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Brasil tem primeiro filhote de peixe-boi em recinto de aclimatação do mundo

Paty e a peixe-boi bebê, ainda sem nome - ICMBio/ APA Costa dos Corais
Paty e a peixe-boi bebê, ainda sem nome Imagem: ICMBio/ APA Costa dos Corais

Ed Rodrigues

Colaboração para Ecoa, do Recife

28/04/2022 06h00

Com menos de um metro de comprimento e peso ainda indeterminado, o primeiro filhote de peixe-boi-marinho a nascer em um recinto de aclimatação é uma fêmea e veio ao mundo nesta terça-feira (26), em Alagoas. Segundo o ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade), o nascimento é o primeiro do Brasil a acontecer nesse tipo de ambiente e, até onde se tem registro, é também inédito no mundo.

A Ecoa, o instituto ressaltou que o evento é de grande importância para a comunidade científica, e possibilita ao Projeto Peixe-Boi, vinculado ao ICMBio, a oportunidade de desenvolver pesquisas sobre a reprodução da espécie, comportamento e saúde — além da sensibilização ambiental da população em relação ao peixe-boi-marinho, que é ameaçado de extinção no Brasil.

A bebê peixe-boi não foi batizada. Ela está na companhia da mãe na APACC (Área de Proteção Ambiental Costa dos Corais), no CMA (Centro de Mamíferos Aquáticos), mas ainda não foi manejada. A equipe veterinária está aguardando um pouco para registrar peso e o comprimento do espécime, no intuito de não estressar mãe e filhote.

A mãe é a peixe-boi Paty, que foi resgatada em 2014, ainda filhote, no litoral norte de Alagoas, na praia de Pratagy. O resgate, de acordo com o instituto, foi realizado por equipes do ICMBio, CMA, APA Costa dos Corais e o Instituto Biota de Conservação.

Paty teve problemas de saúde no início da reabilitação. Para ter condições de retornar à natureza, teve que ser transferida para Porto de Pedras (AL), em 2019, onde permaneceu no recinto de aclimatação junto com um espécime macho, Raimundo, pai da filhote.

Em 2021, os dois seriam soltos no rio Tatuamunha. No entanto, durante a soltura, a equipe percebeu Paty um tanto "cheinha" e suspeitou de uma possível gestação. A desconfiança dos veterinários estava correta e eles suspenderam a libertação. A partir de então, foi dado início ao monitoramento da gestação, que teve apoio de pesquisadores da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco).

Aclimatação

Fernanda Attademo, médica veterinária do ICMBio/CMA, contou que a bebê é aparentemente pequena para um filhote da espécie, mas a confirmação só ocorrerá quando chegar a hora de manejá-la.

A especialista também explicou a Ecoa o que diferencia um recinto de aclimatação dos cativeiros tradicionais de reabilitação: enquanto esta ocorre em piscinas ou tanques artificiais onde é possível haver o controle de amamentação, por exemplo, o recinto de aclimatação simula o habitat natural da espécie, incluindo a convivência com outros animais.

"Quando estão aptos para serem soltos, eles precisam passar por um processo que chamamos aclimatação, que seria a adaptação gradual ao ambiente natural. Esses recintos são construídos em locais semelhantes àqueles onde eles serão soltos — neste caso, o rio Tatuamunha, em Porto de Pedras. Nesses locais, eles têm contato com o ambiente, com outras espécies animais e até mesmo com outros peixes-boi. Por isso é que se chama recinto de aclimatação, pois eles vão se aclimatar ao ambiente até estarem prontos para serem soltos", disse.

Assim, a bebê peixe-boi terá contato com tudo de seu habitat natural, mas ainda sob os cuidados e olhares das equipes do ICMBio até estar apta para ser inserida à natureza. Fernanda Attademo acrescentou que essa adaptação leva em média cinco anos.

"Ela vai poder nos dar respostas até sobre as melhores formas de cuidar dos animais. Mas não temos como saber com exatidão em quanto tempo poderemos soltá-la. Como já nasceu em recinto de aclimatação, teoricamente não tem que passar por esse período de adaptação, somente ter independência da mãe", completou.

Fábia Luna, coordenadora do ICMBio/CMA, ressaltou que o Centro de Mamíferos Aquáticos solta animais em Alagoas desde 1994. Essas solturas na região estão colaborando para a melhoria genética da população do estado e tem evitado que o risco de extinção aumente.

Roberta Carvalho, chefe do Núcleo de Gestão Integrada Costa dos Corais, concorda e diz que o nascimento de um peixe-boi significa esperança de vida para uma espécie ameaçada de extinção e para o equilíbrio ecológico. A ambientalista acredita que o processo deve contribuir para que os seres humanos compreendam o quanto esse animal é importante para o meio ambiente e para vida de muitas pessoas, colaborando até mesmo com o desenvolvimento econômico da região.

"Esse nascimento indica que estamos no caminho certo para o repovoamento dessa espécie. Estamos felizes demais. Gratidão a todos os parceiros e equipe. Eles, sim, são responsáveis por toda essa conquista para o meio ambiente", comemorou.