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Meligeni critica cultura de TVs esportivas e revela mágoa com o Sportv

Rubens Lisboa

Colaboração para o UOL, em São Paulo

05/06/2020 04h00

Com um longo período de trabalho na televisão, Fernando Meligeni é crítico à forma como as emissoras esportivas tratam as diversas modalidades que não o futebol e acredita que deveria haver uma função mais educativa no sentido de difundir uma cultura do esporte no país, que recebeu os Jogos Olímpicos no Rio de Janeiro em 2016, mas hoje tem as instalações do Centro Olímpico da Barra inutilizadas.

Em entrevista exclusiva ao UOL Esporte, Meligeni revela que mesmo na ESPN, de onde saiu em 2017 depois de sete anos como comentarista, chegou a reclamar internamente devido ao uso de slogan "o canal de todos os esportes" e a forma como encontrava dificuldades em emplacar programas de outras modalidades, como o tênis, em que o ex-tenista chegou a apresentar programas, mas que não tiveram longa duração.

"Qual é a função da televisão? Instruir ou ganhar dinheiro? Então levanta a bandeira e fala assim: 'eu ganho dinheiro e caguei para quem eu vou botar, eu estou aqui para ganhar dinheiro'. Beleza, então a gente pensa se a gente assiste esse canal. Agora, ficar com slogan que ajuda todos os esportes, que ajuda o esporte do Brasil e não bota ninguém", afirma Meligeni.

"E a ESPN teve uma época que falava 'o canal de todos os esportes'. Eu falei: cadê todos os esportes? Vocês só falam de futebol', e as pessoas ficavam bravas comigo lá dentro. Você não fala de esporte, fala de esgrima? Não! Fala de judô? Não! Mostra halterofilismo? Não! Futebol? Sim! Tem um buraquinho aqui, vamos fazer um Entrando de Fininho, botar um pouco mais de tênis? Não, bota o time lá do interior de não sei onde contra o interior de não sei o quê. Então vocês não são de todos os esportes, é o que sobrar a gente bota. Então muda o slogan!", completa o ex-tenista.

A crítica de Meligeni não é apenas em relação à última emissora onde trabalhou, mas também ao próprio Sportv, que não exibiu durante a quarentena jogos que ele gostaria que fossem mostrados de Copa Davis, como os seus e os de outros tenistas, como Jaime Oncins. Ele chegou a se queixar no Twitter porque no início só eram exibidas as partidas de Gustavo Kuerten, mas depois também teve reprise de sua conquista do ouro nos Jogos Pan-Americanos de Santo Domingo-2003.

"As pessoas esqueceram do Jaime, eu estou no Rio Open e eu acho patético um cara vir aqui e pedir para tirar uma foto minha e dar para o loirão de 1,90 m. 'Loiro, me dá uma foto'. Que loiro o que, meu? Esse cara é o Jaime Oncins. A gente tem que preservar isso. Aí o Luiz Mattar passa, o [Carlos] Kirmayr passa e as pessoas de repente não conhecem. Eles são menos do que eu? Não. Eu acabei ficando mais na mídia do que eles. Só que as pessoas não podem esquecer e quem é culpada disso? A pessoa tem uma participação, mas a mídia tem. Bota o Jaime, a Copa Davis contra a Alemanha, contra a Itália. Não dá para botar esse jogo? 'Ah ninguém vai ver'. Está bom, mas vamos mudar a cultura do nosso povo pelo amor de Deus".

Sportv recusou ceder vídeos para acervo pessoal de Meligeni

Anos depois de parar de jogar, Meligeni começou a montar um acervo com os seus principais jogos em torneios de Grand Slam, o ouro nos Jogos Pan-Americanos, títulos ATP e vitórias expressivas em outros torneios, mas ficou sem jogos como os que fez pela Copa Davis, por exemplo. A competição na época era transmitida no Brasil pelo Sportv, que recusou um pedido do ex-tenista para que cedesse a cópia dos jogos.

"A resposta para mim veio, 'ah, mas você pode usufruir disso e usar não sei quando'. Cara, se eu usar, eu sou pessoa pública, se eu usar, amanhã você está sabendo, o UOL bota. E você me processa. Olha que simples!", diz Meligeni.

"Daqui a 10, 20, 30 anos eu vou morrer e vai ter um babaca que vai fazer o que com o jogo? Vai começar a botar quando eu morrer na televisão? Ai, o Fernando era tão legal, né? Aí eu vou fechar o Jornal Nacional quando eu morrer? Não, não precisa me botar no Jornal Nacional. Então eu tenho o direito de falar o que eu quero e tenho o direito de ser convidado para ir para fazer a Olimpíada pela Globo e falar não", completa o ex-tenista.