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Tomas Rosenfeld

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Colunas

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Imagem: iStock

17/09/2021 13h33

Quando era criança, coluna era sinônimo de espinha, composta por ossos e responsável pela manutenção de uma boa postura. Quando cresci, minha noção de espaço alargou-se um pouco e a palavra passou a ser revestida de mármore ou gesso, compondo os projetos de arquitetos e engenheiros, de casas e edifícios. Finalmente, com o hábito da leitura, uma camada mais abstrata ganhou forma, e a coluna passou a descrever esses espaços breves de opinião na mídia.

Ao pensar em coluna, a primeira imagem que me vem à mente é do meu antigo professor de Aikido, vestindo um kimono branco, com os pés descalços sobre o tatame escuro. José Bueno nos instruía a manter as pernas bem apoiadas, como raízes fixas ao solo. Com uma boa base, poderíamos deixar a coluna solta, livre para o movimento.

Posso ainda pensar nas cornijas que ornamentavam as colunas dos templos gregos ou romanos. Sobre as ordens Jônica ou Dórica, com traços mais ou menos rebuscados que aprendi a identificar durante as poucas aulas de história da arquitetura que frequentei.

Atualmente, penso mais na coluna como espaço da escrita. Um nome, que até onde pude apurar, surgiu da diagramação no jornal impresso, a área estreita de conteúdos não-noticiosos que se estendiam ao longo do eixo vertical nos periódicos do século 19.

Um dos meus primeiros contatos com esse espaço foi por meio da Solange, nossa professora de português na escola. Ela era fã do Contardo Calligaris e, talvez por lê-lo semanalmente desde a sétima série, acabei por considerá-lo como alguém próximo.

A Maria Lídia, nossa professora de geografia do colegial, gostava do Demétrio Magnoli. Suas colunas tratavam de povos distantes, histórias desconhecidas, sempre com uma certeza que me assombrava. Nos tempos de escola, lia ainda o José Simão, com um humor que às vezes me fugia e que eu seguia perseguindo. Nos últimos anos, muitos colunistas acompanharam o meu café da manhã, as crônicas do Antonio Prata, as reflexões sobre o mundo de Igor Gielow, a China de Tatiana Prazeres, as reflexões da Tati Bernardi ou os impactos da tecnologia trazidos por Ronaldo Lemos.

Atualmente, as colunas ocupam espaços que vão além da manhã. Sempre me impressiono com a capacidade das colunas de Julián Fuks de nos fazer entrar em tão poucas linhas em seu mundo e as reflexões trazidas por colunistas como Fred Di Giacomo, Anielle Franco, Tainá de Paula e Marina Mathey.

Quando fui convidado para escrever nesse espaço de UOL Ecoa, minha esposa me mostrou um trecho da uma entrevista do Contardo no Roda Viva. Nele, a jornalista Marília Neustein faz uma pergunta sobre a felicidade, referindo-se a uma frase recorrente do entrevistado. Contardo costumava dizer que para ele a questão não era ser feliz, mas ter uma vida interessante. A entrevistadora pergunta então se a literatura contribuía para esse interesse pela vida.

Descruzando as pernas, ele diz que sim. Que na verdade a coisa mais importante para tornar sua vida interessante era sua coluna semanal na Folha de São Paulo. Diante do compromisso de escrever periodicamente, via-se estimulado a experimentar mais, ler livros, assistir filmes e refletir sobre eles. Segundo ele, essa frequência alimentava a intensidade da vida, fazendo com que tivesse que existir a cada semana algo que valesse a pena ser contado.

Para ele, a coluna ia além de sustentar o corpo ou o edifício — dava suporte ao interesse pela própria vida. Como os ensinamentos do Aikido, sugeria manter uma base fixa para movimentar-se pelo mundo.