancolia, que faz uma linda homenagem a toda uma geração perdida pelo preconceito e a falta de assistência do governo - lançado dois anos depois de uma nova pandemia que não recebeu a devida atenção no Brasil. No iTunes, ClaroTV+ e VivoPlay.