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ANÁLISE

Quanto custa em reais uma reunião online que poderia ser um email?

Getty Images/iStockphoto
Imagem: Getty Images/iStockphoto

Matheus Pichonelli

Colaboração para Tilt

16/04/2021 04h00

Uma amiga, que hoje é chefe de uma consultoria, pegava a estrada uma vez por semana para reuniões de uma hora com clientes em outra cidade. Levava uma hora para ir e outra para voltar. Trabalhando de casa, hoje passa um quarto do tempo de trabalho em videoconferências. Ela é a prova viva de que a pandemia ampliou o conceito de reunião e que já não é tão simples calcular o impacto de encontros do tipo no bolso das empresas.

Em tempos pré-pandêmicos, essa conta poderia ser feita por ferramentas online, como a Meeting Ticker, projeto da plataforma de desenvolvedores GitHub, ou com uma calculadora da revista "Harvard Business Review", recentemente analisadas por Omar L. Gallaga, setorista de tecnologia, no site Debugger.

A primeira ferramenta é o melhor argumento para os gestores serem claros e objetivos no encontro. Lá, é possível informar o número de participantes, a média salarial (em dólares, euros, libras, yuans e coroas suecas) e o horário de início da reunião. Com um clique, é possível ver uma roleta de dinheiro rodando, como se estivesse sendo queimado e jogado pelos ares. Na segunda ferramenta, que pode ser baixada no celular, o cálculo é imediato.

No primeiro site estimamos com dez pessoas que ganhem cerca de US$ 6,9 por hora no salário, o que é equivalente a US$ 20 mil por ano (R$ 112 mil anuais, ou R$ 9.300 mensais). Em 60 minutos de reunião elas teriam gastado US$ 69 (R$ 387, na conversão direta). Já na segunda página, o mesmo cálculo dá US$ 140 (R$ 786). A diferença está no fato de que a calculadora da "Harvard Business Review" multiplica o valor dos salários por 1,4 para levar em conta eventuais benefícios de contrato.

Agora imagine uma média de uma reunião por semana e você teria, em um ano (52 semanas), gastado com reuniões de US$ 3.590 a US$ 7.280 (R$ 20,1 mil a R$ 40,8 mil), de acordo com os valores acima.

No "novo normal", os impactos e os custos envolvidos nas reuniões online são uma pergunta em aberto, sendo mais difícil dimensionar quando são úteis ou não. Se antes o compromisso girava em torno de decisões, metas e feedbacks, agora servem para aproximar e motivar funcionários, reforçar a ideia de equipe e diminuir a sensação de que eles estão trabalhando sozinhos.

"Antes a gente conversava diretamente. E, como demandava um tempo de preparo e deslocamento antes e depois, se pensava muito mais antes de marcar uma reunião formal. Agora não", diz a minha amiga, que aqui não será identificada. Para ela, o salto para os encontros virtuais é quase sempre positivo.

Tão perto, tão longe

Christian Barbosa, cientista da computação e especialista em produtividade e gestão do tempo em livros como "A Tríade do tempo", conta que acompanhar grandes empresas permitiu a ele perceber uma diminuição no volume de reuniões no começo da pandemia, quando tudo, até as ferramentas online, era novidade. Depois o ritmo de encontros online começou a crescer e desde então vem se mantendo.

"Os gestores querem ficar mais próximos de pessoas ou gerenciar o trabalho de forma mais presente. Eles usam instrumentos de reunião virtual para tentar fazer essa gestão. Mas muitas vezes é um tiro no pé", diz o escritor. Para ele, certas reuniões de trabalho não são bem reuniões, com pessoas conectadas por horas só falando, ouvindo e interagindo.

Não é porque a reunião é online que ela é mais eficiente. Segundo Barbosa, muitos gestores ainda fazem reuniões demais e não deixam as pessoas trabalharem.

O home office já tem muita dispersão. Muitos funcionários precisam compensar trabalhando à noite. Vemos também um aumento grande de trabalho nos finais de semana por conta da pandemia. Perde-se qualidade de vida em função disso
Christian Barbosa, empresário e escritor

Essa fronteira borrada entre trabalho, descanso e lazer foi tema, também na Debugger, de um artigo assinado por Angela Lashbrook, para quem a facilidade com que o trabalho se infiltra em todos os aspectos de nossas vidas, em particular para "trabalhadores do conhecimento" em home office, nos aprisionou ao conceito de "conectividade constante".

Daí a importância, segundo a autora, de padronizar mensagens automáticas nas configurações de -mail que expliquem aos interlocutores quais são seus horários disponíveis para assuntos profissionais —o mesmo vale quando precisar acionar alguém fora do horário comercial. Isso, escreveu ela, ajuda a criar uma cultura de respeito pelo tempo das outras pessoas. "É reconfortante saber que alguém que me envia um email respeita meus próprios limites".

Tempo é dinheiro

Há alguns anos, a consultoria Triad, de Christian Barbosa, realizou, em parceria com uma revista especializada, um levantamento com funcionários de grandes empresas e clientes para medir o custo de reuniões improdutivas. Foi perguntado o volume de reuniões que eles tinham, o que era produtivo e o que era improdutivo e gerava desperdício. A partir dai, chegou-se a um cálculo médio do valor-hora desses profissionais.

A conclusão foi que a cada 100 profissionais que realizavam, em média, cinco horas de reuniões semanais, o prejuízo médio para as empresas chegava a R$ 600 mil (em valores atualizados). Então, se a empresa tinha 200 funcionários, era R$ 1,2 milhão jogado no lixo.

No ambiente virtual, esse custo certamente é reduzido. No presencial, é preciso levar em conta o espaço físico, o consumo de energia e o ambiente do escritório. Já o online depende de como a empresa viabiliza o home office, o preço da internet em casa e a qualidade dos computadores.

"Não vi ainda nenhuma análise de custo em cima disso. Pesquisas americanas apontam essa redução, mas o percentual e a eficiência das mudanças não são muito precisos. Essa é uma conta que as empresas vão ter que fazer", acredita.

Outro impacto na dinâmica das reuniões pós-pandemia é a mudança de residência de muitos profissionais com cargos gerenciais para cidades do interior, em busca de qualidade de vida e redução de gastos. Para eles, os cálculos dos custos das reuniões presenciais, ao fim da pandemia, também serão alterados.

De acordo com Barbosa, o mercado americano tem chegado à conclusão de que os funcionários vão voltar para o escritório quando a pandemia acabar, porque trabalhar em empresa significar trabalhar em grupo, "como um time de futebol".

Além disso, as grandes empresas sabem que esse movimento de funcionários em direção ao interior aconteceu, mas não sabem como isso vai funcionar lá na frente. Alguns precisarão estar presentes uma vez por semana ou a cada 15 dias, por exemplo. "Acredito que [as empresas] vão entender que vai ser ok, nesses dias, dirigir uma ou duas horas até o trabalho", diz Barbosa.

Enquanto as coisas não voltam ao normal, o jornalista Gumae Carvalho, que por duas décadas dirigiu uma revista especializada em recursos humanos, aposta que as reuniões online seguirão com a vantagem de começar no horário e ter um tempo mais controlado em função de cada plataforma. Não deixa de ser um avanço.

Sobre o pós-pandemia, sua previsão é quase um pensamento desejoso: "quero crer que além de repensar o custo com viagens e reuniões presenciais, as empresas repensem as próprias reuniões".