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Mariana Kotscho

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Ideia de 'escola sem partido' é alienadora e manipuladora

skynesher/Getty Images
Imagem: skynesher/Getty Images

Colunista de Universa

02/10/2022 04h00

Me incomoda demais ouvir de alguns pais em grupos por aí que são da "escola sem partido". O que afinal isso quer dizer? Pelo que já entendi, quer dizer que são contra aulas de história, de interpretação de texto, de atualidades, de política.

Mas afinal, qual é o maior papel da escola? O educador Rubem Alves (1933 - 2014), que tanta falta nos faz, costumava dizer que "o objetivo da educação é criar a alegria de pensar". Em outras palavras, só assim teremos uma sociedade crítica e consciente.

Com o argumento de que existem escolas "doutrinadoras", muitos pais e mães revelam, na verdade, o medo de não conseguir manipular os próprios filhos. Nunca me esqueço de um caso de um pai que foi reclamar numa escola de elite de São Paulo que eles não deveriam das aulas criticando a escravidão porque isso estava fazendo com que a filha dele se sentisse mal por ter uma babá e duas empregadas domésticas na casa.

A escola não precisa ser partidária, mas não pode ser alienada nem alienadora, manipulada nem manipuladora. Entendo sim a ideia de "escola sem partido" como alienadora e manipuladora.

Na aula de história do Brasil, golpe de 64 tem que ser chamado de golpe e não de revolução. Escravidão tem que ser criticada. E a ciência deve ser defendida - apenas para citar alguns exemplos.

Assim como a educação sexual é necessária para informar e promover a prevenção de abusos, de gravidez na adolescência e de doenças sexualmente transmissíveis, a educação política se faz necessária, inclusive, para evitar que no futuro se repita uma palhaçada como foi o último debate presidencial.

Como é possível nossa jovem democracia ter como candidatos e candidatas gente do mais baixo nível e preparo? Onde ficaram as propostas? Se perderam em meio a baixarias e lacração. De "brinde", ainda surgiu um padre que não é padre para tumultuar ainda mais o coreto.

Prevenção é sempre a melhor solução. A gente vacina para prevenir doenças, a gente supervisiona as crianças pequenas para prevenir acidentes e a gente defende uma educação de qualidade para prevenir que o país seja comandado por gente despreparada. Assim podemos preparar tanto futuros eleitores conscientes quanto futuros políticos de qualidade. Utopia? Talvez. Mas nunca custa sonhar e ter esperança.

Pergunte para as crianças e adolescentes ao seu redor: o que é democracia? Sim, eles precisam saber a resposta. Acho muito triste ouvir de um adulto coisas como "não gosto de política", "não me interesso por este tema". Tudo na vida é política e envolve nosso futuro.

Viver é um ato político e, se não nos interessamos por isso, deixamos decisões importantes nas mãos de outras pessoas que são, muitas vezes, absolutamente irresponsáveis.

Por isso, tão importante quanto, neste domingo, votarmos com consciência para presidente e governador, é sabermos escolher com critério nossos candidatos que vão compor o congresso nacional e as assembleias legislativas.

Nós é que vamos definir o perfil que terão essas casas pelos próximos anos. O que queremos? Pessoas que pensem no coletivo, que lutam pelas minorias (que juntas são maioria), que foquem na saúde, na educação, na segurança? Ou os mesmos de sempre, que estão preocupados com o próprio umbigo, com suas próprias verbas, com seu próprio esquema?

E nós, como pais e mães, o que estamos ensinando para nossos filhos e filhas? Um cidadão consciente começa a ser formado dentro de casa, observando e ouvindo os adultos. Então, tenhamos cuidado com nossas atitudes. Muitos adultos precisam se reeducar para não deixar que as crianças reproduzam, por exemplo, o racismo, a homofobia, a aporofobia e outros crimes por aí.

A gente escuta coisas que dão até vergonha de reproduzir. Uma vez ouvi de uma mulher que ela estava ensinando os filhos a separarem roupas velhas para dar "pros pobrinhos", que o importante de ter pobres no país é que assim ela ensinava os filhos a doarem as roupas velhas para poderem compras roupas novas. Para resumir meu sentimento, vou usar uma frase muito repetida no meu grupo de WhatsApp da família: "tá tudo errado".

Só com informação de qualidade e consciência é que alguém se dá conta dos seus deveres e direitos, para lutar por eles. Não vamos deixar que nossas crianças cresçam para ser massa de manobras, mas para que sejam realmente agentes transformadores.

Que os políticos eleitos a partir de agora passem também a priorizar mais a infância em seus planos de governo e nas políticas públicas. Isso é a base para uma democracia sólida, que nunca mais deveria ser ameaçada por uns e outros.