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Mariana Kotscho

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Brigas no WhatsApp mostram que falta educação política para pais e mães

Denis_Vermenko/Getty Images/iStockphoto
Imagem: Denis_Vermenko/Getty Images/iStockphoto

Colunista de Universa

30/10/2022 04h00

Sim, aconteceu comigo. Embora tivesse me feito a promessa de que não iria entrar em bate-boca político em grupo de pais e mães no WhatsApp, não consegui cumprir. Quem acredita em horóscopo vai dizer que meu lado ariano falou mais forte, mas a verdade é que chega um momento em que você não pode permitir que discursos contra a democracia e a verdade ocupem todos os espaços. É preciso sim se posicionar, rebater e colocar limites de civilidade.

Às vésperas do dia de votação de uma das eleições mais polarizadas que já vivemos, seria impossível o tema não estar nas praças, nas escolas, nas redes sociais e nos grupos de WhatsApp, ambientes que se tornaram, inclusive, uma espécie de praça virtual. O problema é que entre o debate respeitoso e a baixaria é uma questão de segundos.

Sempre têm aqueles do "deixa disso", "não vamos falar de política neste grupo", e o pessoal que começa a postar promoções de brigadeiros e esfihas para desviar o foco do tema. Acho as tentativas válidas. Mas também acho que algumas coisas graves que são ditas, camufladas de liberdade de expressão, não podem ficar sem respostas. E, claro, aqueles que não têm argumentos partem para a agressão.

Outro comportamento curioso de um dos grupos que participo é que até pouco tempo atrás só tinham basicamente mães lá. Mães que cuidam, que participam da vida de seus filhos e filhas. Mas na última semana apareceu uma enxurrada de pais (homens) prontos a atacar as mães que ali tinham um pensamento diferente do deles.

Tudo começou quando um determinado grupo de adultos ligados à escola (pais, mães e ex-alunos) decidiu participar do movimento nacional Frente Ampla pela Democracia. Vestidos de branco, montaram uma mesinha na praça pública em frente à escola e recebiam, com bolos e café, pessoas dispostas a conversar sobre política, adultos e adolescentes e, por que não, crianças curiosas também. Uma ação que é permitida pela constituição.

Em se tratando de democracia, o grupo entende que nesta eleição o correto é apoiar as candidaturas de Lula e de Haddad em São Paulo, já que o outro candidato tantas vezes ameaçou diretamente nossa jovem e sofrida democracia.

Incomodados, pais que apoiam os outros candidatos que ameaçam a democracia, chegaram ameaçar chamar a polícia para retirar o grupo da rua. O circo estava armado e a confusão da pracinha real foi parar na pracinha virtual, quando tive que descumprir a promessa que citei no começo deste texto.

Entre mensagens sobre provas, atividades da escola e comentários sobre apoiar ou não a Frente Ampla, um cidadão, que pedia para não falar de política do grupo, colocou o seguinte recado: "Compartilhar que ideias? Apoiar um ladrão? Condenado? Presidiário (sic)? Isso não tem como compartilhar. Isso é ter ou não ter berço, ter princípios e ser honesto com as crianças. Vamos parar de hipocrisia. Essa escola é cristã católica (sic). A esquerda brasileira é contra tudo aquilo que se defende".

Eu respondi, porque não tenho sangue de barata: "A pessoa também pode apoiar um torturador, racista, homofóbico, machista, líder de rachadinha, negacionista, que flerta com o nazismo, armamentista, etc. Afinal, somos livres. É isso aí, cada um com seus valores". E sugeri que ouvisse o podcast que conta a história da escola que é católica pluralista.

Quando uma mulher rebate um machista de plantão, ele não se aguenta: "Assistindo Globo lixo? Tenha postura ou inteligência mínima para avaliar as coisas". O machista também costuma procurar palavras bonitas para chamar uma mulher de burra, quando lhe faltam argumentos melhores.

Da minha parte, lamentei a baixaria e deixei ele continuar falando sozinho porque eu tinha mais o que fazer. Mas ele continuou lá esbravejando dizendo que eu que era baixa e que não era para falar de política no grupo. Ou seja, era só para ele falar de política no grupo.

Mas não foi só comigo não. Uma mãe que postou um vídeo lindo da querida Eliane Brum comentando a destruição da Amazônia e dos povos indígenas foi massacrada pela turma que se diz "a favor do Brasil" (que Brasil?) e continua votando em quem provoca desmatamento e eliminação de aldeias. Pelos menos eles realmente deixam bem claros seus valores.

Só lamento muitos pelos nossos filhos e filhas que tudo isso esteja acontecendo e torço todos os dias para que sejam adultos melhores do que nós e para que o Brasil possa finalmente respirar aliviado, bem longe do clima de ódio instalado pelo atual governo.

No dia seguinte ao bate boca, o homem de berço se retirou do grupo pedindo desculpas às pessoas "que se sentiram ofendidas", porque dizer que pedia desculpas "às pessoas que ofendi" já seria demais. Daí voltamos à programação normal com anúncios de brigadeiros e esfihas. No fundo, ele me fez um grande favor: me deu o tema que precisava para a coluna da semana. Boa eleição a todos.