Pescador forma mutirão para limpar os rios e salvar a pesca em Alagoas

As atenções estavam todas voltadas para o rio Santo Antônio. O pescador Jaelson estava apreensivo, esperando que o colega Pingo retirasse a rede do rio. Quando ela saiu da água cheia de tainhas, os colegas comemoraram como se o time deles tivesse feito um gol. O rio estava limpo e os peixes tinham voltado.

Jaelson Santos de Lima, de 49 anos, nasceu e se criou às margens do Rio Santo Antônio, na comunidade Ilha da Crôa, no município da Barra de Santo Antônio, em Alagoas. Viveu por décadas exclusivamente da pesca, mas viu os peixes sumirem por causa do excesso de lixo jogado por ribeirinhos em seu leito.

Ele conta que quando lançava a rede a 60 metros da margem conseguia uma pesca farta, com grande variedade de peixes.

Hoje, é necessário avançar 15 km rumo a outro trecho do rio para encontrar algumas variedades e, ainda assim, não tem a mesma fartura de antes.
Jaelson Santos de Lima, pescador

Utilizando seus conhecimentos ambientais adquiridos com a observação do rio, ao longo de décadas, o pescador conta que experimentou retirar o lixo das margens e de um trecho mais próximo do leito para ver se a realidade mudava. O número e a variedade de peixes aumentaram. "Isso acontece porque, em vez de lixo, as espécies aquáticas encontram oxigênio e alimento."

Sete toneladas de lixo

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Imagem: Arquivo pessoal

Ele começou, então, a limpar o rio por conta própria. Isso faz dez anos e ele já removeu cerca de 7.200 kg de lixo. São retirados, em média, 30kg de lixo do rio a cada 15 dias. Ele conta que à medida que o lixo vai sendo retirado, peixes como a tainha, que preferem as margens para fugir dos predadores e consumir o alimento, vão se reaproximando.

A ação faz diferença, uma vez que o rio onde Jaelson realiza a limpeza está situado na Área de Proteção Ambiental (APA) Costa dos Corais, a maior unidade de conservação federal do Brasil. A área envolve 400 mil hectares e 120 km de extensão, de Pernambuco a Alagoas.

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Uma pesquisa realizada pela Universidade Federal de Alagoas (UFAL), Projeto Terramar, a ONG Alemã GIZ e o ICMBio constatou contaminação alarmante nestes rios. Foram encontrados níveis altos de mercúrio e de agrotóxicos, lixo em excesso e mortandade de peixes, provocada pelo pouco oxigênio na água.

O oxigênio dissolvido na água é produzido pela fotossíntese realizada pelas algas e outros organismos do ambiente aquático. Quando o rio está poluído, o oxigênio dissolvido diminui devido à presença de nutrientes, que captam todo o gás, deixando os peixes sem o recurso.

Com limpeza, os peixes voltam

A pesca farta de tainhas, revela Jaelson, foi a melhor prova de que a limpeza do rio favorece a chegada dos peixes. "A tainha andava sumida, ninguém via esse peixe por aqui'. Diante do que viram, os pescadores voltaram a acreditar que poderiam retirar de novo seu sustento do rio.

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Imagem: Arquivo pessoal

Jaelson, então, montou um mutirão de pescadores para realizar a limpeza do rio e conscientizar os demais ribeirinhos sobre a importância de não jogar lixo nas águas. Ele explicou a eles que a poluição do rio pesa no bolso e mostrou que com o rio poluído todo mundo sai perdendo.

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O pesquisador e professor da Universidade Federal de Alagoas (UFAL), Emerson Soares, confirma que o trabalho de retirada do lixo, realizado pelo mutirão liderado por Jaelson, ajuda a trazer os peixes de volta.

A tainha é um peixe sensível. Quando há muita poluição, ela se afasta. Mas, além disso, é preciso monitorar e fiscalizar as atividades industriais que lançam resíduos no rio, a exemplo das usinas; e fazer o tratamento dos esgotos lançados no local.
Emerson Soares, professor da UFAL

Participam do mutirão de Jaelson idosos, homens, mulheres, jovens e adultos. Todos convencidos de que a poluição pesa no bolso. E, mais do que isso, convencidos de que, como ribeirinhos, integram a natureza tal como os peixes, as árvores e as águas.

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