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OPINIÃO

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Fim de ciclo prejudicou o Grêmio, e já senti na pele

Brenno, goleiro do Grêmio, deixa o campo chorando após derrota para o Santos, na Vila Belmiro - Reprodução/Premiere
Brenno, goleiro do Grêmio, deixa o campo chorando após derrota para o Santos, na Vila Belmiro Imagem: Reprodução/Premiere

Com Augusto Zaupa

09/12/2021 04h00

Assim como os jogadores do atual elenco do Grêmio, também vivi o drama da luta contra o rebaixamento em 2003. Hoje (9), o Tricolor gaúcho define a sua permanência ou não na elite do Brasileirão diante do já campeão Atlético-MG, além de precisar de tropeços de Juventude e Bahia.

Em 20 anos de carreira, só enfrentei uma vez a luta contra a degola à Série B. Acabamos escapando na última rodada, curiosamente, ao vencermos o Corinthians por 3 a 0, no estádio Olímpico. Foi a primeira edição do Brasileirão de pontos corridos, com 24 clubes e pelo regulamento apenas dois caíam à Segundona (Fortaleza e Bahia foram os rebaixados).

Acabamos na 20ª posição, com apenas um ponto à frente do Fortaleza (23ª). Foi uma temporada terrível, de muitas dificuldades, amargamos a lanterna por 19 rodadas e ficamos 22 delas no Z4.

Cerca de 18 anos depois, cá está o Corinthians novamente no 'caminho' que vai definir o futuro gremista, visto que os paulistas podem ajudar o Tricolor caso vença o Juventude, em Caxias do Sul.

Aquela situação que o grupo comandando pelo Adílson Batista viveu há quase duas décadas não tem semelhanças com a atual situação do Grêmio. Desta vez, o lado azul do Rio Grande do Sul tem boa saúde financeira (com superávit mesmo durante a pandemia), paga em dia, tem elenco forte e recheado e uma gestão modelo que nos últimos anos foi elogiada por muitos, diga-se de passagem - como eu mesmo fiz aqui neste espaço.

Já em 2013 a situação era oposta, tanto que deixei o Olímpico porque estava sem receber salários há meses — além de 21 meses de FGTS que deixaram de ser pagos. No segundo semestre daquele ano a minha vida ficou no limbo, não botava o pé para fora de casa, se não fosse para ir aos treinos e aos jogos. Tinha vergonha de levar o meu filho mais velho à creche, aos aniversários dos amiguinhos, ao shopping... Entendo muito bem o que os atuais medalhões gremistas estão sofrendo na pele.

Técnico Tite durante treino da equipe do Grêmio no início de 2003 - NECO VARELLA/PAGOS - NECO VARELLA/PAGOS
Técnico Tite durante treino da equipe do Grêmio no início de 2003
Imagem: NECO VARELLA/PAGOS

Foi o momento de desmanche de uma geração que havia sido campeã da Copa do Brasil dois anos antes, tanto que naquele grupo que quase caiu restaram apenas cinco jogadores, incluindo eu. Os demais eram a gurizada, e foram eles que fizeram a diferença na crise, como o George Lucas, que teve muita coragem e brios ao pegar a bola para bater um pênalti num jogo decisivo na briga contra o descenso.

Talvez o único ponto que possa ressaltar entre estes dois momentos é justamente este: o fim do ciclo de uma geração vitoriosa, visto que o atual Grêmio empilhou títulos nas últimas temporadas com o Renato Gaúcho.

O futebol brasileiro ainda não aprendeu a encerrar ciclos, não sabe o momento certo de romper algumas ligações com determinados jogadores, treinadores e até gestores. Evito personalizar o herói de um título ou o vilão um fracasso, portanto, prefiro fazer uma análise global. Neste caso, a transição é que tem agravado a situação. É muito complicado pensar em mudanças quando estamos no auge, mas este o momento de paz que é o ideal para se fazer trocas.

Sou colorado de infância e fui bicampeão da Libertadores (2006 e 2010) pelo Internacional, mas me sinto totalmente à vontade de escrever e analisar sobre o Grêmio, porque foi o clube onde passei maior tempo de minha carreira. Por ter recebido a oportunidade de me tornar profissional, tenho carinho muito grande pelo Tricolor gaúcho e sempre me dediquei com a mesma vontade e raça, independentemente da cor da camiseta. Inclusive, meu filho caçula defende a base gremista.

Torço por dias melhores no Grêmio, pois não podemos ficar apenas apegados à rivalidade Gre-Nal. O lado azul errou nos últimos anos ao bater no peito e ostentar uma invencibilidade regional, com um olhar micro, e não macro. A verdade também é recíproca no Beira-Rio, visto que, após a vitória no clássico local pelo Brasileirão, o time caiu de desempenho e se afastou no G4, ficando até mesmo fora da zona de classificação à Libertadores.

Os dois são muito maiores do que apenas este olhar ao próprio umbigo.