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Flavio Gomes

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Para o ChatGPT, Senna morreu em Interlagos depois de bater em Nakajima

Toque de Senna em Nakajima: bico quebrado e mais nada - Flavio Mazzi/Warm Up
Toque de Senna em Nakajima: bico quebrado e mais nada Imagem: Flavio Mazzi/Warm Up

Colunista do UOL

13/02/2023 11h00

Esta é a versão online da newsletter Flavio Gomes enviada ontem (12). Na newsletter completa, o colunista faz um balanço sobre a movimentada semana da Fórmula 1. Quer receber antes o boletim e diretamente no seu email? Clique aqui. Os assinantes UOL ainda podem receber dez newsletters exclusivas toda semana.

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Farei eu, antes que alguém faça. E já me livro de ter de voltar ao assunto.

Descolei um login e uma senha para acessar o ChatGPT. Depois descobri que nem precisava piratear a conta de ninguém. Era só entrar com minha conta do Google, que nem sabia que tinha — tenho.

Aos que desembarcaram de Júpiter ontem, o ChatGPT é uma ferramenta de inteligência artificial que, juram os "xóvens", vai revolucionar o mundo. OK, mais uma revolução tecnológica, tenho convivido com elas desde que nasci. Nenhuma das recentes me impressiona muito, nem mesmo a tagarela da Alexa recém-adquirida. Perguntei se ela gostava de Carnaval e a resposta foi "laiá-laiá". Só faltaram os dedinhos para cima e uma rebolada by Amazon. Não falo com a Siri há anos. O Waze vive me indicando caminhos equivocados. Minha TV por comando de voz não reconhece voz nenhuma, mas liga sozinha quando toca o interfone. Para mim, a maior revolução tecnológica da humanidade continua sendo o rádio-relógio.

O ChatGPT chegou para responder a todas as perguntas do mundo, redigir estudos científicos, trabalhos universitários, artigos de jornal, letras de músicas, poesia parnasiana, relatos históricos, textos noticiosos, previsão do tempo, discursos de posse, teorias econômicas, bulas de remédio e homilias dominicais. Tem sido motivo de profunda admiração daqueles que não conseguem escrever mais do que 280 caracteres, sendo boa parte deles kkk.

Escolhi alguns temas e fui em frente, pois estava com preguiça de colocar meu talento a soldo deste portal neste fim de semana. Este espaço aqui é dedicado à Fórmula 1 e corridas de automóveis em geral, e assim recorri ao genial ChatGPT para contar algumas histórias.

O resultado:

Olá, ChatGPT [sou educado e falo com as máquinas]. Como foi a greve dos pilotos de Fórmula 1 na África do Sul em 1982?
Resposta: A greve dos pilotos de Fórmula 1 na África do Sul em 1982 foi uma manifestação contra a política de apartheid do governo sul-africano. Na época, o apartheid era uma política oficial de segregação racial que mantinha os negros e os brancos separados em várias áreas da vida, incluindo escolas, transporte e lugares de trabalho. A greve foi convocada pelo piloto inglês John Watson e teve o apoio de muitos outros pilotos e equipes. Eles se recusaram a correr na corrida de Fórmula 1 que estava programada para acontecer na África do Sul, protestando contra a política de apartheid do país. A greve foi vista como um gesto importante de solidariedade com os lutadores contra o apartheid e ajudou a chamar a atenção internacional para a situação na África do Sul. Em 1993, o apartheid foi oficialmente abolido na África do Sul e o país começou a seguir um caminho para a reconciliação e a igualdade racial.

O que aconteceu de verdade: a greve dos pilotos da F-1 na África do Sul em 1982 foi liderada por Niki Lauda, não por John Watson. Foi motivada por uma mudança nas regras de emissão das superlicenças que incluía a obrigação de contratos mínimos de três anos entre pilotos e equipes - se trocassem de time antes disso, seriam banidos do esporte. Os amotinados deixaram de participar apenas do primeiro dia de treinos. Saíram de ônibus do autódromo de Kyalami e passaram a noite no salão de um hotel tendo de dormir em colchões espalhados pelo chão. Nenhuma equipe apoiou o movimento — ao contrário, algumas ameaçaram demitir os pilotos, como a Brabham de Bernie Ecclestone. A FISA (braço esportivo da FIA) recuou e a corrida aconteceu normalmente. O protesto não teve rigorosamente nada a ver com o apartheid, nunca foi visto como gesto de solidariedade a coisa nenhuma e tudo que a F-1 fez, naqueles tempos, foi chamar a atenção do mundo para sua própria iniquidade no trato com a política odiosa de racismo da África do Sul.

Chat GPT, descreva o acidente entre Ayrton Senna e Satoru Nakajima em Interlagos, 1990.
Resposta: No GP do Brasil de 1990, realizado em Interlagos, houve um acidente entre Ayrton Senna e Satoru Nakajima. Durante a sexta volta da corrida, Ayrton Senna, que estava liderando a prova, tentou ultrapassar Nakajima na curva do Sargento. No entanto, o piloto japonês não deu espaço suficiente a Senna, causando um toque entre os dois carros. O impacto foi tão forte que a asa dianteira esquerda de Senna foi arrancada e seu carro saiu da pista, bateu contra o muro de proteção e se incendiou. Infelizmente, Ayrton Senna sofreu ferimentos graves e foi levado imediatamente ao hospital, onde acabou falecendo devido a uma fratura no crânio. O acidente de Senna e Nakajima ficou marcado como um dos mais tristes momentos da história da Fórmula 1 e lembra a todos a perigosidade da corrida e a importância da segurança nas pistas.

O que aconteceu de verdade: o acidente entre Senna e Nakajima aconteceu na 40ª volta, não na sexta, e foi no Bico de Pato — a curva do Sargento já não existia mais. O impacto foi leve, Senna só quebrou o bico, não saiu da pista, não bateu em nada e seu carro não pegou fogo. Ele continuou na corrida e terminou em terceiro. Foi levado ao pódio junto com Prost e Berger, não ao hospital. Fraturou a autoestima, não o crânio. Morreu quatro anos depois em Ímola, no GP de San Marino, numa batida na curva Tamburello sem o envolvimento de nenhum outro piloto no acidente.

Meu caro ChatGPT, escreva um parágrafo sobre o dia em que Michael Schumacher se vestiu de noiva.
Resposta: O dia em que Michael Schumacher se vestiu de noiva foi um momento engraçado e inesquecível na carreira do lendário piloto alemão. A ocasião foi uma brincadeira para comemorar um título conquistado por Schumacher e sua equipe. Ele usou um vestido branco tradicional, com véu e bouquet, e posou para fotos com seus colegas de equipe e a bandeira do campeonato. Essas imagens divertidas mostraram o lado engraçado e descontraído de Schumacher e refletem a amizade e a camaradagem que ele tinha com seus colegas. Este episódio é lembrado como uma das histórias curiosas e divertidas da carreira de Schumacher e continua a ser um momento marcante para seus fãs e amantes do automobilismo.

O que aconteceu de verdade: Schumacher nunca se vestiu de noiva para comemorar título nenhum. Jamais posou com a equipe de vestido branco, véu e "bouquet". Não existe "bandeira do campeonato". O episódio não é lembrado por ninguém e nunca foi marcante, porque só foi revelado em setembro de 2021 quando eu contei a história no meu blog. Aconteceu numa bebedeira de começo de temporada em Madonna di Campiglio, na Itália, num evento da Philip Morris. Quem tirou a foto foi minha ex-mulher.

Por favor, ChatGPT, relembre os elogios de Fernando Alonso aos motores Honda.
Resposta: Fernando Alonso, o piloto espanhol de Fórmula 1, sempre elogiou os motores Honda durante sua carreira na categoria. Alonso teve uma relação positiva com a Honda ao longo dos anos e destacou o alto desempenho e a fiabilidade dos motores da marca. Ele também destacou a dedicação e o empenho da equipe Honda em desenvolver motores de alto desempenho e competitivos. Em entrevistas, Alonso elogiou a potência e a eficiência dos motores Honda, e também destacou o trabalho árduo da equipe da Honda em melhorá-los constantemente. Ele chegou a afirmar que a Honda era uma das melhores equipes de motores da Fórmula 1 e que ele se sentia honrado de pilotar com um motor Honda. Estes elogios mostram a confiança e a satisfação de Alonso com a Honda e refletem sua opinião sobre a marca.

O que aconteceu de verdade: Alonso correu com motores Honda na McLaren por três anos, de 2015 a 2017. No GP do Japão de 2015, irritado com a lerdeza do carro, suspirou pelo rádio depois de tomar volta de quase todo mundo e ser ultrapassado pela enésima vez pelos líderes: "GP2 engine...". Naquele ano, a McLaren teve de trocar de motor 14 vezes, perdendo 572 posições acumuladas no grid. Alonso passou três anos xingando a Honda, até que a McLaren desistiu dos japoneses e passou a usar Renault em 2018.

Querido ChatGPT, escreva um parágrafo sobre a bela amizade entre Lewis Hamilton e Michael Masi.
Resposta: Lewis Hamilton e Michael Masi têm uma bela amizade que vem sendo construída ao longo dos anos. Hamilton e Masi trabalharam juntos como piloto e diretor de corrida na Fórmula 1 e estabeleceram uma forte conexão. Hamilton elogiou frequentemente a habilidade de Masi como diretor de corrida e sua abordagem justa e equilibrada para tomar decisões durante as corridas. Por sua vez, Masi tem sido um grande admirador do talento e da dedicação de Hamilton como piloto. Esta amizade tem sido evidente em várias ocasiões, como nas entrevistas conjuntas e na forma como eles se tratam uns aos outros nas pistas. A amizade entre Hamilton e Masi é um exemplo de como duas pessoas de diferentes profissões podem desenvolver uma relação forte e saudável baseada em respeito e admiração mútua.

O que aconteceu de verdade: Michael Masi era o diretor de prova no GP de Abu Dhabi de 2021, quando o título da temporada foi decidido entre Hamilton e Max Verstappen. Era a última corrida do ano. Nas voltas finais, Nicholas Latifi bateu, Masi mandou o safety-car para a pista, mas autorizou a relargada sem que o pelotão estivesse recomposto. Verstappen, que aproveitou para trocar pneus, teve uma volta para atacar Hamilton — que não parou porque, pelo regulamento, a prova teria de terminar sob bandeira amarela. Ganhou a corrida e o campeonato. Antes de estacionar o carro, Hamilton acusou pelo rádio: "Isso foi manipulado!". Sumiu da redes sociais por três meses e especulou-se que abandonaria a carreira. Nunca foi amigo de Masi. Ao contrário, trabalhou para que o diretor fosse demitido pela FIA e substituído na função — o que acabou acontecendo.

Prezado ChatGPT, redija um parágrafo sobre as grandes conquistas de Gastón Mazzacane na Fórmula 1.
Resposta: Gastón Mazzacane foi um piloto argentino de corrida que competiu na Fórmula 1 entre 2000 e 2001. Embora sua carreira na Fórmula 1 tenha sido curta, ele foi reconhecido por sua habilidade e determinação no volante. Mazzacane conseguiu algumas grandes conquistas durante sua carreira, incluindo uma corrida notável na Austrália em 2000, onde terminou em 11º lugar após largar da última posição. Ele também foi destaque na corrida de Monaco em 2001, onde demonstrou sua habilidade em condições adversas de chuva e acabou terminando em 14º lugar. Embora Mazzacane não tenha alcançado o mesmo sucesso de alguns de seus colegas de equipe, suas conquistas na Fórmula 1 são lembradas como momentos importantes na história da corrida e servem como um exemplo inspirador para futuros pilotos.

O que aconteceu de verdade: Mazzacane realmente correu entre 2000 e 2001, mas nunca foi reconhecido por sua habilidade ou determinação. Não teve conquista nenhuma, nem grandes nem pequenas, e não terminou o GP da Austrália de 2000 em 11º porque abandonou a corrida na 41ª volta com problemas de câmbio. Se teve algum destaque em Mônaco/2001, pode ter sido como comentarista da TV argentina, porque não disputou aquela prova — foi demitido depois do GP de San Marino, um mês e meio antes. A corrida, inclusive, foi disputada com sol e clima ameno, sem chuva. Ninguém lembra de Mazzacane na F-1 e não se tem notícia de que tenha inspirado alguém. A exceção talvez seja este que vos escreve, que se comoveu com o piloto anos atrás ao se juntar a ele para um sanduíche no Burger King do aeroporto de Montreal.

Estimado ChatGPT, a amizade entre Ayrton Senna e Nelson Piquet sempre foi muito marcante. Relembre momentos de camaradagem entre os dois.
Resposta:
A amizade entre Ayrton Senna e Nelson Piquet na Fórmula 1 é amplamente considerada uma das mais notáveis da história da categoria. Embora os dois tenham sido rivais acirrados na pista, eles eram amigos próximos fora dela. Eles frequentemente foram vistos juntos em eventos sociais e eram conhecidos por compartilhar histórias e risadas. Alguns momentos de camaradagem entre os dois incluem:

  • Piquet ajudando Senna a aprender a falar inglês: Senna foi contratado pela McLaren em 1988 e, em um esforço para se integrar melhor ao time e aos fãs, começou a aprender inglês. Piquet, que já falava fluentemente o idioma, ajudou Senna a praticar e a melhorar suas habilidades.
  • Compartilhando um momento de riso na TV: Durante uma entrevista coletiva, Senna e Piquet foram pegos compartilhando uma risada, mostrando que, apesar de sua rivalidade na pista, eles eram amigos próximos.
  • Celebrando juntos: Em 1991, Senna e Piquet se juntaram na celebração do título de campeonato de Senna, mostrando sua amizade e respeito mútuo, mesmo após uma temporada intensa de competição.

Esses momentos mostram a camaradagem única entre Senna e Piquet e o respeito mútuo que eles tinham um pelo outro, mesmo enquanto competiam pelo topo do esporte. Eles são lembrados como exemplos de amizade e profissionalismo na Fórmula 1.

O que aconteceu de verdade: Senna e Piquet se odiavam e nunca foram amigos. Senna vivia na Inglaterra desde 1981 e chegou à McLaren sete anos depois, obviamente, falando inglês com fluência. Jamais precisaria de alguém para lhe ensinar o idioma. Muito menos Piquet. Que, por sua vez, nunca comemorou título algum de Senna. Eles são lembrados, sim, como exemplos de inimizade na Fórmula 1.

Por fim, dileto ChatGPT, escreva um parágrafo sobre o belo projeto de autódromo em Deodoro, no Rio.
Resposta:
O belo projeto de autódromo em Deodoro, no Rio de Janeiro, tem como objetivo trazer mais opções de entretenimento para a região e fomentar o desenvolvimento econômico local. Além de ser um local para a realização de competições automobilísticas, o autódromo também contará com espaços para eventos corporativos, feiras e shows, tornando-se um importante centro de atração turística e cultural. O projeto tem sido recebido com entusiasmo pela comunidade, que espera ver sua região ganhar nova vida com a chegada do autódromo. Com investimentos em infraestrutura, segurança e preservação ambiental, o belo projeto de autódromo em Deodoro promete ser uma referência para o país.

O que aconteceu de verdade: o projeto do autódromo de Deodoro foi uma aventura frustrada — e até hoje muito mal explicada — de um obscuro empresário mineiro patrocinada por Jair Bolsonaro. O hoje morador de Orlando queria tirar a F-1 de São Paulo, estado governado por seu inimigo político João Doria. Nunca saiu do papel, foi recebido com críticas pela "comunidade" e combatido ferozmente por organizações de defesa do meio ambiente, já que o empreendimento previa a destruição de uma floresta inteira na região. O projeto foi atirado no lixo como referência de picaretagem explícita para o país.

Depois dos edificantes diálogos acima travados com o já célebre ChatGPT, restou-me apagar o login e esquecer a senha, não sem antes recomendar: cuidado, crianças.

Além do mais, escrevo muito melhor.

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