Topo

Ex-Cruzeiro, Ruy Cabeção faz curso de direito e virou craque do Cabeções FC

Reprodução/UOL Esporte
Imagem: Reprodução/UOL Esporte

Adriano Wilkson

Do UOL, em São Paulo

31/07/2017 04h00

Mais difícil do que bater pênalti em final. Foi assim que o ex-lateral Ruy Cabeção descreveu seu primeiro dia de aula na faculdade de direito. Ele voltou a estudar depois de uma carreira durante a qual defendeu 16 clubes diferentes. Foram ao todo 22 anos longe das salas de aula. A maioria de seus colegas de classe tinha menos idade que isso. Ele não sabia como seria recebido.

Em uma tentativa de passar incógnito, ele apareceu na faculdade escondendo a parte do corpo pela qual se tornou conhecido no mundo do futebol e além dele. “Fui de boné”, disse em uma entrevista por telefone de Belo Horizonte, sua cidade natal. “Sentei no último lugar da sala, perto da porta, achei que tivesse escondido. Mesmo assim os caras me reconheceram, mas ficaram em dúvida.”

Mas quando chegou a hora da chamada, todo mundo teve certeza. Não é todo dia que você descobre que um ex-jogador de futebol será seu colega de classe pelos cinco anos da faculdade. “Eles não acreditaram de forma alguma, tiraram fotos, aquela coisa toda.”

Ruy Cabeção, hoje com 39 anos, foi campeão mineiro (América e Cruzeiro) e carioca (Botafogo), mas longe desses estados talvez tenha ficado mais conhecido pela grande circunferência de sua cabeça, o que tem sido sua marca registrada há décadas.

Cabeções - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Escudo do Cabeções Futebol e Cerveja
Imagem: Arquivo pessoal

Ele diz que nunca se incomodou com o apelido e, ao contrário, o usou como uma espécie de marketing pessoal. Quando entrou na faculdade, seus novos colegas de turma resolveram fundar um time para disputar um torneio interclasses. O nome da equipe: Cabeções FC (Futebol e Cerveja). 

Ruy foi chamado para ser o camisa 10. “Os meninos são apaixonados por futebol”, contou ele depois de algumas risadas. “Os veteranos queriam que eu jogasse pra eles de qualquer jeito, mas como eu sempre fui muito fiel com todos os clubes que representei, não podia deixar os meninos na mão.”

Infelizmente para os calouros, os Cabeções não foram muito longe e conseguiram a proeza de perder todos os seus jogos. “O nível dos meus companheiros não era muito bom”, comenta o antigo lateral, para logo em seguida apontar um aprendizado diferente que o ensino superior lhe trouxe: “Aprendi que o futebol universitário é muito mais violento do que o profissional.”

Ano que vem começa a busca por estágio

Não são muitos os jogadores de futebol que resolvem estudar depois de se aposentar. Ruy Cabeção já tinha começado algumas faculdades, mas a rotina de jogador profissional nunca havia lhe permitido seguir os estudos. Com negócios no setor imobiliário, ele resolveu se formar em direito até para proteger seu patrimônio e, quem sabe um dia, se envolver profissionalmente no futebol, agenciando a carreira de jovens atletas.

Ainda no quarto período da faculdade, ele diz ainda não ter decidido em que área do direito pretende se especializar. A maturidade o previne de sentir a ansiedade que seus colegas vivem diante da escolha.

Ruy - Reprodução - Reprodução
Imagem: Reprodução

“Ainda estou em processo de conhecimento”, afirma ele. “Entrei com vontade de seguir tributário ou empresarial, mas gosto muito de direito constitucional e civil. Em 2018 vou começar o estágio, quero ver se o curso me dá aquele start.”

Filosofia foi um terror no começo do curso. “Direito não é fácil, ainda mais depois de 20 anos sem estudar. Lembro de uma aula de filosofia, Aristóteles, Kant, essas coisas. Durante a aula todo mundo perguntando e eu sem entender nada, cheio de vergonha. Cheguei em casa e me senti muito burro.”

Ele diz que nunca bombou em nenhuma disciplina, embora já tenha ficado em uma espécie de recuperação.

Após as aulas, também costuma levar uma vida de universitário, saindo a festas e aniversários dos colegas mais novos. Prefere, porém, fazer churrasco em casa e convidar o pessoal para cantar pagode.

Diz ser ainda reconhecido na rua, principalmente pelos torcedores do Cruzeiro, que o agradecem por um passe que deu a Sorín, após driblar um adversário na linha de fundo e deixar o argentino na cara do gol. O lance rendeu ao clube o título do torneio Copa Sul-Minas de 2002.

Ele acredita que uma combinação entre o bom futebol e o respeito que sempre mostrou aos clubes que defendeu, aliada à marca deixada no imaginário popular sobre sua grande cabeça, contribui para ele permanecer na memória de muita gente.

“Esse apelido carinhoso acabou sendo meu marketing natural. Já tem dois anos e meio que aposentei, mas o torcedor ainda lembra, sempre de uma forma carinhosa. Tudo é um conjunto. Não adianta eu ter o apelido de Ruy Cabeção se eu não demonstrasse futebol pra ser respeitado. Foram mais de dez títulos! Não adianta ter esse marketing natural se não for um bom jogador.”