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O que acontece no seu corpo quando você pula o jantar

Imagem: Arte UOL

Cristina Almeida

Colaboração para VivaBem

09/04/2024 04h05

Todo mundo já ouviu alguém dizer que há tempos não janta mais. Na maioria das vezes não se trata de uma pessoa cujo estilo de vida a impede de fazer essa que é considerada uma das principais refeições do dia. Em geral, a estratégia tem como finalidade o controle do peso.

Limitar o tempo de alimentação noturna, mas comer pela manhã e no almoço pode ser considerado um tipo de jejum intermitente, ou seja, um regime alimentar no qual se restringe o consumo de calorias durante determinado período do dia e de forma continuada.

Como a obesidade é uma epidemia mundial, a prática tem sido vista com entusiasmo por cientistas e médicos. Afinal, ela pode se tornar uma ferramenta útil para tratar esse quadro.

Mas atenção: pular o jantar não é remédio para emagrecer e nem é solução que serve a todos.

O número de adultos com obesidade no globo pode aumentar de 810 milhões em 2020 para 1,53 bilhão em 2035.

41 milhões de mortes anuais são atribuídas às DCNT (doenças crônicas não transmissíveis), e 5 milhões delas são impulsionadas pelo IMC (índice de massa corporal) elevado (≥ 25 kg/m2).

55% da população brasileira tem sobrepeso ou obesidade. Dados do Atlas Mundial da Obesidade (2024).

Testes de laboratório

A convenção de se fazer três refeições ao longo do dia é o resultado de heranças culturais e dos primeiros estudos sobre os processos relacionados à saúde e às doenças que concluíram que o café da manhã, o almoço e o jantar garantem o aporte de nutrientes e a energia necessários para as atividades do cotidiano.

O jejum intermitente é hoje um dos regimes alimentares mais estudados pelos cientistas, e a sua fama se deve principalmente aos resultados de testes realizados em animais, e que têm mostrado potenciais benefícios para a saúde. Veja alguns deles:

  • Melhora do controle da glicemia
  • Redução da gordura corporal
  • Redução do colesterol
  • Melhora da pressão sanguínea
  • Adiamento de sintomas de Alzheimer, Parkinson e doença de Huntington
  • Prevenção do câncer
  • Redução das inflamações

Os efeitos no seu corpo

As pesquisas feitas em humanos seguem em curso, são promissoras, mas apresentam resultados conflitantes.

Além disso, até agora não oferecem todas as informações sobre o que acontece no corpo quando pulamos refeições, seus efeitos colaterais e, sobretudo, as implicações de longo prazo.

Esta é a razão por que os especialistas consultados advertem que se você deseja adotar essa prática, o melhor é ser orientado e supervisionado por um profissional da saúde.

Confira alguns dos efeitos de pular o jantar já observados pelos pesquisadores:

  • Mudanças no peso
  • Aumento do risco de morte
  • Alterações na saúde mental

Você pode ficar leve, mas também pesar mais

A perda de peso pode ocorrer, e ela decorre da redução do consumo calórico diário. Quando tal medida se soma a exercícios físicos, o resultado pode ainda ser melhor. Apesar disso, até o momento, não se sabe se essa perda dura no tempo.

A melhora de marcadores metabólicos como taxas de açúcar no sangue, da pressão sanguínea, do colesterol e inflamatórios podem ocorrer.

O que os pesquisadores ainda não esclareceram é se tais benefícios metabólicos são causados pela perda de peso ou pelo jejum intermitente.

Por outro lado, um estudo japonês que observou os hábitos alimentares de estudantes universitários que pulavam o jantar, concluiu que a prática também se relaciona ao ganho de peso, sobrepeso e obesidade.

Algumas hipóteses tentam explicar esse fenômeno: pular o jantar pode desregular o apetite, levando ao maior consumo de calorias de uma única vez.

Pessoas com esse perfil tendem a ter dietas pobres e consomem mais snacks.

Nessa pesquisa, o jantar foi considerado um fator importante para prevenir os quadros mencionados, exatamente como não pular o café da manhã. Dados publicados pela revista científica Nutrients.

A sua vida pode ficar mais curta

Um dos problemas de pular refeições por conta própria é que pessoas com determinadas doenças podem ser tentadas a fazê-lo, colocando em risco a própria saúde.

Uma recente pesquisa divulgada pela Associação Americana do Coração avaliou a redução do risco de morte por todas as causas e também por causas cardiológicas.

Estudos anteriores mostravam que o jejum intermitente reduzia esse tipo de risco no curto prazo.

Nesse estudo, os resultados mostraram que, em longo prazo, restringir o tempo de alimentação pode quase dobrar o risco de morte por doenças cardiovasculares.

Dito isso, resta esclarecer como é que essa limitação de consumo alimentar em uma parte do dia se relaciona ao risco de ter um AVC e doenças do coração.

Outro estudo publicado pelo Journal of the Academy of Nutrition and Dietetics analisou a associação entre frequência da alimentação, intervalos e mortalidade por todas as causas, inclusive doenças cardiovasculares. Conclusão: pular o almoço ou o jantar está associado ao maior risco de morte por todas as causas.

Esse estudo observou os hábitos alimentares de 24 mil adultos com 40 anos ou mais.

Entre as características identificadas no grupo que consumia menos de 3 refeições ao dia destacam-se ser jovem, homem, ter menores escolaridade e renda familiar, uso de tabaco ou álcool, viver em insegurança alimentar, menor consumo de alimentos saudáveis e menor consumo energético no geral.

A química cerebral pode mudar

Já está estabelecido que a adoção de uma dieta saudável com perfil anti-inflamatório pode ser benéfica em quadros iniciais de depressão, e alguns nutrientes são particularmente úteis no apoio do seu tratamento e no da ansiedade.

Embora o padrão alimentar individual esteja sendo cada vez mais associado a doenças psiquiátricas, os mecanismos por trás disso ainda não são tão bem esclarecidos. No entanto, algumas situações podem ser influenciadas pela limitação das refeições:

O adoecimento mental pode alterar padrões alimentares, seja gerando compulsão alimentar, seja justificando a adoção de regimes drásticos de jejum.

Para quem possui humor depressivo, pular o jantar pode facilitar a busca por alimentos que tragam conforto, ou seja, itens com maiores teores de gorduras e açúcar nos períodos em que o comer estará liberado.

No curto prazo, pular o jantar provoca flutuações da glicemia, o que pode gerar sintomas como tremor e fraqueza. Em alguns indivíduos, esse tipo de estresse pode levar a alterações no sono.

A sugestão do psiquiatra é ficar de olho em sintomas novos que apareçam após mudanças na dieta. A medida pode prevenir adoecimentos físicos e mentais.

Contraindicações

Imagem: iStock

Comer em um período de 12 horas e jejuar por 12 horas é considerado seguro para a maioria das pessoas. Contudo, pular uma refeição pode ser arriscado para alguns grupos e determinadas condições de saúde. Confira:

  • Diabetes descontrolado
  • Doenças nos rins
  • Problemas cardiológicos
  • Pessoas com distúrbios alimentares
  • Gestantes
  • Pessoas que façam uso de medicamentos para o diabetes, pressão sanguínea e doenças do coração
  • Idosos, crianças e adolescentes

Conselho do endocrinologista

Antes de colocar em prática esse tipo de medida, considere que nem todos conseguem fazer uma dieta pobre em carboidratos.

Algumas pessoas não conseguem pular o jantar, e há aquelas que precisam comer a cada 3 horas. Assim, se a ideia é perder peso, a melhor dieta é aquela que se adapta ao paciente, ou seja, ela deve ser personalizada.

Pular o jantar pode ser uma proposta para quem precisa reduzir um pouco as calorias diárias, mas não serve para todos.

Mudar o padrão alimentar por 15 dias não funciona para tratar algum problema de saúde, principalmente o excesso de peso. Neste caso, as mudanças devem ser orientadas e têm de ser de longo prazo.

Fontes: Flavia Auler, nutricionista, especialista em nutrição clínica e terapia nutricional, mestre em alimentos e nutrição, doutora em ciências da saúde e coordenadora do curso de nutrição da PUC-PR; Godson Teixeira, psiquiatra do HU-Univasf (Hospital Universitário da Universidade Federal do Vale do São Francisco), vinculado à rede Ebserh (Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares); Marcio Mancini, médico endocrinologista, chefe do Grupo de Obesidade do HC-FMUSP (Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo), vice-presidente do Departamento de Obesidade da SBEM-SP (Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia Regional São Paulo). Revisão técnica: Flavia Auler.

Referências:

Sanvictores T, Casale J, Huecker MR. Physiology, Fasting. [Updated 2023 Jul 24]. In: StatPearls [Internet]. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2024 Jan-. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK534877/

Sun Y et al. Meal Skipping and Shorter Meal Intervals Are Associated with Increased Risk of All-Cause and Cardiovascular Disease Mortality among US Adults. J Acad Nutr Diet. 2023. Disponível em https://www.jandonline.org/article/S2212-2672(22)00874-7/fulltext

Yamamoto R et al. Associations of Skipping Breakfast, Lunch, and Dinner with Weight Gain and Overweight/Obesity in University Students: A Retrospective Cohort Study. Nutrients. 2021. Disponível em https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/33477859/

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