Revista britânica exagera custo de manter carro no Brasil

Um blog ligado ao site da revista britânica The Economist publicou no último dia 4 um gráfico sobre o custo de comprar e manter um carro em 14 cidades do planeta. São Paulo aparece como a segunda mais cara, atrás apenas de Xangai (China).
Paris, Londres, Tóquio e Nova York, cidades mais importantes de França, Inglaterra, Japão e Estados Unidos, aparecem num bloco intermediário de custos.
Segundo o blog, em São Paulo seriam necessários cerca de US$ 130 mil (ou R$ 260 mil considerando câmbio de R$ 2) para comprar e manter por três anos um modelo médio, com motor entre 1,8 e 2,5 litros, rodando cerca de 16 mil quilômetros anualmente com consumo médio de 12,4 km/litro. Os valores-base são do período de 2010 a 2012. O post repercutiu em publicações do Brasil.
Os números divulgados pela Economist, todos em dólar, seriam uma espécie de média para aquisição e manutenção de carros de várias marcas, inclusive das premium (Audi, BMW, Mercedes-Benz), no mercado de cada cidade. Também foi ponderado o poder de compra médio de cada país. A conta final inclui conhecidos custos indiretos para ter e manter um carro, como impostos, multas, pedágio, estacionamento, troca de peças, reparos leves etc.
CUSTO REAL PARA MANTER UM SEDÃ MÉDIO EM SÃO PAULO POR 3 ANOS
Marca/modelo | Toyota Corolla XEi A/T 2.0 |
Preço em 2010 | R$ 75.830 |
Documentação | R$ 3.412 |
Seguro (5%) | R$ 3.791 |
Gastos diversos | R$ 2.500 |
Manutenção | R$ 1.000 |
Combustível (1.300 litros de gasolina por ano a R$ 3 o litro) | R$ 3.900 |
Depreciação (15% a cada ano) | R$ 11.374 |
Gastos totais no 1º ano (1) | R$ 101.807 |
Custo total por 3 anos | R$ 142.542 |
1 - Incluem a depreciação média | Cálculos por UOL Carros |
No entanto, o estudo pode não ter considerado que o padrão de consumo no Brasil é heterogêneo, ou seja, cada faixa de renda consome de modo totalmente diferente das demais. A inclusão de modelos de marcas premium é discutível, porque Audi, BMW e Mercedes somadas tiveram participação de mercado abaixo de 1% em 2010, um valor quase residual.
O blogueiro da revista aparentemente também não levou em conta que carros com motores acima de 1,8 litro são minoria no Brasil.
Em 2012, a participação dos motores de 1 litro no total de vendas de automóveis e utilitários leves no Brasil foi de 34,07%. Carros entre 1 litro e 2 litros ficaram com 58,22%, mas boa parte dos que se incluem nesta faixa têm propulsores de, no máximo, 1,6 litro (caso dos best-sellers Volkswagen Gol, Fiat Uno, Fiat Palio, Hyundai HB20 e VW Fox). Acima de 2 litros, a participação foi de apenas 7,71%.
Isso significa que, para boa parte dos consumidores brasileiros, o custo de ter um carro com motor de capacidade entre 1,8 e 2,5 litro não é uma questão real -- simplesmente porque apenas uma pequena fatia deles é afetada.
RECÁLCULO
UOL Carros refez as contas da Economist tomando por base dois carros bem conhecidos: o Volkswagen Gol 1.0 (G5), versão de entrada do modelo mais vendido no país; e o Toyota Corolla XEi A/T 2.0, configuração completa (mas não topo de gama) do líder de emplacamentos entre os sedãs médios.
O Corolla, que em março de 2010 já era ano-modelo 2011 e custava R$ 75.830 na versão escolhida, pode ser considerado o carro-padrão para o levantamento proposto pela revista britânica; já o Gol, que valia R$ 32.880 (e que, obviamente, está fora da faixa de motorização da amostra), é um carro típico de nosso mercado, um carro "real".
GOL É A REALIDADE
No caso do Gol, UOL Carros fez as mesmas contas do Corolla, com valores diferentes onde necessário -- por exemplo, sua documentação é mais barata, mas o seguro pode chegar a 10% do valor do carro. Como o modelo tem garantia total de apenas um ano, os custos estimados de manutenção foram de R$ 500 no 1º ano e R$ 1.000 nos dois seguintes. Os valores finais:
Custo total do carro em 3 anos:
R$ 78.469 (US$ 39.234)
Custo total após revenda:
R$ 58.277 (US$ 29.138)
Nos dois casos, os resultados dos cálculos apontaram custo bem abaixo dos US$ 130 mil que levaram São Paulo ao posto de segunda cidade mais cara domundo para manter um carro.
Com o Corolla (custo: US$ 71.271), ela empataria em 4º lugar com Sydney (Austrália); com o Gol (custo: US$ 39.234), ficaria em 14º, ou seja, seria a cidade mais barata entre todas do levantamento.
Se for levado em conta o valor de revenda dos carros ao final dos três anos de uso, descontando-o do gasto total até então (porque certamente as pessoas não os jogam no ferro-velho após esse período), São Paulo empataria em oitavo lugar com Paris no caso do Corolla (custo líquido: US$ 47.986), e repetiria a "última" posição com o Gol (custo líquido: US$ 29.138), ainda mais distanciada do 13º lugar (que seria, portanto, Zurique). As contas feitas por UOL Carros estão em quadros nesta página.
Caso reste alguma dúvida sobre estes cálculos e os da Economist, perguntamos: que paulistano teria renda suficiente para topar gastar R$ 260 mil ao longo de três anos (R$ 87 mil por ano) com um único bem?
Os números do blog da Economist não refletem a realidade do mercado automotivo brasileiro. Nossos carros são caros e gasta-se muito dinheiro com eles -- mas não tanto quanto dizem por aí.
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