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Alexandre da Silva

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

O que sufoca a vida de quem envelhece em 2022?

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Imagem: iStock

Colunista do UOL

18/07/2022 04h00

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Estamos no mês de julho, a três meses das eleições presidenciais e também de deputados, senadores e governadores, e muita tensão toma conta de toda a nossa atmosfera. Ninguém sabe exatamente quem vencerá e o que acontecerá com quem perder a eleição.

Até lá, é necessário pensar, se lamentar e até orar para que algumas condições não piorem. E pessoas idosas compõem um dos grupos mais afetados nesses últimos anos.

A senhora Lindinalva, 62 anos, protagonizou uma das cenas mais deprimentes para uma nação que se orgulha em ser uma grande potência exportadora de alimentos para o mundo. Com o dinheiro que tinha para comprar algum alimento rico em proteína, que é muito recomendado para o bom funcionamento de vários sistemas fisiológicos e anatômicos do corpo humano, depois de tanto andar e pesquisar, só conseguiu comprar pele e carcaça de frango.

Antes da pandemia, a gente comprava alcatra a vácuo. Para quem estava acostumada a trabalhar, entra em pânico numa situação dessas. Eu tinha a geladeira lotada de carne, disse ela.

Fico aqui imaginando se haveria algum constrangimento do açougueiro em pesar, "bem pesado como dizem", a quantidade solicitada pela senhora Lindinalva. Seria um motivo de demissão por justa causa se esse funcionário se mostrasse desatento e deixasse passar um pedaço de carne de frango, só para Lindinalva e sua família voltassem a experimentar o gosto de carne que exige um tempo maior de mastigação e têm um sabor que sempre os agradou?

Outras condições que entristecem as pessoas idosas se referem ao emprego escasso e à renda que já não é mais mensal, é para uma parte do mês. É assim que muitas famílias têm passado os últimos anos. Talvez essa precariedade gere algum esquecimento dos motivos que nos trouxeram até aqui.

Foram ausências de políticas e programas públicos focados no envelhecimento e na velhice. Houve negligência quanto ao apoio a pessoas idosas, fossem aquelas que ainda chefiam suas famílias, fossem aquelas que morassem sozinhas.

Faltou um plano habitacional para quem ainda precisa destinar parte da sua renda para o pagamento do aluguel. Não houve a criação de programas que mantivessem pessoas idosas ativas, seja para proporcionar saúde, o aumento das relações sociais com outras pessoas e o aprendizado tão necessário para mantê-las ainda incluídas no mundo físico-digital que vivemos.

A inflação pode ter causado um desânimo em muitas pessoas que querem continuar envelhecendo. Ainda valeria a pena procurar por emprego quando o idadismo ou etarismo, essa discriminação a partir da idade, impede a obtenção de mais uma fonte para a complementação da renda familiar ou pessoal?

Não seria viável reduzir a idade para que alguns serviços pudessem estar já à disposição de quem está prestes a fazer 60 anos? Por que muitas empresas ainda relutam em recrutar pessoas mais velhas? É a vergonha de incluir a diversidade no seu quadro de colaboradores?

Com todas essas dificuldades parece sensata a manutenção ou aumento da intervenção federal, estadual e até municipal na vida de pessoas idosas, já que cresce a urgência em garantir a obtenção de produtos e serviços essenciais. Ainda assim, é preciso reconhecer a origem e os motivos de alguns benefícios que surgirão nos próximos meses. Se a conta recair nas mãos de quem já não tem de onde tirar um real a mais do bolso ou da conta bancária, talvez o auxílio se assemelhe mais a um empréstimo consignado!

E a possibilidade de ter empréstimos bancários devido a essa "boa aprovação" que pessoas idosas têm na praça, pode aumentar as possibilidades de violência doméstica causada por familiares mais jovens, desempregados ou com dívidas.

São milhares de preocupações que envolve a própria pessoa idosa, que também é uma avó e que se compadece do estupro ocorrido com uma mulher gestante, que poderia ser uma de suas netas.

Há também a filha, militante de um partido, e que anda sozinha pelas ruas de uma grande metrópole desse país, ou o bisneto, de pele mais escura, que procura manter-se empregado nos dois "bicos" que exigem uma moto em bom funcionamento e com combustível no tanque.

E, com tudo isso, muitas pessoas sentem que a vida vai perdendo um propósito maior e que direcionava suas atitudes. Não dá para desconsiderar a vontade "injusta e ameaçadora" que muitas idosas e idosos têm de finalizar a sua passagem por este planeta. Sim, falo do adoecimento mental que ganha força com todo o sofrimento sentido na pele, a ponto de deixar mais pesada a cabeça que tenta repousar sobre o travesseiro.

Pessoas idosas preocupadas com a própria saúde ainda relutam, e com razão, de circular demasiadamente em todos os espaços públicos que gostariam. Afinal, ainda estamos em pandemia. Não há tantas mortes físicas, mas ainda há muitas outras formas de adoecimentos e sonhos destroçados! Surge o adoecimento pela falta de mobilidade, o que piora a saúde tanto física quanto mental.

Pode até existir um ou outro grupo de pessoas idosas que ainda conseguem acessar espaços seguros e de risco de contaminação muito baixo. Há outros grupos que voltaram à mesma rotina de exposição ao risco de morte, como sempre houve antes mesmo de a pandemia chegar por aqui.

Pessoas de 60 anos ou mais também estão no grupo que não conseguiu retomar os postos de trabalho que ocupavam antes da pandemia.

A aceleração da informatização de processos e de serviços também complica a vida de quem não nasceu na geração dos notebooks e celulares super potentes. Um simples momento de descontração em frente à TV, para assistir o tradicional jogo de futebol, ficou difícil.

Não dá para ter tantos aparelhos em casa, como também é preciso pagar para ter aquele plano que permite assistir ao jogo do time favorito!

É triste, eu gostaria de estar por dentro de tudo, com a facilidade que eu tinha nos velhos tempos, mas eu não tenho essa facilidade mais. Álvaro Pereira, 87 anos.

Como escrevi, estamos em julho do ano de 2022 e ainda se constatam desrespeitos enormes, como o ocorrido no município de Peabiru, no Paraná, quando duas pessoas, uma jovem e outra adulta, propositadamente, deixaram pessoas idosas na fila sob o sol, aguardando a vez para a obtenção de medicamentos. O mais jovem, ainda estagiário, diz: "Tomando um solzinho, aqui. Deixando os velhos na fila esperando. E é isso".

Para as eleições que estão chegando, pessoas idosas serão alvos de interesse das "milícias digitais" que poderão confundir a interpretação de fatos políticos, econômicos e sociais causados por atitudes não pensadas de muitos candidatos e candidatas.

E ninguém ou nenhuma instituição, até o momento, propôs um plano democrático e gratuito que alcançasse a maior parte das pessoas idosas e as prevenissem desses golpes que poderão implicar em votos injustos para quem não os merecem.

Assim, pessoas idosas, familiares e amigos começam a discutir sobre o futuro do país para os próximos quatro anos e sobre como eliminar essa sensação de sufocamento por tantos problemas que nos afetam diariamente.

Muita gente quer mudanças, e que essas sejam rápidas, drásticas e construtivas para uma que o país volte a crescer e, consequentemente, a envelhecer bem. O desrespeito contra a pessoa idosa é ainda um grande problema que precisa ser resolvido com a ajuda e cooperação de toda a sociedade.