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Rodrigo Coutinho

REPORTAGEM

Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

Um perfil de comunicação dos técnicos portugueses no Brasil

Colunista do UOL

07/05/2022 04h00

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A antiética atitude de Jorge Jesus ao basicamente se oferecer para treinar o Flamengo com Paulo Sousa no cargo causou espanto em muita gente, mas em Portugal nem tanto. Conhecedores da personalidade do Mister, jornalistas portugueses sabem que a atitude obedece a um padrão de comportamento do ex-técnico rubro-negro. O episódio chama a atenção para ampliar o olhar sobre os demais treinadores portugueses em atividade no Brasil.

Luis Cristóvão(@luis_cristovao), comentarista na Rádio Antena 1 e na TV SIC, possui anos de experiência no convívio jornalístico com alguns deles e falou sobre Jorge Jesus, Paulo Sousa, Abel Ferreira, Vitor Pereira e Luis Castro. Confira abaixo os perfis traçados pelo jornalista.

Jorge Jesus

A atitude é incomparavelmente reprovável. Foi uma conversa informal, mas ele estava absolutamente consciente do que poderia acontecer. Não é o tipo de pessoa que se deixa levar por situações assim. De alguma forma passa a ideia de que ele quis dar uma resposta ao que aconteceu em dezembro de 2021, quando disse que os dirigentes do Flamengo o deixaram mal com o Benfica. Agora parece fazer o mesmo ao criticar a forma como o time joga. Coisas que não são aceitáveis entre os treinadores, principalmente quando disputam o mesmo lugar, já que Jorge Jesus se anuncia como candidato a treinar o Flamengo. Ele já agiu assim em outros momentos ao tentar contratos melhores, seja no Benfica ou na Arábia Saudita. Não me espanta, mas é sempre de lamentar.

Procurar apoio na comunicação já foi um precedente utilizado por ele anteriormente para traçar o seu caminho. Sempre esteve muito consciente do espaço em que se move, mas em muitas situações perde a mão. Entra em zonas que julga controlar, mas acaba perdendo o controle da situação. Aquilo que diz sobre os outros fala muito mais sobre si. Acaba atingindo objetivos totalmente contrários do que traçou inicialmente. É uma faceta que só atrapalha o seu trabalho como treinador.

Abel Ferreira

Vocês, no Brasil, o conhecem melhor do que nós, aqui em Portugal. Ele está num nível de visibilidade superior. A imagem dele é de alguém difícil de ter contato. Coloca uma certa barreira. No banco de reservas é muito ativo, a ponto de perder a cabeça às vezes, isso é um pouco do que ele passa em Portugal. A imagem em campo é muito expressiva, mas no particular não é essa a sensação que deixa na forma como lida com jogadores e equipe técnica. É alguém que pode ser muito mais cerebral, e isso causa a dúvida se não traz um pouco de encenação quando tem essas reações mais emocionais.

É bom não esquecer que Abel Ferreira tem formação superior, chegou a dar aulas como professor, tem experiências bem exigentes e louváveis no futebol profissional como jogador. Fez o seu caminho de progressão a partir disso. Controla a forma como quer comunicar, passando muitas vezes uma imagem mais dura. Sabe do impacto que isso pode ter, também por isso está aonde chegou hoje.

Paulo Sousa

Eu diria que ele é o mais enigmático dos cinco, sobretudo por aquilo que já trazia enquanto jogador e o que foi o seu caminho como treinador. Assentou todas as suas bases no que foi a sua figura como atleta. Não é propriamente alguém muito cativante ou exuberante na forma de se comunicar. Tem ideias claras sobre o jogo, mas na minha opinião não fez a transposição da forma correta para se comunicar. Não tem falas de grande impacto.

No Flamengo tem a grande oportunidade da sua carreira. Sabe-se da exigência do futebol brasileiro e essa luta de como se expressar para o público é importante, tendo em vista que sua principal capacidade é interna. Essa lacuna ameaça a posição dele, talvez não esteja preparado neste aspecto. Certamente é quem precisa trabalhar mais para se fazer compreendido.

Vitor Pereira

Ele foi alçado de auxiliar a treinador principal de forma surpreendente no Porto, e creio que não imaginava que isso implicava em uma mudança na gestão da sua imagem. Talvez o seguimento da sua carreira sofra com isso. Ele tem demorado a conseguir cativar as pessoas fora do ambiente do clube. Fora disso tem uma imagem muito emotiva, algo que não faz justiça total ao conhecimento que ele tem. Por outro lado, isso é positivo em alguns momentos.

É um personagem muito interessante. No Brasil ele pode apresentar muitas de suas qualidades. Por ter sido campeão rapidamente no Porto, não teve tantas possibilidades em Portugal, e o Brasil tem um território muito maior. Pode expressar as qualidades que despertam admiração por aqui.

Luís Castro

Ele chegou a treinador depois de uma larga experiência profissional e de vida como coordenador de formação. Juntou uma equipe técnica de imensa qualidade ao seu redor. Elevada sabedoria em termos de comunicação nas redes sociais e posicionamento público em entrevistas. Sabe exatamente o que quer fazer. É um líder! Sabe mexer muito bem com a forma que comunica. É pedagógico.

O Botafogo tem uma sorte imensa de poder contar com ele e sua comissão técnica, principalmente se tiverem tempo para fazer o time crescer. Ele, de forma sempre muito calma, consegue transmitir aquilo que pretende, é quase um filósofo do futebol. É um ganho muito grande para o Brasil. Pode deixar um impacto real, não só tático, que também é importante, mas na forma como gere os seus trabalhos.

A antiética atitude de Jorge Jesus ao basicamente se oferecer para treinar o Flamengo com Paulo Sousa no cargo causou espanto em muita gente, mas em Portugal nem tanto.