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Fabi Gomes

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Minha comorbidade é gostar de homem: tem vacina para a heterossexualidade?

"Ainda me vejo em busca dos ideais masculinos, mesmo sabendo que não será realizado" - Getty Images
'Ainda me vejo em busca dos ideais masculinos, mesmo sabendo que não será realizado' Imagem: Getty Images

Colunista de Universa

31/05/2021 04h00

Para começar, tem um lance que queria falar. Em uma outra coluna aqui em Universa, me intitulei heterossexual (eu sei, cafona) e tive que prestar esclarecimentos. Como já me aventurei com as minas - claro que sim, tive vontade e fui, precisei responder a um questionamento: "por que você não colocou bissexual?". Pois bem, vamos colocar assim: eu me considero "sexual" e talvez isso defina de modo mais apropriado. Até porque sexualidade não é questão de escolha consciente.

Como a gente busca se circunscrever e circunscrever o outro, né não? Mais uma vez, o lance da prateleira, da etiqueta. Pera aí, preciso te classificar: que apito você toca? Excluindo-se o contexto político atual no Brasil, que não permite neutralidade, não sou eu quem vou pedir satisfações às pessoas sobre seus apitos. E também não quero que enfiem apitos na minha boca.

Agora, voltemos ao nosso tema: gostar de homens. Pois é, caso se tratasse de uma questão de escolha, eu não seria acometida por tal comorbidade. Em situações de encontros sociais (quando isso ainda era possível), sempre tentei me deixar solta, mantendo as portas da percepção, emoções e arrepios bem abertas. E qual a categoria me causa interesse? Sim, a dos boys.

Falando da parte boa, do que gosto: curto a voz, o cheiro, o conforto que o corpo proporciona, adoro quadril de boy. Ah, claro, e tem o pinto (ainda se fala pinto?). Um pinto vivo é algo muito legal. É muito divertido encontrar ele dormindo e ter o "poder" de acordá-lo (bem, nem sempre isso acontece, e tá tudo bem, só não dá pra lidar com um pinto Soneca full time). Uma alegria semelhante a plantar uma sementinha e vê-la crescer linda e vigorosa, com o diferencial de que você pode brincar muito e se divertir a valer com essa outra "plantinha". Pensando aqui, tudo dessa breve lista de prós está ligado às características físicas... Significa?

Mas aí também tem essa socialização da suposta proteção que um homem pode oferecer. Desafortunadamente, em incontáveis vezes o que eles oferecem é exatamente o contrário. Para além da omissão, muitas mulheres são vítimas de violência por parte dos homens. Violência de todo tipo: física, emocional... Mas esse não é nosso recorte hoje.

Apesar da mulher emancipada, cheia de opinião, com leituras, opiniões e modos feministas, muitas vezes ainda me vejo em busca dos ideais masculinos, mesmo sabendo que o ideal é apenas um ideal e não será realizado.

Bem difícil assumir isso publicamente, difícil e complicado. E quem avisa para os sentimentos e para os padrões repetitivos que é cilada? Quantos anos de análise são necessários, mesmo sem a garantia de que, havendo a tal elaboração, o sintoma vai desaparecer?

Ao longo dos anos, trabalhei bastante esse tema dentro de mim e, aparentemente, é impossível entender todos caminhos que nos levam a gostar disso ou daquilo, ainda que se construa uma lista de razões favoráveis e desfavoráveis. Por ora, a conclusão é: eu gosto mesmo de homem e tenho que lidar com isso.

E existe vacina para heterossexualidade? Pois é, não tem.

E como não tem, vou precisar conviver com ela, utilizando os melhores artifícios que eu tiver para eliminar sintomas incômodos da relação com os exemplares masculinos

Quem sabe uma hora encontro uma cepa que vai fortalecer meu sistema ao invés de acabar com ele? Alguém aí teria uma luz?

Seria preciso muito mais de um texto para tratar (tratar em sentido amplo) do tema. Quem quiser trocar ideia sobre isso, cola no Instagram. Por razões óbvias, não leio comentários aqui (beijos, haters).