Veículos ecológicos

Novas regras 'matam' carros veteranos e devem eliminar até câmbio manual

Rafaela Borges Colaboração para o UOL Estevan Silveira

O ano de 2022 começou com uma mudança importante no mercado automotivo. Após tentativa de adiamento e muita reclamação das montadoras, entrou em vigor a sétima fase do Proconve (Programa de Controle da Poluição do Ar por Veículos Automotores).

Na prática, a busca por veículos menos poluentes e mais verdes fará com que carros veteranos das concessionárias deem adeus, abrindo espaço por automóveis produzidos para atender às novas regras.

Mas não são somente alguns carros ou versões que caminham para o fim. Até mesmo alguns hábitos do brasileiro, como o uso do câmbio manual, podem ser afetados pelas mudanças.

O UOL Carros procurou especialistas e mostra o que a nova fase do Pronconve deve alterar na rotina de montadoras e clientes nos próximos anos.

Luta contra as emissões

O Programa de Controle de Emissões Veiculares (Proconve) entrou em sua sétima fase no dia 1º de janeiro de 2021. Para veículos leves, esse estágio é chamado de L7, e chega oito anos após a L6, que foi lançada em 2013 e atingiu 100% de carros dessa categoria em 2015.

Devido a esse longo intervalo, o próximo estágio, L8, já tem data marcado. E será ainda mais restritiva. A oitava fase está prevista para 2025 e, agora, as montadoras já precisam começar a se preparar para ela.

O Proconve não é sobre emissões de gás carbônico (CO2), que não é nocivo à saúde, mas contribui para cumulação do gases responsáveis pelo efeito estufa e aquecimento global. Até por isso, as restrições impostas para a L7 não terão necessariamente impacto no consumo de combustível dos carros.

"O programa visa reduzir as emissões de gases tóxicos, como os óxidos nitrosos", explica o diretor-presidente da SAE4Mobility, Erwin Franieck. "Nem sempre a menor emissão desses gases está relacionada ao consumo de combustível."

Tanto é assim que os novos motores turbo do Grupo Stellantis (o 1.0 do Fiat Pulse e o 1.3 da picape Toro e dos Jeep Compass e Commander) vêm sendo considerado por especialistas um exemplo de baixas emissões de gases poluentes.

No entanto, esses propulsores não estão conseguindo chamar a atenção pelo baixo consumo. Pelo contrário. Gastam mais combustível que o esperado.

Início do fim do câmbio manual

Pelo L6, a tolerância é de 0,05 g/km de hidrocarbonetos e de 0,08 g/km de óxidos nitrosos. No L7, ambos foram reunidos em um único parâmetro, o Nmog (gases orgânicos não metanos). O etanol não queimado também é adicionado a essa conta.

A tolerância total às emissões dos chamados Nmog passa a ser 0,08 g/km. E, como ocorreu em todas as fases do Proconve, essa mudança vai levar ao desaparecimento de alguns componentes usados no carro.

O principal ponto a ser melhorado pelas montadoras é a queima na fase fria do motor, de acordo com especialistas. Por isso, as mudanças terão de ser feitas em vários aspectos, desde a entrada do combustível no tanque, que precisarão ter permeabilidade menor. Essa é a razão de a Fiat ter reduzido o tanque da Toro de 60 para 55 litros.

"Entre os sistemas que serão importantes para atender a nova fase do Proconve estão a injeção direta e indireta de combustível e o comando variável de válvulas", diz Franieck.

Os catalisadores precisarão ser retrabalhados deverão ficar mais próximos do escape. "Os motores aspirados mais antigos, que começaram a ser produzidos há dez anos ou mais, terão mais dificuldade de passar", explica. Além disso, o sistema de injeção de gasolina na fase fria (o famoso tanquinho auxiliar dos carros flex) deixa de existir.

Outro sistema que tende a desaparecer é o câmbio manual, bem como os automáticos com menos de seis marchas. "A transmissão é um dos elementos mais importantes para que os carros cumpram as normas do L7", diz Franieck. "O sistema sintoniza o motor nas melhores faixas. Quanto mais marchas, melhor."

Para o especialista, o câmbio manual é um empecilho ao cumprimento das normas, pois dificilmente o motorista faz as trocas no momento ideal. "É um recurso usado conforme conveniência."

Assim como motores mais antigos, algumas plataformas podem não estar aptas a receber adaptações necessárias para adequar um veículos às normas do L7. Entre os exemplos está a instalação de caníster maiores, outra medida fundamental para que um carro cumpra as exigências.

Como, nesses casos, os custos para adaptar as bases é muito alto, a melhor solução encontrada pode ser tirar o modelo de linha. Entre os carros que nos deixaram recentemente (ou deixarão) estão os Fiat Uno e Grand Siena, além de Volkswagen Fox, Renault Sandero RS e Jeep Renegade 1.8.

Preparação para a próxima fase

Na fase L8 do Proconve, haverá uma nova forma de medição de poluentes, chamada de Real Drive Emission (emissões no mundo real, em tradução livre). Atualmente, todos os testes são feitos em laboratório.

A partir do L8, os testes passam a ser realizados também na rua, em situações reais de condução. Essa exigência tem de ser implementado pelas montadoras a partir de agora, em todos os novos modelos lançados. Por enquanto, elas não precisam cumprir os padrões mais restritos da próxima fase.

Porém, para cada novo produto que lançam, já têm de apresentar os resultados das medições na vida real, como forma de adaptação ao próximo estágio. "Isso dificultará, para as montadoras, o processo de homologação dos veículos no Brasil", opina Franieck

Híbrido e turbo são aliados das montadoras

Quando pensamos em carro híbrido, a associação imediata é com redução de consumo de combustível, que não está necessariamente associada à menor emissão de gases nocivos. Por isso, o Proconve não será o programa, em nenhuma fase, que vai determinar um mercado dominado por modelos desse tipo - para isso, há outras iniciativas de eficiência energética dentro do regime automotivo Rota 2030.

Porém, a tecnologia híbrida é uma grande aliada das montadoras na missão de adequar seus conjuntos às normas do L7. "Na fase fria, que é a mais crítica, o carro pode operar com o motor elétrico, enquanto o a combustão aquece", diz Erwin Franieck, da SAE4Mobility.

Por isso, a tendência é que as montadoras comecem a lançar mais carros híbridos flex. Exemplos estarão nas ruas em breve. Depois da linha Corolla com essa tecnologia, haverá também versões que combinam motor elétrico ao flexível de modelos como Kicks e Compass. A Volkswagen adotará o recurso - possivelmente no Taos.

Outro grande aliado é o turbo feito para o downsizing - processo que reduz o tamanho do motor mas, com uso de turbina, o torna mais potente e menos poluente. Com esse recurso, o motor aquece mais rapidamente, pois tem cargas mais adequadas para a fase de partida.

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