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Luiz Gomes: 'Carille - Sonhar com os pés no chão'

31/12/2017 07h45

Foi um ano mágico para Fábio Carille. Só para lembrar, em dezembro de 2016 ele era um simples auxiliar do Corinthians, não era nem o favorito na escolha do treinador depois da demissão de Oswaldo de Oliveira. Ao contrário, chegou a ser formalmente descartado publicamente pelo presidente Roberto de Andrade durante uma entrevista coletiva. Mas, pela recusa de nomes como Guto Ferreira, Jair Ventura, Dorival Júnior, Reinaldo Rueda e Paulo Autuori acabou efetivado. Sorte dele. Mais sorte ainda dos corintianos.

Doze meses e dois títulos depois - o Paulistão e o Brasileirão - a entrevista do treinador a este LANCE!, publicada nesta última semana do ano, revela que os louros das conquista não modificaram seu jeito simples nem lhe subiram à cabeça. O treinador já deixou as vitórias para trás e foca agora no futuro, revela a ambição de dar voos ainda mais altos, com um olho no Corinthians e outro no desafio de, um dia, atravessar o oceano e dirigir um time europeu.

Carille tem todo o direito de sonhar. Quando assumiu, o que mais ouvia é que não ia dar certo, que não tinha experiência, até que não entendia de futebol. Mas os resultados do Timão o consolidaram como a expressão maior de uma nova geração de treinadores que vem se firmando no país. Talvez, uma das poucas coisas que se tenha a comemorar no futebol brasileiro nos últimos anos. Nomes como Zé Ricardo, Jair Ventura e Roger Machado trouxeram novos ares, cada um com a sua filosofia de trabalho, mas tendo em comum a convicção de que conhecimento técnico e tático não bastam. É preciso estudar - os adversários e o que rola no mundo - atualizar-se sempre, entender os jogadores, fazê-los aliados, ser flexível quando necessário sem abrir mão de suas crenças.

A função de treinador por aqui tem características próprias, bem diferentes do que ocorre na Europa. A cultura imediatista dos cartolas, da torcida e da mídia obriga a alcançar resultados rápidos. Isso faz muitas vezes que projetos que poderiam emplacar se percam pelo caminho. Que os técnicos abandonem suas convicções para não perder o emprego. Neste domingo, quando o Arsenal entrar em campo para enfrentar o West Bromwich, o francês Arsene Wenger estará completando 811 jogos à frente dos Gunners na liga inglesa, um recorde histórico, superando o lendário Alex Ferguson. Incluindo todas as competições, Wenger, que tem contrato até junho de 2019, dirigiu 1.193 jogos desde que chegou ao clube londrino em outubro de 1996. São 21 anos no mesmo cargo - Fergunson dirigiu o Manchester United por 27 temporadas - algo impensável no futebol brasileiro.

Carille sabe disso. Também tem em conta o fracasso de dois expoentes do futebol brasileiro que naufragaram em experiências europeias, Luxemburgo em 2005 no Real Madrid e Felipão, em 2009, no Chelsea, ambos demitidos antes de completarem um ano de trabalho. Dificuldades de relacionamento com o elenco e métodos ultrapassados de treinamento foram determinantes no fracasso da dupla. Ele sabe os erros que não pode cometer. Que tudo deve acontecer na hora certa. E mostra-se convicto de que o sucesso lá fora tem de começar pela superação de desafios aqui dentro.

- O ser humano é movido a desafios. Então, sei que não é fácil o que vou falar, mas quando eu falo que quero ficar três, quatro ou cinco anos em um clube no Brasil (seu contrato atual com o Corinthians vai até 2019), eu sei que é difícil, mas é um sonho. Para isso, eu tenho que trabalhar, não me acomodar e fazer cada vez mais. É uma coisa que me incentiva cada vez mais: buscar conhecimentos, buscar isso, buscar aquilo... Quem sabe eu não seja o primeiro da minha geração a fazer sucesso em um time da Europa? - divaga.

A fórmula é essa. Ter os pés no chão e não perder a humildade é o primeiro passo. E trabalhar. Ao invés de curtir às férias, saborear o título brasileiro, Carille se inscreveu no curso de certificação de técnicos da CBF, condição básica para ter a licença exigida pela UEFA e pelas ligas europeias. Que 2018 seja para ele, e para vocês, leitores, um ano mágico. Feliz 2018 a todos.