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Eliana Alves Cruz

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Abuso infantil no esporte: A dor dentro dos troféus

02/12/2021 04h00

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Estudo com mais de 10 mil pessoas em seis países europeus revela que três em cada quatro menores sofreram abusos psicológicos ou físicos praticando esportes

Um estudo encabeçado pelo sociólogo do esporte Mike Hartill, da universidade inglesa de Edge Hill, e Bettina Rulofs, da universidade alemã de Wuppertal e divulgado no último dia 29 no site World Athletics, trouxe resultados perturbadores e aterradores.

A pesquisa financiada pela União Europeia ouviu pessoas entre 18 e 30 anos que praticaram esportes desde a infância na Áustria, Bélgica, Alemanha, Romênia, Espanha e Reino Unido e conclui que dentro dos troféus do esporte de alto rendimento existem poças de abuso psicológico e físico.

Um repertório vasto de humilhações dores e traumas que não deveriam constar em uma das atividades humanas mais inspiradoras e formadoras de ídolos.

Os relatos dos 10.302 entrevistados mostram que quase dois terços sofreram violência psicológica —humilhações em seus mais variados graus— e 44% violência física. O mergulho neste sofrimento infantil vem na esteira de muitos casos de abuso infantil no esporte que se tornaram grandes na mídia, pontas de um iceberg que apontam para uma montanha subterrânea em um mar pouco ou nada explorado pelos maiores organismos internacionais do esporte.

  • 65% dos adultos (de 18 a 30 anos) relataram ter sofrido violência psicológica quando crianças.
  • Crianças pertencentes a grupos de minorias éticas são significativamente mais propensas a sofrer abuso em 76,9%.
  • 44% relataram ter sofrido violência física dentro do esporte quando crianças.
  • A negligência foi experimentada por 37% dos entrevistados.
  • 35% relataram ter experimentado violência sexual sem contato.
  • 20% relataram violência sexual por contato.
  • A prevalência de violência interpessoal contra crianças é mais baixa para os entrevistados em esportes recreativos (68%) e mais alta para aqueles que competem em esportes internacionais (84%).
  • Os números para cada forma de violência interpessoal foram muito semelhantes entre os países, sugerindo que o problema não é exclusivo de um país.


A pesquisa aponta os clubes e agremiações como os locais onde os abusos ocorrem e apontam a incapacidade das instituições de identificar, prevenir, punir e proteger os menores atletas para além dos protocolos contra violência sexual.

Os autores do estudo encabeçado pelo professor Mikel apontam o quão enraizadas estão determinadas práticas que revelam as relações nada saudáveis entre adultos e crianças no esporte e tiram a máscara um tanto hipócrita de ações pontuais que podem ser boas para o marketing, mas nada eficazes em proteger os meninos e meninas.

Uma pesquisa deste quilate em nações ditas de "primeiro mundo" acende um alerta vermelho em toda parte. É possível preservar a infância destes pequenos e destas pequenas atletas? O que estará acontecendo dentro de clubes e academias brasileiras, que as pesquisas ainda não alcançaram e, mais que as pesquisas, o interesse de todo um país tão pouco cuidadoso com as suas crianças?

Esporte de alto nível, infância e felicidade podem andar juntos?