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Correndo por fora, Índia é um dos maiores berços de startups bilionárias

Ascensão das startups locais teve ajuda da intensa ampliação do acesso à internet no país Imagem: rawpixel.com via Freepik

Felipe Zmoginski

Colaboração para Tilt, na Índia

18/06/2020 04h00Atualizada em 18/06/2020 09h44

Estados Unidos e China são os países com maior número de empresas "unicórnios" no mundo, segundo um ranking de janeiro do jornal The Washington Post. Das 440 startups com valor acima de US$ 1 bilhão existentes em todo o mundo, as duas nações têm 125 cada. Mas a terceira colocação, que já foi da Alemanha, do Reino Unido e da Coreia do Sul, agora tem um novo dono: a Índia.

De acordo com a lista do jornal, o país asiático tem hoje 26 unicórnios, e mantém larga vantagem em relação aos ex-colonizadores ingleses (11 unicórnios) e aos vizinhos de continente, a Coreia do Sul (dez). A economia indiana é uma das poucas que registrará algum crescimento em 2020 (0,2%, segundo projeção do FMI), mesmo sob a crise mundial após a pandemia de covid-19.

Para Aravind Gupta, pesquisador do Instituto de Tecnologia de Bangalore, a ascensão tec indiana deve-se a fatores como o tamanho do mercado interno, a excelência da educação dada à elite do país e ao recente fluxo, sobretudo americano e chinês, de investimentos estrangeiros.

"Por questões culturais e demográficas, os indianos sempre tiveram destaque em ciências exatas e matemáticas, o que era pouco aproveitado localmente em função do baixo dinamismo econômico dos anos 80 e 90. Este cenário, porém, alterou-se nos últimos 15 anos", afirma Gupta.

O professor lembra que os atuais executivos-chefes do Google e Microsoft —Sundar Pichai e Satya Nadella, respectivamente— são indianos. "Sempre tivemos talentos. Agora, os estamos retendo", afirma.

O fenômeno também é efeito do aumento do acesso à internet no país. Atualmente, há 451 milhões de pessoas conectadas na Índia (dados da Associação de Internet e celular do país com a Nielsen). Os indianos, em média, consomem 9,8 GB de dados/mês por usuário em 2018 —índice mais elevado do mundo, de acordo com dados da empresa de telefonia Ericsson.

Fundos estrangeiros também trouxeram mais dinheiro no país, impulsionados pela política liberal do primeiro-ministro Narendra Modi, reeleito em 2019. A vinda de mais capital de risco na última década foi tanta que em 2018, a revista The Economist definiu a Índia como "novo paraíso dos investimentos, em que muitos capitalistas esperam encontrar o pote de ouro no fim do arco-íris".

Visitamos quatro destes unicórnios em viagem a Nova Déli, Bangalore e Mumbai para entender, afinal, por que eles crescem mais que a média de seus equivalentes no mundo.

Swiggy: delivery aprendeu a driblar trânsito caótico

Delivery de comida em cidades caóticas em que população cozinha em casa já vale US$ 3,3 bi Imagem: Divulgação

Em 2014, criar um app para entregar refeições em um país em que todos cozinham em casa não parecia exatamente a melhor ideia. Sem falar do trânsito: um percurso de dois quilômetros pode levar mais de uma hora para terminar. Mas foi isso que fez da Swiggy uma das estrelas do ecossistema local.

A startup foi pioneira em desenvolver estruturas de negócios "hiperlocais". Neste modelo, produtos e serviços são fornecidos e montados na mesma área geográfica em que são vendidos. A empresa, com sede em Bangalore, alugou prédios em múltiplos bairros da cidade e construiu "cozinhas em nuvem", locais onde só se produz para delivery.

"Este método, chamado no Ocidente de cloud kitchen, acabou copiado por empresas no mundo todo, mesmo em países que não têm problemas logísticos como nós temos, simplesmente porque é mais rápido, barato e eficiente", diz Rahul Jaimini, fundador da Swiggy.

Com a atual crise sanitária, a empresa passou a entregar compras de farmácia e supermercado nas casas dos indianos. Isso elevou o faturamento da Swiggy para seu maior patamar. Nada mal para quem operou por três anos no prejuízo. "Nossos investidores foram pacientes e apostaram no longo prazo. Agora, estamos colhendo os frutos", afirma Jaimini.

PayTM: app faz de reserva de hotel a venda de ações

Empresa planeja incluir mais 500 milhões de indianos em sua base Imagem: Divulgação

Fenômenos como AliPay e WeChat Pay, que permitiram à China tornar-se a primeira economia sem dinheiro de papel no mundo, têm seu equivalente na Índia. A fintech PayTM —sediada em Noida, uma espécie de Alphaville de Nova Déli— é a única no mundo, fora da China, a ter incluído 500 milhões de consumidores em sua carteira digital.

O app de pagamentos surgiu em 2010 para viabilizar o ecommerce em um país com baixa penetração de cartões de crédito. O sucesso inicial com pagamentos fez da PayTM um "superapp" que agrega serviços como compra de passagens, venda de ingressos para shows, cinema e games para celular. O usuário vai desde reservar um quarto de hotel até vender ações na Bolsa de Valores.

"Nosso modelo serve de base a todo ecossistema digital da Índia, já que qualquer empreendedor que tenha uma ideia criativa sabe que terá um meio de pagamento simples, barato e extremamente popular para integrar a sua aplicação", afirma Vijay Sharma, fundador da startup.

Em 2019, a PayTM teve um terço de seu capital comprado pelo grupo chinês Alibaba, de quem pretende localizar tecnologias como o pagamento via reconhecimento facial, também chamado de "smile to pay". Uma inovação distante para muitos países desenvolvidos, mas realidade para consumidores de Bangalore, Agra ou Mumbai.

De acordo com Sharma, a empresa espera dobrar de tamanho até 2022. "Estamos em busca dos outros 500 milhões de indianos adultos que ainda não usam nossa carteira digital", afirma.

Oyo: plataforma aluga e reforma quartos de hotéis

Para Agarwal, CEO da Oyo, receita indiana revelou-se útil para todo mundo em desenvolvimento Imagem: Divulgação

O setor hoteleiro critica plataformas competidoras sem os mesmos custos e obrigações, como o Airbnb. Uma startup indiana, no entanto, criou na cidade de Gurgaon a Oyo, um serviço online que aluga e também reforma quartos de hotéis. Assim, torna propriedades decadentes em locais novamente valorizados.

O projeto parecia perfeito para a Índia, país que com exceção dos poucos (e caríssimos) hotéis de luxo cinco e seis estrelas, sofre com acomodações de baixa qualidade e pouca adaptação ao público estrangeiro. A ideia deu tão certo que Indonésia, Vietnã e até China passaram a oferecer seus hotéis para a rede Oyo, que tem custos financiados pelo fundo japonês Softbank.

"Nosso modelo nasceu pensando nas necessidades das grandes cidades da Índia, mas descobrimos um potencial global", conta Ritech Agarwal, fundador da Oyo. Na última avaliação, fundos de venture capital projetavam valor de US$ 10 bilhões para a empresa.

Flipkart: Amazon indiana usa mulas para entregas no Himalaia

Fã de Steve Jobs, fundador da Flipkart agora é sócio do Wal-Mart Imagem: Divulgação

Se Jeff Bezos é um ícone para os americanos e Jack Ma para os chineses, os indianos também têm sua sumidade do ecommerce: Binny Basal. Jovem, empreendedor e, bem, filho de uma família milionária, investiu os recursos dos pais em uma plataforma de comércio eletrônico com um ousado sistema de logística. Ele inclui motos e até mulas para levar pacotes até os confins do Himalaia.

Menino rico, Basal revelou-se também talentoso e competente. Multiplicou o dinheiro da família e foi pioneiro, ainda em 2007, ao apostar nesta modalidade de comércio. Líder no mercado indiano, o Flipkart poderá vir a ser o maior ecommerce do mundo, já que a população de seu país deve superar a da China até 2023. Quando acontecer, colocará sua empresa à frente de Amazon e Alibaba em número de clientes domésticos.

Há um ano, Basal entregou 77% do capital do Flipkart ao Wal-Mart e embolsou mais US$ 17 bilhões à sua fortuna pessoal. A empresa, no entanto, continua sendo um unicórnio, já que não se integrou à transacional americana ou fez abertura de capital.

De acordo com Mahid Kotha, diretor de novos negócios do Flipkart, a associação com o grupo americano foi para tornar a empresa indiana competitiva contra o avanço do Alibaba na Índia. "Esta união nos permite competir de igual para igual com rivais internacionais que entrem em nosso mercado", afirma Kotha.

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