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Grupo afirma poder ajudar homens circuncidados a "restaurar" o pênis

Grupo propõe métodos para "restaurar" pênis, mas médicos não aprovam procedimentos - Orlando/UOL
Grupo propõe métodos para "restaurar" pênis, mas médicos não aprovam procedimentos Imagem: Orlando/UOL

Fábio de Oliveira

Do UOL, em São Paulo

06/03/2013 07h10

O grupo americano "National Organization of Restoring Men" ou NORM, que, traduzido livremente para o português, seria algo como "Organização Nacional de Restauração de Homens", defende o fim da circuncisão. E, mais do que isso, a organização se propõe a ajudar quem passou pelo processo de remoção do prepúcio, pele que recobre a glande do pênis. O procedimento é feito, sobretudo, nos casos de fimose, quando a tal da pele é muito estreita nas extremidades, impedindo a exposição da glande.

Em atividade desde nos anos 1990, os integrantes desse coletivo se valem de métodos, que não são cientificamente comprovados, para tentar reverter a circuncisão. Daí o uso do termo "restauração". 

Agremiações que defendem um propósito semelhante começaram a surgir nos Estados Unidos na década de 1980, mas a NORM hoje é a mais proeminente entre elas, com ramificações em sete países. "Somos uma organização sem fins lucrativos que ajuda homens a lidar com o estrago e o trauma causados pela circuncisão", explica, via e-mail, R. Wayne Griffiths, cofundador e diretor executivo do NORM. 

Em reuniões mensais, os insatisfeitos por terem sido circuncidados ficam a par de métodos para alongar a pele do corpo peniano e, dessa forma, recobrir a glande. "Não há contato físico", afirma Wayne. Eles aprendem a usar dispositivos como pesos ou elásticos que tensionam o tecido para estimular seu crescimento. Bastaria utilizá-los de três a cinco horas durante cinco dias por semana. Wayne diz que sua restauração levou cerca de dois anos.
 
O NORM recebe mais de 20 solicitações de informação por mês e, segundo Wayne, muitos comentários expressam raiva em relação a pais, médicos e instituições hospitalares. Houve até processos judiciais bem-sucedidos contra médicos, ainda de acordo com ele.
 
Em um país em que mais da metade dos recém-nascidos são circuncidados anualmente, mais por razões culturais do que médicas, o NORM e seus membros a consideram uma forma de mutilação não consentida, uma cirurgia cosmética que não teria valor preventivo.

"Estatísticas dos Centros para Controle e Prevenção de Doenças registram que 500 mil homens de 1980 até hoje contraíram o HIV nos Estados Unidos e 99% deles são circuncidados", diz Wayne, que acredita que não há motivo para fazê-la se o corpo for saudável. "A fimose é tratável, basta esticar o prepúcio para ele se retrair. Essa pele geralmente está aderida à glande no nascimento e não se desprende até os 5 anos ou pode permanecer assim até a adolescência", afirma.
 
  • Divulgação

    R. Wayne Griffiths, cofundador e diretor executivo do grupo norte-americano NORM


Academia Americana de Pediatria tem outro ponto de vista

 
A afirmação de Wayne Griffiths vai contra a recomendação recente da Academia Americana de Pediatria, que indica a operação para todos os meninos, com os riscos inerentes a qualquer cirurgia, justamente por estudos terem demonstrado que é uma forma de reduzir o contágio de doenças sexualmente transmissíveis, a ocorrência de infecção urinária, além de facilitar a higiene.
 
No Brasil, os médicos só optam por ela em situações específicas e sempre com a concordância dos pais. "Além da fimose, a circuncisão é realizada, por exemplo, quando há parafimose, ou seja, o prepúcio até desce, mas forma uma espécie de anel que estrangula o pênis", explica o urologista Antonio Macedo Júnior, chefe do setor de Urologia Pediátrica da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo).

Bebês do sexo masculino que nascem com problemas congênitos em alguns dos órgãos do trato urinário, como bexiga e rins, também são operados. "Bactérias que ficam no prepúcio podem migrar para a área e provocar infecções", diz Macedo, que também é chefe do Departamento de Urologia Pediátrica da Sociedade Brasileira de Urologia. Além das razões médicas, existem as religiosas –vide judeus e muçulmanos. 
 
Miguel Srougi, professor titular de urologia da Faculdade de Medicina da USP, diz que 80% dos casos de fimose melhoram naturalmente. "A maioria dos meninos nasce com o que se chama de prepúcio exuberante. Com o crescimento e as ereções noturnas aos 2, 3 anos de idade, a pele se solta sozinha”, explica.

E há alternativas ao procedimento cirúrgico, como cremes com cortisona. Informação sobre higiene adequada e estilo de vida sexual sadio contrabalancearia as vantagens apresentadas pelos defensores da circuncisão, acredita o especialista. E os prós levantados pela Academia Americana de Pediatria seriam válidos em regiões específicas, como alguns países da África, onde é alta incidência de transmissão do HIV.
 

Médico diz que "restauração" é charlatanismo

 
 Diferentemente do que prega o NORM, os especialistas brasileiros afirmam que não há meio de reverter o processo de circuncisão. "É coisa de charlatão", diz o professor da USP  Miguel Srougi. Antonio Macedo Júnior completa: "Esses métodos carecem de comprovação científica e podem gerar complicações. A cirurgia remove tecido e não há implante".

Os membros da NORM também argumentam que junto com a retirada do prepúcio vão-se embora terminações nervosas envolvidas no prazer sexual masculino. "A circuncisão diminui a sensibilidade, mas não atrapalha o desempenho”, contrapõe o professor Srougi. Trata-se, enfim, de um tema polêmico, que ainda vai render muita discussão.