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Argentina cita Brasil e suspende acordo automotivo com o México

Cristina Kirchner, presidente da Argentina (na foto, ao lado do presidente mexicano Felipe Calderón), alega "condições desfavoráveis" para suspender acordo por três anos  - Cris Bouroncle/AFP
Cristina Kirchner, presidente da Argentina (na foto, ao lado do presidente mexicano Felipe Calderón), alega "condições desfavoráveis" para suspender acordo por três anos Imagem: Cris Bouroncle/AFP

Do UOL, em São Paulo (SP)

26/06/2012 17h26Atualizada em 26/06/2012 18h35

A Argentina confirmou, nesta terça-feira (26), ter suspendido por três anos a validade do acordo de comércio automotivo com o México, informou o jornal "El Universal", do país norte-americano. A informação surge um dia depois do secretário de Economia do México, Bruno Ferrari, ter afirmado que o país sul-americano estava disposto a abandonar o pacto alegando condições desfavoráveis.

Ainda de acordo com a publicação mexicana, Cristina Kirchner, presidente da Argentina, teria decretado a suspensão do chamado ACE 55 (Acordo de Complementação Econômica Número 55, assinado em 2002 por Brasil, Argentina, Uruguai, Paraguai, Venezuela e México), que rege o comércio de automóveis, autopeças e outros produtos do setor, de modo unilateral por conta do "grave impacto" nas regras do acordo.

O pivô da decisão foi a recente discussão dos termos do acordo feita entre Brasil e México (lembre do caso aqui) no último mês de março. A Argentina reclama de ter sido deixada de lado na discussão do processo que levou à revisão dos termos e à limitação do número de automóveis mexicanos que entram no mercado brasileiro.

De fato, o decreto de suspensão de Cristina Kirchner aponta que o alcance do acordo "somente pode ser alterado quando e apenas se as ditas modificações sejam acertadas entre as partes envolvidas e todos os demais signatários".

Ainda não está claro se a decisão da Argentina pode voltar a estremecer as relações comerciais do Brasil com o México, que somente há pouco retornaram a níveis próximos ao normal. Um novo baque no acordo voltaria a complicar as vendas de modelos de marcas como Fiat (que traz o utilitário Freemont e o compacto estiloso 500), Chevrolet (importa o Captiva e cogita trazer, no futuro, o recém-lançado Sonic, atualmente importado da Coreia do Sul), Ford (New Fiesta hatch e sedã e Fusion), Volkswagen (Jetta), Honda (traz o utilitário CR-V), Chrysler (Dodge Journey) e Nissan (da dupla March e Versa, e dos médios Tiida (hatch e sedã) e Sentra). 

  • Divulgação

    Ainda não se sabe se medida argentina pode levar a novo impasse na importação de carros vindos do México, como o popular March, o que poderia levar a outra derrubada nas vendas

SEMELHANÇAS COM BRASIL
Dados do governo argentino apontam que os termos vigentes do acordo automotivo levaram o país vizinho a déficit de US$ 995 milhões (mais de R$ 2 bilhões) em 2011. Em 2010, a diferença desfavorável aos argentinos -- importaram mais carros do México do que exportaram -- havia sido de US$ 380 milhões (quase R$ 790 milhões). 

A situação, de fato, é semelhante àquela que levou o Brasil a pedir a revisão dos termos do acordo, em março. Na época, o ministro Fernando Pimentel, do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, apresentou dados que citavam déficit de US$ 1,55 bilhão (quase R$ 3 bilhões) em 2011 com importações de carros provenientes do México. No período, o Brasil teria faturado US$ 512 milhões em exportação de carros para o México, enquanto gastou US$ 2,07 bilhões na compra (importação) de automóveis fabricados em unidades mexicanas (mais detalhes aqui).

No auge da crise entre Brasil e México, as equipes econômicas de ambos chegou a cogitar a suspensão temporária do acordo, medida tomada agora pela Argentina. 

Há ainda semelhanças macroeconômicas entre os casos: mudanças de cenário, como a inversão da valorização das moedas (real ainda forte, mas em processo de desvalorização, e peso enfraquecido), além do salto de qualidade dos carros mexicanos, muito provavelmente à custa de componentes embarcados diretamente dos Estados Unidos, sem uma contrapartida fiscal adequada. 

MÉXICO FALA DURO
O México rebateu as reclamações da Argentina e afirmou não ter "identificado nenhum aspecto de índole comercial quer permita renegociar o acordo". 

  • Murilo Góes/UOL

    Em maio de 2011, o Brasil respondeu a restrições argentinas à entrada de carros na mesma medida: aumentou a burocracia para chegada de modelos argentinos, como a SpaceFox (acima)

Para a equipe econômica mexicana, o rompimento unilateral do acordo é apenas mais um caso de restrição às importações (protecionismo) por parte da Argentina. Há pouco mais de um ano, a Argentina impôs uma maior burocracia à entrada de carros brasileiros no país, o que levou o governo brasileiro a retrucar na mesma medida -- o caso levou a incertezas, logo desfeitas, sobre a venda de diversos modelos das quatro grandes fabricantes (Fiat, Volkswagen, Chevrolet e Ford) e das "newcomers" Citroën, Peugeot, Renault, Toyota e Honda, que mantém fábricas nos dois países, dividindo sua produção (mais sobre o ocorrido, aqui). 

Assim, o México afirma que tomará providências junto a órgãos internacionais -- a União Europeia, aliás, já registrou queixa contra a Argentina na OMC (Organização Mundial de Comércio) contra a Argentina, por conta de medidas de desestímulo às importações por parte do governo Kirchner.

"Estamos decididos a ir até as últimas consequências na defesa do comércio do México", afirmou o secretário de Economia, Bruno Ferrari, em entrevista coletiva.