Topo

Procura-se medalha de ouro olímpica. Quem encontrar falar com Paula Pequeno

Daniel Brito

Do UOL, de Brasília

08/10/2014 06h00

Procura-se uma medalha de ouro olímpica. Ela pesa 170 gramas, tem 70 milímetros de diâmetro, 6 milímetros de espessura e um pedra jade chinesa circular da cor branca. Foi distribuída em agosto de 2008 em Pequim, na China, somente aos melhores atletas de cada modalidade nos Jogos Olímpicos.

Uma delas foi a brasiliense Paula Renata Marques Pequeno, 32, mais conhecida como Paula Pequeno, uma das melhores jogadores de vôlei que este país já produziu, e campeã com a seleção brasileira de vôlei em Pequim-2008. Ela está na história do esporte por ser um dos 14 brasileiros que voltaram da capital chinesa naquele ano ostentando um ouro no peito.

Mas o metal já não pode mais ser exibido por Paula. Aliás, ela só teve essa oportunidade por pouco mais de um ano, até o dia em que teve sua casa invadida no Butantã, na zona oeste de São Paulo, em outubro de 2009.

“Foi carta marcada, porque a casa estava em reforma, a gente estava fazendo uma área de lazer. Os caras entraram com a chave de casa, vestidos de pedreiros, às 6h30 da manhã”, relatou ao UOL Esporte, em sua casa no Guará, cidade do Distrito Federal em que cresceu e aprendeu a jogar vôlei, e hoje mora com a família.

Paula não estava em casa no momento do assalto, disputava o Sul-Americano com a seleção brasileira em Porto Alegre. Só soube do roubo quando reencontrou a família em São Paulo, ao final do torneio. Segundo seu relato, os assaltantes não foram violentos, mas fizeram o marido, Alexandre Folhas, a filha Mel, então com três anos, e a babá, de reféns.

Além do ouro olímpico, foram levadas todas as medalhas da carreira da brasiliense, que estavam em um grande quadro dentro do escritório da casa da família e cerca de 30 relógios que Paula tinha como coleção.

A má notícia para os bandidos é que algumas medalhas de ouro dos Jogos Olímpicos de Pequim-2008 estão à venda na internet em páginas dos Estados Unidos e Europa por cerca de R$ 140. A peça não é de ouro maciço, apenas banhada. Diferentemente, por exemplo, do ouro conquistado nos Jogos de Paris-1900, aí sim, totalmente composta pelo metal e que custa algo em torno de R$ 1.000.

Hoje, aos 32 anos, Paula Pequeno é capitã do Brasília Vôlei, time que disputará a Superliga 2014-2015 com pretensões de chegar à semifinal, toca um projeto pessoal de escolinhas de vôlei em um colégio de Brasília, já tem outro ouro olímpico, conquistado em Londres-2012, e retomou a coleção de relógios. Com serenidade, ela deu detalhes da perda do objeto mais cobiçado da carreira de um atleta.

UOL Esporte: O que aconteceu com sua medalha de ouro de Pequim?
Paula Pequeno: A gente foi assaltado dentro de casa, no Butantã. Eu estava com a seleção brasileira em um torneio no Rio Grande do Sul. Como eu estava lá, meu marido [Alexandre Folhas] não me contou nada. Mas ele me buscou no aeroporto e, antes de chegar, em casa me contou. A casa estava em reforma, a gente estava fazendo uma área de lazer bem legal.  Foi carta marcada, porque os caras entraram com a chave de casa, vestidos de pedreiros, às 6h30 da manhã. Amarraram meu marido com a barriga no chão. A Mel e a babá foram colocadas num sótão que tinha lá em casa.

UOL Esporte: Foram violentos com alguém?
Paula Pequeno: Graças a Deus, eles não eram ruins. Eu acho que era carta marcada por isso. Devem ter dito para os caras: “Vão lá, não machuquem ninguém, peguem as coisas todas e vão embora”. E a Mel até perguntou para ele: “Por que o você está usando máscara?”, sobre aquelas máscaras de ladrão, sabe? Eles estavam todos mascarados. Ele disse: “Porque eu estou gripado”. Daí ela falou: “E essa arma na sua mão?”. O cara falou: “É de brinquedo”. Então, a gente vê que não era uma pessoa má.

UOL Esporte: E aí?
Paula Pequeno: Aí que você vê que os caras eram uns ignorantes, né? Porque achavam que as medalhas eram de ouro maciço, mas ela era folhada a ouro. O valor sentimental delas é muito maior. E foram todas as medalhas que colecionava na minha carreira. Ainda levaram 30 relógios, porque eu coleciono. Agora está tudo num cofre.

UOL Esporte: Você não ficou desesperada?
Paula Pequeno: Quando ele foi me contando, eu fui ficando em pânico, né? Minha maior preocupação era saber se todo mundo tinha ficado bem, ninguém se feriu. Ele foi me contando, eu fui me acalmando. Cheguei em casa e fiquei super tranquila. Quando vi ali minha filha e meu marido sãos e salvos eu pensei: "Não tem problema, vou conquistar tudo de novo se eu tiver tempo. Se não der, vai ficar tudo na memória, no coração mesmo".

UOL Esporte: Onde você guardava as medalhas?
Paula Pequeno: Elas ficavam dentro de um quadro enorme no escritório da casa. A medalha de Pequim tinha um espacinho todo especial no centro, com uma moldura só para ela, com iluminação especial.

UOL Esporte: Você não acionou a polícia?
Paula Pequeno: A gente prestou queixa na polícia, mas deixou do jeito que estava mesmo. Fiquei com receio de mexer nisso, porque o cara tinha a chave de casa, sabia quem a gente era.

UOL Esporte: Você pode pedir uma nova medalha ao COI [Comitê Olímpico Internacional]?
Paula Pequeno: Posso, mas quem tem que pedir é o Ary Graça [Presidente da Federação Internacional de Vôlei]. Preciso correr atrás, entrar em contato com ele para conseguir isso para mim.

UOL Esporte: Você não sente falta daquela medalha?
Paula Pequeno: Sinceramente? Só quando algum amigo quer ver, porque eu não tenho como mostrar. Mas foi tão especial, tão especial, que está tudo na memória. Se eu fecho os olhos, vem tudo de novo. E quando você compara a medalha com a sua família, a medalha é o de menos.

UOL Esporte: E a medalha de Londres-2012 tem o mesmo valor para você?
Paula Pequeno: Lógico que tem. Naquela época, eu a Jaqueline [ponteira titular em Londres-2012] fomos a uma coletiva de imprensa do nosso patrocinador e um rapaz me perguntou: “Paula, em Pequim, você atuou em todos os jogos e em Londres você praticamente não jogou. O que você tem a falar sobre isso?”. Sabe o que eu respondi? “Eu sou bicampeã olímpica como a Jackie. Em 2008, ela bateu palmas para mim e porque eu não bateria palmas para ela agora em Londres? Ela é uma grande jogadora”. Então isso faz toda a diferença. Jogadoras que foram campeãs em 2008 e não estavam em 2012 podem ter alguma frustração porque não são bicampeãs olímpicas. Hoje eu posso dizer que sou bicampeã olímpica.

UOL Esporte: Qual é a medalha mais bonita? Londres ou Pequim?
Paula Pequeno: Medalha de Pequim era um pouco menor, tinha um marfim [Jade] lindo. Eu tinha feito uma promessa de que só tiraria a medalha do peito quando chegasse ao Brasil. Parecia que estava sentindo que perderia ela em breve. A gente foi comemorar e eu lá com a medalha no pescoço. Eu dormia com ela, tomava banho, não podia tirar, viajei com ela pendurada. Quando cheguei no Brasil, a fita que segura a medalha estava toda estrupiada. Se tem alguém que curtiu aquela medalha de Pequim, fui eu. Foram cinco dias com a medalha no pescoço, tipo o microfone do Big Brother, sabe?