O tempo fechou quando um grupo de pessoas vestidas com a camisa amarela da seleção brasileira se posicionou em um palco no estádio do Mineirão em Belo Horizonte em meados de abril passado. As nuvens escuras no céu e as capas de chuva que cobriam boa parte da plateia anunciavam um clima pesado.
Mas quando o estudante de história Gustavo Pereira Marques, o Djonga, apareceu no palco, empunhando o microfone, o público logo entendeu o recado. Ele também vestia a camisa principal da seleção, modelo novo.
"Com essa camisa aqui é mais gostoso ouvir vocês dizerem isso", afirmou Djonga, enquanto seu público fazia um protesto contra o presidente Jair Bolsonaro. "O cara acha que tudo é deles. Ele se apropria do tema família, ele se apropria dos nossos símbolos. Os caras se apropria de tudo. Mas é o seguinte: é tudo nosso e nada é deles."
Nascido na Favela do Índio e criado na zona leste de Belo Horizonte, Djonga é considerado aos 27 anos um dos nomes mais influentes do rap nacional. Suas letras falam da vida marginalizada, de racismo e violência policial. Não é o tipo de pessoal que a gente normalmente veria vestir com orgulho a camisa da Confederação Brasileira de Futebol, ultimamente mais presente nos protestos de rua a favor do governo e contra a ciência e a democracia.
O figurino que Djonga e seus dançarinos usaram na entrada do Breve Festival, assim como seu discurso, lançou luz a um movimento que vem crescendo dentro do hip hop e do ativismo negro e periférico: a tentativa de resgatar e dar novo significado às cores da bandeira nacional e, especificamente, à camisa amarela da seleção brasileira, identificada nos últimos anos com os apoiadores do presidente Bolsonaro.
Em 2022, esse debate promete esquentar. Em outubro, o país viverá as eleições mais importantes desde a redemocratização. Em novembro e dezembro, a seleção brasileira estará em campo na Copa do Qatar. Será então possível sair à rua com a camisa amarela sem ser confundido com um militante de extrema direita?