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Nina Lemos

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Arthur do Val renunciou, mas não por vergonha ou respeito às mulheres

Após aprovação de parecer que pede cassação, Arthur do Val renuncia ao cargo na Alesp - Reprodução/Facebook Arthur do Val
Após aprovação de parecer que pede cassação, Arthur do Val renuncia ao cargo na Alesp Imagem: Reprodução/Facebook Arthur do Val

Colunista do UOL

21/04/2022 10h53

"As mulheres aqui são fáceis. São fáceis porque são pobres". A frase foi dita pelo agora ex-deputado estadual por São Paulo Arthur do Val, o Mamãe Falei, em março, e causou um merecido escândalo. Do Val falava das refugiadas ucranianas. Sim, ele foi fazer sabe-se lá o quê na Ucrânia e confundiu zona de guerra (onde mulheres sofrem enormes violências) com zona de turismo sexual.

No áudio que mandou para um amigo, ele dizia, inclusive, que pensava em voltar para a Ucrânia depois da guerra por causa das mulheres.

Na época em que isso aconteceu, muitos pensaram (essa colunista inclusive) que Arthur deveria renunciar. Seria um ato nobre demonstrar arrependimento, pedir perdão e entender que o que fez foi, de fato, grave. E que deputados, que são pagos com o dinheiro do povo, não podem sair por aí falando absurdos sobre mulheres. E muito menos sobre refugiadas que lutam por suas vidas.

Na quarta-feira (20), tivemos a notícia de que Arthur, de fato, renunciou. Mas não foi um ato de tentar agir com certa dignidade, respeito ao cargo ou às mulheres.

Arthur renunciou após o Conselho de Ética da Assembleia Legislativa de São Paulo aprovar por unanimidade um processo que poderia levar à sua cassação e à perda de seus direitos políticos por oito anos.

Após a sua renúncia, a Alesp pode continuar com o processo para cassar seus direitos políticos. O que ficou claro, e o ex-deputado não escondeu: Arthur não renunciou como um pedido de desculpas ou porque isso é o mínimo que aconteceria em um país minimamente sério. Ele renunciou para escapar do processo e tentar salvar sua carreira política.

Ou seja, ele não acha que o que fez foi grave e escandaloso. Ao contrário, após renunciar, ele disse ser vítima de um complô. Vale lembrar que outro político envolvido em denúncias, o vereador carioca Gabriel Monteiro (PL), acusado de abuso de menores, também se diz perseguido por "inimigos políticos". Essa é a desculpa da vez.

"Estou sendo vítima de um processo injusto e arbitrário dentro da Alesp. Vou renunciar em respeito aos 500 mil paulistas que votaram em mim, para que não vejam seus votos sendo subjugados pela assembleia. Mas não pensem que desisti. Continuarei lutando pelos meus direitos."

Ou seja, ele se acha perseguido, vítima de "cancelamento", e, como a turma dele costuma dizer, se "vitimiza". Arthur do Val é incapaz de assumir seu erro e renunciar por dignidade.

Não podemos nem duvidar que, se ele der um jeito de se candidatar (a frase "não pensem que desisti" soa como uma ameaça), pode até ser que ele seja eleito. Definitivamente, estamos muito longe de ser um país sério.