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Demolir casa de Caio Fernando Abreu é tentar fazer que ele morra de novo
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Nesta terça-feira (19), quem se juntou para um protesto em frente a um sobrado no bairro Menino Deus foi pego de surpresa. A manifestação havia sido convocada com um intuito claro: impedir que demolissem a casa onde viveu o escritor Caio Fernando Abreu, que morreu em 1996 em decorrência da Aids em uma época em que ainda não havia tratamentos avançados.
Para a tristeza geral, quem chegou ao local encontrou o imóvel já no chão. Demolido por um trator. A licença para a demolição foi dada pela prefeitura de Porto Alegre (RS) a um casal de dentistas, que não informou o que fará no espaço. De acordo com o portal "Sul 21", o arquiteto responsável pela obra, que acabou sendo feita por uma empresa terceirizada, não tinha conhecimento de que ali viveu um dos mais importantes autores da literatura brasileira recente.
Caio foi considerado por muito tempo um autor "maldito". Jornalista, perseguido pela ditadura, amigo de Hilda Hilst, demorou para que tivesse o reconhecimento que merecia - muito dele, aliás, veio apenas após sua morte. Seu romance "Onde Andará Dulce Veiga?" já foi adaptado para o cinema com Maitê Proença e Carolina Dieckmann como protagonistas. O excepcional livro de contos "Morangos Mofados", um de seus maiores sucessos, constantemente tem algumas de suas histórias levadas para o teatro.
Com uma prosa urbana, ácida, destemida, Caio falava de temas tabus sem medo e sem floreios. Ao descobrir que estava vivendo com o HIV, corajosamente escreveu, no jornal "O Estado de S. Paulo", um texto com o título "Carta Para Além dos Muros", no qual contava tudo o que lhe acontecia. Virou um símbolo de coragem e dignidade, falando sobre o assunto sempre que procurado.
Não seria exagerado dizer que, junto com nomes como Moacyr Scliar e Lia Luft, Caio Fernando Abreu figura entre os maiores escritores gaúchos. Em tempos de redes sociais, então, suas frases circulam aos borbotões. Ele virou ídolo de uma geração que não existia quando ele escrevia. Exatamente por isso chama atenção a decisão equivocada da prefeitura de Porto Alegre de permitir que a casa que o abrigou seja demolida. Que parte de sua história seja apagada.
Ao destruir a casa de Caio, tentam matá-lo uma segunda vez, promovendo um apagamento cruel e completamente ignorante sobre sua importância para a cultura brasileira. Uma vergonha, um desrespeito com sua memória.
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