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Palmeirense que atirou em briga com morte tem registro de arma no Exército

Torcedores aparentemente armados se enfrentam no dia da final da Libertadores - Reprodução
Torcedores aparentemente armados se enfrentam no dia da final da Libertadores Imagem: Reprodução

Paulo Eduardo Dias

Colaboração para o UOL, em São Paulo

28/03/2021 04h00

A briga entre torcedores do Palmeiras e do Corinthians que resultou na morte de um torcedor alvinegro teve disparos feitos por um atirador legalizado e por uma arma registrada pelo Exército. A informação consta do inquérito policial que investiga o confronto, ocorrido em São Paulo no dia da final da Libertadores, em janeiro.

A briga resultou na morte de Wallace Thomaz, membro da Gaviões da Fiel e conhecido como Pirata, de 29 anos, baleado com um tiro no tórax.

A Polícia Civil identificou dois atiradores envolvidos no confronto. Eles foram flagrados em vídeos portando armas no momento. Ambos são palmeirenses e tiveram sua identidade revelada após um dos diretores da Mancha Alviverde, principal organizada do Palmeiras, reconhecê-los em depoimento.

O diretor da Mancha, responsável por alugar o ônibus em que estavam os envolvidos na briga, sustentou que não sabia que a dupla estava armada. O coletivo recolheu torcedores em bairros do centro e da zona sul e tinha como destino um salão de festas na favela Heliópolis, onde assistiriam à partida final da Libertadores, entre Palmeiras e Santos, no Rio.

Em depoimento, um dos atiradores, o comerciante Raoni Lopes Bonassi, 36, contou que se apresentou por temer represálias de integrantes da Gaviões. Na presença de um delegado, Bonassi afirmou que tem a propriedade e o registro de uma pistola Taurus 380 milímetros junto ao Exército. O registro da arma foi feito no dia 28 de fevereiro de 2018.

De acordo com documento que consta no processo, Bonassi disse que "estava armado no dia da final, pois tinha ido em sua loja na parte da manhã e tinha medo de ser assaltado". Ele negou que tenha atirado na direção das vítimas.

O documento emitido pelo Exército dá ao portador o direito de transportar a arma para treinamentos ou competições de tiro esportivo em local apropriado, como estandes. Mas não permite posse ou uso da pistola na rua, por exemplo.

Questionado sobre os tiros, afirmou que foram feitos em legítima defesa na tentativa de dispersar um grupo que agredia o diretor da Mancha, o mesmo homem que o apontou como um dos atiradores. "Fiquei apavorado com a possibilidade do meu amigo morrer e acabei sacando minha arma de fogo e efetuei três ou quatro disparos para cima. Não efetuei nenhum disparo para frente, para trás ou para os lados". O suspeito conta que após o ocorrido deixou o local num Uber.

Após ser ouvido pela polícia, ele teve sua arma apreendida.

Sidney Teixeira Nicolau, 27, morador de Heliópolis e desempregado, é considerado o principal suspeito pela morte do corintiano. Um pedido de prisão temporária de 30 dias foi expedido, mas ele ainda não foi localizado.

Integrante da Mancha, Nicolau teve sua foto como responsável do crime divulgada em grupos na internet poucas horas depois da briga. Anexadas ao inquérito, há uma série de imagens em que ele utiliza roupas da torcida. Uma tatuagem na altura do peito, sua orelha e corte de cabelo também foram providenciais para o reconhecimento.

O advogado Jacob Filho, que atua na defesa de Nicolau, apontou que deve apresentar seu cliente na próxima terça-feira (30). Ao UOL Esporte, o defensor disse que Nicolau "atirou para se defender" e que os disparos foram "para o alto".

Segundo o advogado, o confronto aconteceu após uma emboscada armada pelos corintianos. "A Gaviões sabia que o ônibus de palmeirenses passaria por ali e armou a emboscada. Eles fizeram uma trajetória diferente para não passar em frente à sede, mas foram interceptados. O ônibus tinha criança e mulher, o objetivo não era brigar. Corintianos atiraram, outro palmeirense atirou, inclusive já prestou depoimento e entregou a arma".

Briga - Reprodução - Reprodução
Briga entre Gaviões e Mancha na final da Libertadores deixa um morto
Imagem: Reprodução

Sobre seu cliente ainda não ter se apresentado para a polícia, ele disse ser "muito difícil explicar para uma pessoa que ela vai ser presa por um crime que não cometeu".

O advogado que defende os corintianos, Renan Bohus, refuta a tese de emboscada ou briga premeditada. "Os corintianos afirmam que foram pegos de surpresa. O trajeto dos torcedores rivais sequer deveria ter sido por aquele local, uma vez que é usual o caminho pela Rodovia Anchieta. Cabe ressaltar que se utilizaram de arma de fogo é porque premeditaram o fato. Se a real intenção fosse se defender deveriam ter acionado o batalhão da PM para escolta", completou.

Além dos envolvidos na briga que foram detidos no dia do fato e depois liberados, a Polícia Civil ouviu o presidente dos Gaviões, Rodrigo Gonzales Tapia, e da Mancha, André Guerra Ribeiro.

Entenda a briga

O ônibus em que estavam os torcedores do Palmeiras, boa parte deles membros da Mancha, havia sido contratado pela subsede Centro-Sul da organizada para levar o grupo até a favela de Heliópolis, na zona sul da capital paulista, onde assistiriam à final da Libertadores.

Após rodar poucos quilômetros, os torcedores da Mancha e da Gaviões entraram num confronto que contou com armas de fogo pelo lado alviverde, além de barras de ferro e pedaços de madeira de ambos os lados.

Durante a briga, os corintianos Wallace Thomaz, o Pirata, e Wallace Augusto Nascimento dos Santos, 23, foram baleados no tórax. Socorridos, Thomaz não resistiu aos ferimentos e morreu pouco depois no Hospital Municipal Augusto Gomes de Mattos. Santos sobreviveu. O local da briga fica a cerca de um quilômetro de uma das mais tradicionais subsedes dos Gaviões, de onde veio o atual presidente da entidade.

Durante o sepultamento de Pirata, no Cemitério de Vila Nova Cachoeirinha, na zona norte, integrantes dos Gaviões entoaram cânticos prometendo vingança por sua morte.