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Brics: qual o papel do banco liderado por Dilma na agenda do clima?

Dilma Rousseff assume cargo no banco dos Brics - Reprodução/NDB
Dilma Rousseff assume cargo no banco dos Brics Imagem: Reprodução/NDB

Da Redação

Em São Paulo (SP)

25/04/2023 06h00

Sob o comando da ex-presidente Dilma Rousseff (PT) desde meados de abril, o Novo Banco de Desenvolvimento (NBD), mais conhecido como Banco do Brics, busca mobilizar capital para projetos de infraestrutura e crescimento sustentável em mercados em desenvolvimento.

Reunindo Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, o Banco do Brics é considerado a primeira instituição econômica voltada a países emergentes e pode desempenhar um papel importante na luta contra o aquecimento global e a exploração dos recursos naturais.

Juntos, os cinco países são responsáveis por cerca de 40% do consumo mundial de energia, o que os torna atores importantes para o cumprimento de acordos em prol do clima — a Organização das Nações Unidas (ONU) estima que o setor de energia seja responsável por dois terços das emissões de gases do efeito estufa no planeta.

Nesse cenário, como o NBD pode atuar na transição para uma economia de baixo carbono? Quais os desafios da instituição para alavancar iniciativas de sustentabilidade considerando diferentes perfis de emissão dos países-membros? Ecoa ouviu especialistas no assunto para explicar essas e outras questões.

Como funciona o Banco do Brics?

Sediado em Xangai, na China, o NBD busca ampliar o financiamento para projetos, sejam eles públicos ou privados, voltados à infraestrutura e ao crescimento sustentável de economias emergentes e em desenvolvimento. A criação da instituição foi aprovada em 2014, durante a cúpula do Brics realizada em Fortaleza (CE).

Foi a partir desse momento que a temática ambiental passou a ter mais adesão junto ao Brics, observa Beatriz Mattos, pesquisadora do Brics Policy Center, centro de pesquisas vinculado ao Instituto de Relações Internacionais da PUC-Rio

Reunião da cúpula dos Brics na África do Sul, em 2018 - Getty Images - Getty Images
Reunião da cúpula dos Brics na África do Sul, em 2018
Imagem: Getty Images

Com um capital subscrito que pode chegar a US$ 100 bilhões — montante dividido entre os cinco países —, desde 2015, já foram aprovados US$ 32 bilhões em projetos, dos quais cerca de US$ 4 bilhões estão sendo investidos no Brasil, principalmente em rodovias e portos.

"O primeiro pacote de financiamento concedido ao Brasil foi para criar dois parques eólicos e um parque de criação de energia solar. O banco busca impulsionar investimentos na área de desenvolvimento sustentável. Por mais que ele esteja aprovando financiamentos inicialmente para países-membros do Brics, isso também pode ser expandido para outros países do Sul global", observa Beatriz.

Qual o papel da instituição na agenda climática?

Para o professor Fabrício Stocker, da Escola Brasileira de Administração Pública da Fundação Getúlio Vargas (EBAP/FGV), o Banco do Brics pode ajudar no cumprimento de acordos multilaterais em prol do meio ambiente, como no caso da 27ª Conferência do Clima, realizada no ano passado, em que foi debatida a criação de um fundo de suporte a países vulneráveis.

"Foi discutida a importância disso, mas não quem vai fazer, quem vai doar ou quem vai receber. É isso que o Brics, por meio desse novo banco, quer: não só discutir a pauta, mas dar direcionamento claro para que a agenda seja implementada", pontua.

Beatriz também acredita que a instituição pode contribuir no cumprimento de metas globais, como o Acordo de Paris e a Agenda 2030, visando dar mais peso às demandas de países do Sul global no cumprimento de acordos climáticos, não apenas dos países pertencentes ao bloco.

Isso pode ocorrer especialmente no caso de responsabilidades comuns, porém diferenciadas entre esses países, com nações mais desenvolvidas auxiliando aquelas que ainda estão perseguindo seu desenvolvimento, seja por meio de financiamento ou transferência de tecnologia.

"O problema é de todos, mas há países com responsabilidades históricas no que diz respeito à crise de hoje, que se industrializaram primeiro, por exemplo. Então, isso é reforçado quando os países do Brics se colocam como bloco, não só como estados isolados", comenta Beatriz.

Os desafios do Brics em prol do clima

Considerando o alto consumo de energia dos países do agrupamento, a pesquisadora lembra que os projetos financiados precisam aliar sustentabilidade à justiça social.

Quanto ao Brasil, diz ela, é necessário reduzir o desmatamento e emissões advindas do uso e mudança no uso da terra, enquanto os demais países do Brics têm no setor energético seu principal gargalo.

No caso de Índia, China e África do Sul, a dependência do carvão e os problemas decorrentes desse tipo de combustível, como enfermidades e contaminação ambiental, são um desafio para os governantes.

A Rússia, por sua vez, tentou intensificar a exportação de petróleo no contexto da guerra com a Ucrânia e explorar o Ártico. "Percebemos que os desafios são grandes e a ambição precisa ser maior ainda. Hoje, as propostas desses países não são ambiciosas o suficiente", afirma Beatriz.

Além disso, as relações do Brics com países de fora do bloco — que são seus exportadores de matéria-prima — também precisam ser discutidas, lembra Fabrício, que cita como exemplo os minérios retirados de países africanos para a fabricação de celulares na China.

"Como é feita a gestão do impacto ambiental desses negócios? O Brics pode melhorar essa pauta e ver esses países com responsabilidade e liderança", diz.

Marina Silva, atual ministra do Meio Ambiente, terá papel fundamental na diplomacia brasileira em prol do clima - 16.jan.2023 - Reprodução/World Economic Forum - 16.jan.2023 - Reprodução/World Economic Forum
Marina Silva, atual ministra do Meio Ambiente, terá papel fundamental na diplomacia brasileira em prol do clima
Imagem: 16.jan.2023 - Reprodução/World Economic Forum

Como o Brasil pode se beneficiar

Com uma liderança do NBD alinhada a um governo defensor da agenda climática, diz Fabrício, o Brasil poderá se beneficiar de novos investimentos, a partir do ganho de credibilidade junto a parceiros internacionais.

"Quando tenho uma liderança com agenda clara e alinhada com esse desenvolvimento sustentável, consigo ter investidores e parcerias mais interessadas em fazer parte dessa agenda, tendo menor risco, porque não tenho uma mudança de pauta repentina", finaliza.