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Marcelo Oliveira é unanimidade em Minas Gerais

No comando no Cruzeiro, o técnico Marcelo Oliveira conquistou 78,95% de aproveitamento - Washington Alves/Vipcomm
No comando no Cruzeiro, o técnico Marcelo Oliveira conquistou 78,95% de aproveitamento Imagem: Washington Alves/Vipcomm

Luiz Augusto Simon

Do UOL, em São Paulo

14/11/2013 06h10

Analistas políticos dizem que, se quiser ganhar a eleição presidencial do ano que vem, o ex-governador Aécio Neves precisa ter uma votação espetacular em Minas Gerais, seu estado. Poderia buscar a receita com Marcelo Oliveira, técnico do Cruzeiro, e que também é adorado por torcedores do Galo. Uma unanimidade que, se não existe, é muito mais por conta dos americanos do que de torcedores dos grandes rivais.

As estatísticas no Cruzeiro impressionam. O clube, que ganha novamente um título brasileiro após dez anos, tem com seu time sob o comando de Marcelo Oliveira 43 vitórias em 57 jogos, além de seis empates e oito derrotas. É um aproveitamento de 78,95%.

Os números de Oliveira no Atlético explicam por que ele é respeitado pelos dois lados. Ainda como jogador do Galo, fez 104 gols em 285 partidas, vencendo 173 delas. Foi quatro vezes campeão mineiro.

Tamanho sucesso no inimigo foi a causa da rejeição inicial de Marcelo Oliveira no Cruzeiro. Os 30 torcedores que protestavam no Mineirão no dia em que assinou contrato não estavam preocupados com o mau rendimento de Marcelo no Vasco – dez  jogos, duas vitórias, dois empates e seis derrotas -  ou de seu sucesso no Coritiba, quando foi bicampeão paranaense e vice da Copa do Brasil por dois anos seguidos. Estavam incomodados mesmo é com o fato de serem dirigidos por um ídolo do Galo.

“Pensei que o sentido da palavra profissionalismo já tivesse sido bem assimilado. Vim para honrar essa camisa”, disse na apresentação, ao lado do presidente Gilvan de Pinho e de ídolos como Dirceu Lopes, Piazza, Evaldo, Raul e Zé Carlos, dando aval ao ex-rival dos tempos de jogador. “Estou bastante feliz, honrado e orgulhoso. Sei que vou ter que trabalhar muito. Não tem outro caminho, senão os resultados. Para mim, é uma combinação de desafio e oportunidade. Poucos têm a oportunidade de trabalhar em grandes clubes, de títulos e tradição".

Marcelo Oliveira foi uma opção bancada pelo presidente, que gostaria de alguém mais tranquilo do que Celso Roth, o antecessor que, com um estilo recheado de gritos, conseguira impedir o rebaixamento em 2012.

Os jogadores logo começaram a sentir as mudanças. Em março, o volante Leandro Guerreiro explicou como estava se sentindo. “O Marcelo foi jogador e sabe do que o jogador gosta. É melhor dar uma explicação baixinho, do que gritando e esbravejando. Assim, o jogador entende melhor, pois gritar deixa o jogador nervoso e sem entender mais nada. Ele nos orienta da melhor maneira possível”, contou.

Em setembro, Lucas Silva, que ganhou a posição de Leandro Guerreiro, também colocou o fato de ter sido jogador como um mérito de Marcelo Oliveira. “Quem veio da base como eu vê o Marcelo como um paizão. A gente tem carinho por ele e ele trata a gente com respeito.  O Marcelo foi ex-jogador, então ele sabe o que passa na cabeça de um jogador, até dos mais experientes. Ele também dá liberdade para os atletas falarem com ele ou se expressarem para o próprio grupo”.

O estilo paternal não significa falta de cobranças. “No dia a dia, o Marcelo é um cara tranquilo, que conversa bastante. Mas na hora que tem que cobrar, ele cobra. Falando que vai ter que fazer isso, fazer aquilo, para que, dentro de campo, a gente possa executar da melhor forma”, diz o meia Ricardo Goulart, que foi mantido como titular mesmo após a chegada do superstar Julio Baptista.

Um outro tipo de cobrança demonstra influência grande de Telê Santana, que o dirigiu no Atlético no final dos anos 70. “Ele cobra muito quando a gente erra um passe, um lance no jogo, mas sempre querendo ajudar. Quando cobra, a cobrança é dura. Porém, isso serve de incentivo para ir melhorando”, disse Lucas Silva.

Por mais que a atitude agrade aos jogadores, Marcelo Oliveira tem o cuidado de não ganhar a fama de treinador “bonzinho”, algo fatal no futebol brasileiro. Segundo o treinador, ele não pode gritar porque tem dificuldades em analisar o jogo se “gastar” a voz, mas as cobranças são feitas do mesmo jeito.

A participação de Marcelo Oliveira na montagem do Cruzeiro campeão é muito grande. Ele trouxe sete dos onze titulares: Dedé e Nilton, com quem trabalhou no Vasco, Everton Ribeiro, seu comandado no Coritiba, além de Bruno Rodrigo, Egídio Dagoberto e Willian.

A chegada de Willian foi o ponto de inflexão do time. O titular era Diego Souza, que não estava rendendo bem desde o início. Em sua chegada ao Cruzeiro, Marcelo já respondia sobre o que teria de fazer para que Diego Souza rendesse bem. “Ele é muito bom e estou falando a ele que trocou o técnico da seleção e que ele pode ter novas chances”. Não deu certo. E Marcelo Oliveira pediu a saída de Diego Souza.

Ele foi para o Metalist, da Ucrânia,  que pagou 3 milhões de euros ao Cruzeiro e ainda cedeu Willian, que logo se adaptou ao time. Marcelo explicou assim a mudança. “Não houve uma adaptação do Diego aqui. Ele é muito bom jogador, mas não conseguiu render dentro da forma que estávamos jogando. E a vinda do Willian representou mais velocidade, um time mais ágil e com melhor recomposição.

Willian se tornou uma das referências do time, assim como Everton Ribeiro. A relação de Marcelo com Everton mostra muito do estilo do treinador. Ele viu o jogador fazer boas partidas no São Caetano e pediu sua contratação no Coritiba. Lá, ele demorou a render. Marcelo conversou com a diretoria e ficou acertado que o jogador seria emprestado. Até que houve um jogo contra o Operário de Ponta Grossa e ele foi escalado apenas em virtude de um acúmulo de ausências. Fez um golaço. Foi mantido e emendou sequência de sete jogos com gols. Virou titular.

O respeito à meritocracia é uma das características do treinador. Outra é buscar esquemas que aproveitem o estilo dos jogadores e não buscar jogadores que se adaptem ao seu estilo favorito: o 4-2-3-1, com muita velocidade. ”Essa forma preenche bem o campo. Você ataca com muitos jogadores e pode defender com sete ou oito. Mas é uma coincidência. Qualquer esquema pode ser bom, desde que o jogador cumpra bem a função.”

Os gols do Cruzeiro não são responsabilidade de apenas um jogador. Muita gente marca, até volantes como Nilton. "É uma coisa muito boa, salutar. Embora as pessoas fiquem esperando um artilheiro, mas é muito saudável você não depender só de um. Quando você tem um só fazendo a maioria dos gols, às vezes ele está fora ou muito mais marcado. O Cruzeiro tem a capacidade de, se alguém for muito marcado, surpreender com a chegada de outros para finalizar", explica o comandante. 

Marcelo é um treinador minucioso. “Vejo quase tudo, não só de jogos para pinçar detalhes ou perceber a forma dos times jogarem, mas também de ouvir entrevistas, observar futebol internacional, de que sempre podemos fazer alguma adaptação. Especificamente no Cruzeiro a gente faz um monitoramento de jogos dos nossos adversários. A cada jogo o atleta tem todo o material de quem que vai enfrentar".

Mesmo com tanto sucesso, há críticas a seu trabalho. A maior delas é que não tem tradição em decidir jogos no mata-mata. No Coritiba, é elogiado por levar o time a duas finais de Copa do Brasil, mas é contestado também por não ter dado o pulo final. Nas duas finais, contra o Vasco em 2011 e Palmeiras em 2012, optou por uma formação mais cautelosa e não conseguiu o título.

No Cruzeiro, perdeu o Mineiro para o Galo e foi eliminado pelo Flamengo na Copa do Brasil. Duas finais. Ele seria um técnico para trabalho a longo prazo, ideal para campeonatos de pontos corridos.

Bem, ninguém pode almejar a aprovação total, a unanimidade. Mesmo sendo ídolo no Galo e vencedor no Cruzeiro. Afinal, como disse o escritor Otto Maria Carpeaux, “mineiro só é solidário no câncer”.