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COP26: Brasil cede em negociação de mercado de carbono, mas falta consenso

Manifestante faz referência à meta de limitar o aquecimento global a 1,5°C, um dos principais temas discutidos na COP26 - REUTERS/Yves Herman
Manifestante faz referência à meta de limitar o aquecimento global a 1,5°C, um dos principais temas discutidos na COP26 Imagem: REUTERS/Yves Herman

Da RFI

11/11/2021 18h25

Depois de ser um dos países que dificultaram um acordo sobre a criação de um mercado global de carbono na última Conferência do Clima da ONU, realizada em Madri há dois anos, o Brasil agora cedeu sobre o tema na COP26, em Glasgow, em busca de um consenso. O assunto é tratado no âmbito do Artigo 6 do Acordo de Paris sobre o Clima e é um dos que permanecem bloqueados na reta final da cúpula, prevista para se encerrar nesta sexta-feira (12).

Lúcia Müzell, enviada especial da RFI a Glasgow

A delegação brasileira apoia um texto apresentado pelo Japão, que prevê a criação de um organismo sob a tutela da Convenção das Nações Unidas para as Mudanças Climáticas (UNFCC) para certificar projetos verdes - públicos ou privados - que promovam a redução das emissões de CO2 ou capturem carbono. Esses projetos geram créditos a serem negociados com outros países em "dívida" de emissões. Planos de transição energética para fontes renováveis ou reflorestamento, por exemplo, se encaixam nesse objetivo.

A transação então seria reportada para as metas dos países envolvidos, a fim de evitar a chamada dupla contagem dessas emissões (tanto pelo país vendedor, quanto pelo comprador), nas suas próprias NDCs (sigla em inglês para Contribuições Nacionalmente Determinadas). O Brasil tem um interesse particular na regulamentação desse mercado, por ser um potencial exportador de bilhões de toneladas de CO2. Até então, entretanto, o país se opunha à ideia de abrir mão de todos esses créditos na sua NDC.

"A proposta garante toda a integridade do sistema, para que o sistema e o mercado sejam uma ferramenta de mais ambição e de uma transição mais justa, especialmente para regiões que precisem de projetos de incentivos econômicos de baixa emissão, que possam gerar créditos", explicou o ministro do Meio Ambiente Joaquim Leite, em coletiva de imprensa na noite desta quinta-feira. Para Leite, a implementação do mecanismo "pode ser uma ferramenta" para o cumprimento do Acordo do Clima e garantir a neutralidade de carbono até 2050 ou 2060, conforme o país.

Oposição à proposta

"Mas, infelizmente, alguns países ainda estão resistentes a essa proposta apoiada pelo Brasil e vários outros países. Temos 24, talvez 48 horas para buscar esse consenso", disse o ministro. "O que a gente tem que fazer é buscar os países em desenvolvimento e também desenvolvidos que ainda não estão aderindo a essa proposta."

O ministro se recusou a revelar quais nações se opõem à iniciativa, mas os africanos e as pequenas ilhas - os países mais vulneráveis à crise climática - têm martelado para que os recursos gerados pelo mercado de carbono sejam direcionados para a adaptação às mudanças climáticas.

Financiamento

A outra prioridade do governo brasileiro na COP26 é a definição do financiamento para os países em desenvolvimento - o segundo maior foco de discórdias em Glasgow, conforme ressaltou o presidente da conferência, Alok Sharma, nesta tarde. Os valores a serem repassados anualmente a partir de 2025 ainda estão longe de uma definição e a cúpula pode até ser encerrada sem que uma solução seja encontrada. Segundo Leite, cifras que chegam a US$ 1 trilhão ou até US$ 5 trilhões estão sobre a mesa - números distantes dos atuais US$ 100 bilhões previstos no Acordo de Paris, e que até hoje não se concretizaram plenamente.

A questão financeira cristaliza as divergências profundas entre os países desenvolvidos e os em desenvolvimento, que alegam que não poderão cumprir os mesmos prazos de redução de emissões de gases de efeito estufa que as nações já industrializadas. Um dos objetivos desta COP26 é que todos os países apresentem novas metas de corte de CO2 já no ano que vem - algo, que, para os países pobres, é inimaginável sem a liberação de recursos mais robustos.