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Ricardo Cavallini

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Opinião: Após ser comprado por Musk, Twitter merece perder anunciantes

Foto do empresário Elon Musk com o logotipo do Twitter em segundo plano - Dado Ruvic/Reuters
Foto do empresário Elon Musk com o logotipo do Twitter em segundo plano Imagem: Dado Ruvic/Reuters

07/11/2022 09h32

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Podemos atribuir muitos adjetivos a Elon Musk. Negativos ou positivos, entre haters e lovers, acredito que todos podemos concordar que "moderado" não seria um deles.

Então nenhuma surpresa que, após a aquisição do Twitter ser confirmada, a empresa passaria por um período conturbado. A situação se torna ainda mais complicada pelo fato do mercado entender que não apenas ele pagou mais do que deveria, mas pela empresa estar em uma situação financeira delicada. O fluxo de caixa caiu e os últimos 10 anos não foram nada animadores.

Entre as demissões em massa, várias outras ideias de novas fontes de receita estão alimentando a discussão na rede. E isso é uma das características de Musk. Ele gosta de jogar para o circo suas ideias de forma incompleta e pouco estruturada, muitas vezes sem deixar claro se esta falando sério ou não.

Mas o mundo corporativo não tem o mesmo senso de humor de Musk e o efeito foi o oposto do que o bilionário gostaria. A receita de propaganda teve uma queda drástica, colocando a empresa em risco. Propaganda representa 90% da receita na plataforma.

Ao se auto descrever como um "Absolutista da Liberdade de Expressão", Musk nunca deixou claro o que isso significa. Em uma mensagem ele diz que finalmente a plataforma será livre, em outra diz que não restabelecerá nenhuma conta que foi deletada. Uma hora leva a entender que o Twitter não teria filtro nenhum e outra diz que as mensagens de ódio não seriam toleradas.

Em uma mensagem diz que as regras não mudaram, em outra compartilha uma teoria da conspiração de um site bem conhecido por suas fake news. O mesmo que em 2016 afirmou que Hillary Clinton estava morta e que uma sósia havia participado do debate com Donald Trump. Não contente ainda adicionou a frase "Há uma pequena possibilidade de haver mais nessa história do que aparenta".

Suas mensagens — e sua posição — são sempre ambíguas e parecem mudar ao sabor do vento.

A falta de clareza acendeu o alerta vermelho na cabeça dos grandes anunciantes, principalmente a dúvida sobre como ficaria a moderação de conteúdo na nova gestão. Gigantes como GM, General Mills e Audi anunciaram a pausa de seus anúncios para, segundo eles, entender melhor qual seria o direcionamento da plataforma sob nova direção.

Os primeiros sinais não foram nada bons, a falta de clareza deu sinal verde para o ódio bombar. Segundo pesquisadores da Universidade Estadual MontClair, a rede que já era conhecida por ser um dos ambientes mais tóxicos da internet, teve picos em mensagens de ódio direcionado a raças, religiões, orientação sexual e etnias.

Mais recentemente, Musk informou estar criando um "conselho de moderação de conteúdo". Alguns anunciantes devem optar por esperar isso acontecer para reavaliar sua posição.

Outra das ideias abertas para discussão foi abrir o serviço de verificação e cobrar por isso. Há um ano nesta coluna, afirmei que verificados, por sua exclusividade, viraram símbolos de glamour. Uma forma ordinária de incentivar o uso massivo das redes. Defendi também que deveriam ser liberados para qualquer pessoa e qualquer empresa. Seria uma forma de evitar golpes e aumentar a segurança de usuários e empresas nas redes.

Segundo um vazamento de informações obtido pelo The New York Times, os assinantes não precisariam de suas identidades autenticadas para obter a marca de verificado. Isso mesmo que você leu, não precisa ser verificado para ser verificado ¯\_(?)_/¯

Em outras palavras, até o serviço ser efetivamente implementado (se for mesmo), não saberemos se ele vai aumentar a segurança ou fomentar o caos.

Ao reclamar da queda de faturamento, Musk atribuiu a culpa aos ativistas de plantão, que estariam pressionando os anunciantes. Afirmou que esses grupos estão tentando destruir a liberdade de expressão na América.

Tentando ignorar esse perfil de pessoa cuja culpa nunca é dela, acho que vale a pena discutir aqui a tal liberdade de expressão, pois esta discussão já apareceu inúmeras vezes no Brasil. Citando alguns exemplos, quando a conta brasileira do Sleeping Giants ganhou notoriedade e em todas as situações que as afirmações tresloucadas (para dizer o mínimo) do sócio do Flow fez sua empresa perder anunciantes.

O absurdo da acusação está justamente em argumentar que a liberdade de expressão está em risco quando esses grupos estão fazendo justamente isso, exercendo sua liberdade de expressão.

O que Musk e os outros fingem não entender é que não existe nada que os proíba de falar besteira no Twitter. Agora, acreditar que os anunciantes deveriam continuar bancando esse devaneio, é ridículo.

Marcas não gostam de surpresas ou insegurança, e muitas já entenderam que não há mais espaço no mundo para esse lixo. Para o ódio, para o preconceito, para fomentar a violência.

E este é apenas o primeiro problema enfrentado por Musk. Por ser uma figura pública com outros interesses, em breve teremos essa discussão sendo elevada para outros patamares.

Faz sentido para as montadoras de automóvel, concorrentes diretas da Tesla, bancarem seu novo brinquedo?

E com seus interesses comerciais em países como Arábia Saudita, China e Emirados Árabes, a discussão pode ficar ainda mais séria.

É esperar para ver. A única certeza é que de tédio a gente não morre