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Origens

As Histórias Que Nos Trouxeram Aqui: um resgate histórico da construção de identidade de pessoas negras


De imigrante ilegal nos EUA a advogada, brasileira agora ajuda famílias

Daniele Dutra

Colaboração para o UOL, do Rio

18/10/2022 16h44

Aos 20 anos de idade, a advogada Flávia Lloyd foi de malas prontas para os Estados Unidos para ficar um ano, mas ela não retornou mais ao Brasil. Ao longo de 23 anos no exterior, ela chegou a ser imigrante ilegal e a viver abaixo da linha da pobreza. Hoje, aos 43 anos, ela conta como deu uma reviravolta na vida ao se formar em direito, fazer doutorado e trabalhar ajudando brasileiros famosos e suas famílias a imigrarem para os EUA. Na lista, há Marco Pigossi, Virgínia e Neguinho da Beija Flor.

"O pior momento foi quando eu estava com o Lucas, meu filho mais velho, que tinha 15 dias de idade e fomos parar em um abrigo. Isso virou um marco na minha vida. Não importa o que esteja acontecendo na minha vida, aí eu lembro sempre que poderia ser pior. Isso impactou muito minha vida e quem eu sou hoje", contou Flávia, que da Califórnia, participou de "Origens - As histórias que nos trouxeram aqui", evento promovido por Ecoa nesta terça-feira (18).

Flávia conta que a saudade e a distância da família brasileira foram as situações mais difíceis neste período fora do país. A falta de internet em 1999, quando imigrou, acabou impedindo que ela conseguisse manter um contato mais próximo. Ao mesmo tempo, foi também a tecnologia que a possibilitou de se reaproximar dos parentes que ficaram por aqui.

"Lembro que eu chorava muito, ligava daqueles orelhões, queria ir embora. Meu avô, minha avó, morava na minha esquina. Aí, de repente, você se vê em um país estranho, com uma língua diferente, onde você não se enquadra bem. Essa ruptura foi muito difícil", conta Flávia.

Driblando todas as dificuldades, Flávia Lloyd se formou em direito e hoje ajuda brasileiros famosos e suas famílias a imigrarem para os EUA. - Reprodução - Reprodução
Driblando todas as dificuldades, Flávia Lloyd se formou em direito e hoje ajuda brasileiros famosos e suas famílias a imigrarem para os EUA.
Imagem: Reprodução

Mãe de dois filhos, de 21 e 2 anos, a advogada também falou sobre as diferenças culturais na criação dos filhos. "No Brasil a gente tende a colocar os filhos na barra da saia da mãe, aqui eles são muito independentes", conta. O filho mais velho chegou a passar um tempo no Brasil, quando tinha 10 anos, e pode se conectar com alguns costumes brasileiros.

"Meus pais sempre apoiaram minhas loucuras. Desde quando saí de Santos para São Paulo e quando decidi que iria para os Estados Unidos. Eu lembro que no aeroporto meu pai falou que eu não voltaria mais. Dito e feito, ele estava certo. Já minha mãe achava que eu voltaria depois de um ano", lembra a advogada, que também falou sobre como é ser uma mulher negra nos Estados Unidos.

QUARTA TEMPORADA

Promovido por Ecoa, Origens está em sua quarta temporada. O evento deste ano tem como mote "As histórias que nos trouxeram aqui", e acontece ao longo desta terça-feira (18), a partir das 14h, com transmissão online nas plataformas do UOL. Ao todo, serão seis painéis em que pessoas, entre celebridades e ilustres anônimos, contarão como buscaram respostas sobre o seu passado ou agiram para transformar, cada qual à sua maneira, seus núcleos familiares.

Os intervalos de cada painel terão apresentações de slam, conduzido pela poeta e compositora Bell Puã, e de stand up, liderado pela humorista e apresentadora dos programas Splash Show e Otalab, do UOL, Yas Fiorelo. A apresentação e mediação dos encontros fica por conta da jornalista Semayat Oliveira.

Confira a programação completa:

14h45 às 15h15 | PAINEL 1 - EM NOME DO PAI

O empresário Huanderson Marques Plínio da Silva só conheceu aos 57 anos o nome do pai que ele nunca conheceu. Além disso, soube que a família paterna, até então desconhecida, morava a apenas 7 km de distância de sua casa. A descoberta de tudo foi feita pela filha, a escritora e professora Andressa Marques da Silva, que promoveu uma verdadeira investigação em busca das origens do avô. Pouco tempo depois da descoberta, Huanderson ainda ganhou outro presente: encontrou a avó e outros parentes. Para sinalizar que agora tinha pai, o empresário mudou o nome para incluir o do pai, Plínio. No primeiro painel, Ecoa recebe pai e filha para contar como foi o processo de resgate da história da família.

15h25 às 15h55 | PAINEL 2 - OS FILHOS QUE A VIDA DÁ

Dizem que pai e mãe são as pessoas quem criam e se responsabilizam pela criança. Ou seja, não é preciso vínculo biológico para amar e ajudar no desenvolvimento dos filhos que se escolhe ou se ganha na vida. Disso a influenciadora Gabi Oliveira sabe bem. Ela adotou sozinha duas crianças, de 9 e 4 anos. Nas redes sociais, Gabi conta sobre a rotina e desafios de ser mãe, influencia outras mulheres e quebra muitos tabus sobre a adoção. No segundo painel, ela conta mais sobre a família e como pretende ressignificar a construção de um lar repleto de filhos que a vida lhe deu.

16h05 às 16h35 | PAINEL 3 - DANDO ASAS A MUDANÇAS

O intercâmbio para estudar nos Estados Unidos deveria durar apenas um ano, mas Flávia Lloyd acabou ficando por lá. E isso já dura mais de duas décadas. Neste ínterim, a vida dela passou por uma reviravolta. Durante muito tempo, ela permaneceu em solo norte-americano de forma ilegal. Chegou a dormir em abrigo com o filho, na época, um recém-nascido. Trabalhou em todos os tipos de emprego e viveu abaixo da linha da pobreza. Driblando todas as dificuldades, ela se formou em direito e hoje ajuda brasileiros famosos e suas famílias a imigrarem para os EUA. Na lista, há Marco Pigossi, Virgínia e Neguinho da Beija Flor.

16h45 às 17h15 | PAINEL 4 - A HISTÓRIA QUE TRANSFORMA

Doutora em história, Lucimar Felisberto pesquisou os aspectos da mobilidade social de africanos e negros livros na segunda metade do século 19. Acostumada a comunicar de forma didática os desdobramentos da história brasileira a seus alunos, a professora de escola pública do Rio sentia falta de contar em detalhes uma história específica. A dela. Usando seus conhecimentos, ela elaborou na unha a árvore genealógica da própria família. Assim, entendeu como seus antepassados saíram de Minas para se fixarem no Rio. A história dava uma novela. Mas ela fez diferente. Escreveu um livro para narrar a saga do seu clã.

17h25 às 17h55 | PAINEL 5 - A CABEÇA DA FAMÍLIA NEGRA

Autora do livro "A união faz a força", a psicóloga e doutora em psicologia Reymi Solange Chagas se dedicou a estudar os mitos familiares que orientam crenças, fantasias e valores de famílias negras. Convidada do quinto painel de "Origens: as histórias que nos trouxeram aqui", ela explica quais e como traumas e condições estruturantes da família são centrais para pessoas negras.

18h05 às 18h35 | PAINEL 6 - FAMÍLIA REATADA PELA TECNOLOGIA

Dona Selma Aparecida Gomes Moura, a avó da analista contábil Ingrid Gregório, foi deixada dada para adoção quando tinha por volta de 5 anos de idade. Primeiro, tentaram um orfanato. Como estava cheio, deixaram-na com uma funcionária de uma escola em Belo Horizonte que já fechou. Muitas das perguntas que a matriarca tinha sobre seu passado só começaram a ser respondidas após os 70 anos. Isso só ocorreu graças a um teste genético feito pela neta. Graças ao exame, a avó encontrou uma prima do lado da família até então desconhecida. "Ela encontrou a vida dela. Descobriu porque era órfã, seu nome verdadeiro e por quê foi deixada em um orfanato. Foi o maior milagre que vivemos na vida", diz Ingrid. Ela e a avó, que passará a se chamar Maria das Graças de Assis, seu nome de registro, são as convidadas do último painel, que irá passear por esta busca pelo ancestral perdido.

Temporadas anteriores

O evento Origens: as histórias que nos trouxeram até aqui é a continuação do projeto "Origens: Quem Não Sabe de Onde Veio Não Sabe para Onde Vai", conteúdo publicado em Tilt, canal de tecnologia do UOL, entre abril e maio de 2021. O projeto consistiu na distribuição de testes de DNA para 20 personalidades negras para falar sobre o que elas sabiam da sua ancestralidade e na discussão de como o apagamento da humanidade de pessoas negras impediu que mais de metade do país soubesse sobre seu passado, sua história e suas origens. O trabalho rendeu um documentário, uma reportagem especial e 20 perfis especiais, além do primeiro lugar no prêmio "Respeito e Diversidade", realizado pelo CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público), em setembro de 2021.