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Paola Machado

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Só pode treinar leve? Veja mitos sobre a prática de exercícios na gestação

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Colunista do VivaBem

29/03/2022 04h00

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A atividade física é importante em qualquer etapa da vida, inclusive na gestação! No passado, pouco se falava em exercício para grávidas, pois havia ainda um certo receio entre os próprios médicos e profissionais de saúde em indicá-los.

Muito disso por conta da escassez de pesquisas e carência de artigos científicos de qualidade. Porém, nas últimas décadas, pesquisas passaram a ser feitas de forma cautelosa e evidenciaram a importância e os benefícios para ambos, mãe ativa e bebê.

Ainda assim, se mantêm difundidos muitos tabus e crenças em relação a esse tema, que levam gestantes a se privar de realizar exercícios por medo e falta de informação. Por isso, trouxe alguns mitos comuns para desmistificá-los e para você se convencer de que se exercitar é benéfico em qualquer fase da vida!

"Grávida só pode fazer exercícios leves, como alongamento e exercícios na água, sem impacto"

MITO É comum ouvir profissionais indicando que gestantes devam fazer apenas hidroginástica. Isso não é verdade Um profissional não especializado em gestantes ou em obstetrícia não possui conhecimento sobre a fisiologia da gestação e, por isso, há o receio em machucar a barriga ou o bebê durante os movimentos realizados. Há quem acredite também que fazer esforço na gestação leva ao parto prematuro.

A rotina de atividade física de gestantes não está restrita ao alongamento e à hidroginástica. Quando não há contraindicação nem restrições médicas, o American College of Obstetrician and Gynecologists recomenda a adoção de exercícios aeróbicos (como a corrida), de fortalecimento e de resistência muscular antes, durante e após a gestação!

E aqui trago a importância em se investir nesses exercícios de forma completa e integrada! O condicionamento cardiorrespiratório fica deficiente devido à ação hormonal, afinal, qual gestante nunca apresentou falta de fôlego ao subir um lance de escadas? Além da ação hormonal com o decorrer da gestação, o fôlego piora pelo crescimento do bebê, compressão venosa e redução do espaço e capacidade pulmonar! Por isso, vale investir em uma modalidade aeróbica durante a gestação —só evite a bike, pois há risco de quedas.

Exercícios de força, como o pilates, segundo a fisioterapeuta especializada responsável pelo setor de obstetrícia da Clínica La Posture, Angela May, são essenciais. Eles ajudam a deixar o corpo preparado para sustentar todo o peso e crescimento abdominal, caso contrário, dores lombopélvicas podem surgir por deficiência muscular.

"Gestantes só podem começar a fazer exercício a partir do segundo trimestre"

MITO Para gestantes sem complicações e que já eram praticantes de atividade física antes da gestação, é recomendado continuar a realizar exercícios desde o primeiro trimestre!

Treinos após o segundo semestre só devem ser iniciados por gestantes sedentárias e por mulheres que tiveram dificuldade para gerar de forma natural, isto é, que realizaram fecundação artificial. Para as mulheres que tiveram alguma complicação como sangramento e descolamento ovular no primeiro trimestre, só é liberado a prática de atividade física quando cessarem essas complicações obstétricas. Caso a gestante tenha alguma outra complicação, pode ser que o exercício seja contraindicado durante toda a gestação. Lembre-se que cada caso deve ser avaliado individualmente e discutido com a equipe especializada em obstetrícia e a médica em acompanhamento.

"Exercício pode levar a parto prematuro"

MITO Ao contrário do que se pensa, a realização da atividade física assistida por uma profissional qualificada apresenta diversos benefícios tanto para a mãe quanto para o bebê. Sendo que um dos benefícios é exatamente o oposto do mito difundido: vários estudos comprovam que exercícios físicos reduzem o risco de parto prematuro!

O que os estudos apontam em relação ao risco de parto prematuro é a atividade ocupacional da gestante que requer esforço físico repetitivo utilizando peso excessivo. Um estudo apontou que mulheres que carregam peso acima de 20 kg mais de 10 vezes por dia têm, sim, risco de nascimento prematuro.

Ou seja, nenhuma atividade física supervisionada e direcionada por um profissional de obstetrícia faria uma gestante carregar tanto peso. Mesmo numa modalidade como o crossfit? Vale o bom senso e manter sempre uma boa hidratação! A gestante sem complicações e com respaldo médico pode sim, realizar exercício físico e não se preocupar com risco de prematuridade.

"Exercício físico vai restringir o crescimento do meu bebê"

MITO Da mesma forma que a atividade física reduz o risco de parto prematuro, também é eficaz em reduzir o risco de restrição de crescimento do bebê. Portanto, é preconizada e incentivada a prática de atividade física para se estimular resultados positivos no desenvolvimento fetal.

A inatividade física está associada à mortalidade precoce na população geral. Na gestação, a inatividade e ganho de peso excessivo são fatores de risco para obesidade materna, e complicações relacionadas à gestação como diabetes, levando ao risco de crescimento excessivo do bebê (macrossomia) e a outras complicações como deficiência respiratória, hipoglicemia neonatal, e desenvolvimento de problemas metabólicos.

Estudos mostraram que a prática de atividade física na gestação altera de forma mínima o peso fetal. Uma pesquisa apontou redução de 200 g a 400 g de peso quando a mãe realiza exercício vigoroso no último trimestre, mas isso não foi considerado restrição de crescimento. Gestantes que realizam atividade física em intensidade leve a moderada têm comprovação científica de que não põem em risco o bebê. No entanto, atenção a esses fatores que podem levar à restrição de crescimento do seu bebê, como a deficiência placentária, doenças como pré-eclâmpsia, hipertensão arterial não controlada e alteração no cordão umbilical.

Aqui trouxe 4 mitos e explorei os motivos pelos quais você não deve se manter sedentária na gestação. Vale reforçar que a atividade física em gestantes sem complicações é recomendada sim, e esse consenso/guia sobre a prática de exercício físico foi liberado pelo Colégio Americano de Obstetrícia e Ginecologia em 2020!

Antes de iniciar uma atividade física é importante e necessário que a gestante seja avaliada pelo médico obstetra e que a atividade seja sempre conduzida por profissionais da saúde especializados em atividade física para gestante. É muito importante que se tenha indicação correta na prática do exercício físico, bem como que o profissional que conduza o atendimento dessa gestante saiba reconhecer limitações, suas necessidades em cada trimestre, assim como reconhecer sinais para interrupção ou evolução da prática.

Caso você seja gestante e sua gravidez evolua sem complicações, e você ainda não esteja fazendo uma atividade física, por favor, inicie por você e pelo seu bebê! Sua saúde agradece, você terá melhor qualidade de vida durante toda a gestação, prevenindo dores desnecessárias e ainda terá um pós-parto ainda mais saudável para curtir a maternidade.

*Colaboração Angela May, fisioterapeuta especializada em Obstetrícia e gestora da especialidade de Fisioterapia Pélvica na Clínica La Posture e Dra. Renata Luri, fisioterapeuta doutorada pela Unifesp

Referências:

  1. Physical activity and exercise during pregnancy and the postpartum period. Commitee on obstetric practice. ACOG commitee opinion. The American College of Obstetrícians and Gynecologists, 2020, 135(4):e178-88

  2. Global recommendations on physical activity for health. World Health Organization, 2010. Disponível em: https://www.who.int/publications/i/item/9789241599979

  3. Physical activity guidelines for americans. US Department of Health and Human Service, 2018. Disponível em: https://health.gov/our-work/nutrition-physical-activity/physical-activity-guidelines/current-guidelines

  4. Effect of a physical exercise program during pregnancy on uteroplacental and fetal blood flow and fetal growth: a randomized controlled trial. Melo ASO, Silva JLP, Tavares JS et al. Obstet Gynecol, 2012, 120(2pt1):302-10

  5. Exercise during pregnancy does not cause preterm delivery: a randomized, controlled trial. Barakat P, Pelaez M, Montejo R, et al. J Phys Act Health, 2014, 11:1012-7

  6. Aerobic exercise for women during pregnancy. Kramer MS, McDonald SW. Cochrane Database of Systematic Reviews, 2006, 2006(3):1-42

  7. Effect of exercise on birthweight. Lee T, Flick L. Clin Obstet Gynecol, 2003, 46:423-31

  8. A randomized clinical trial of exercise during pregnancy to prevent gestational diabetes mellitus and improve pregnancy outcome in overweight and obese pregnant women. Wang C, Wei Y, Zhang X, et al. Am J Obst Gynecol, 2017, 216:340-51

  9. Exercise during pregnancy and risk of preterm birth in overweight and obese women: a systematic review and meta-analysis of randomized controlled trials. Magro-Malosso ER, Saccone G, Di Mascio D, et al., Acta Obstet Gynecol Scand, 2017, 96:263-73

  10. Effects of physical activity and life-style factors on uterine contraction frequency. Grisso JA, Main DM, Chiu G et al., Am J Perinatol, 1992, 9:489-92.

    Occupational lifting of heavy loads and preterm birth: a study within the Danish National Birth Cohort. Runge SB, Pedersen JK, Svendsen SW et al., Occup Envirom Med, 2013, 70:782-8