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Arquiteto suíço diz que algoritmos levarão a arquitetura a outra escala

Digital Grotesque é uma obra feita pelo arquiteto Benjamin Dillenburger; ela foi criada com ajuda de algoritmos - Divulgação
Digital Grotesque é uma obra feita pelo arquiteto Benjamin Dillenburger; ela foi criada com ajuda de algoritmos Imagem: Divulgação

Matheus Pichonelli

Colaboração para Tilt, em São Paulo

11/11/2019 13h34

"O que um grão de areia gostaria de ser?" A pergunta está na descrição da obra "Digital Grotesque", uma gruta ornamental impressa em 3D em grande escala e que celebra um novo tipo de arquitetura: a combinação com algoritmos. Sim, algoritmos.

O projeto, que abandonou paradigmas de racionalização e padronização arquitetônicas, é do famoso arquiteto suíço Benjamin Dillenburger, pesquisador de Pesquisa em Fabricação Digital no Centro Nacional de Competência em Pesquisa (NCCR/DFAB, na sigla em inglês) e professor de Tecnologias Digitais de Construção no Instituto Federal de Tecnologia (ETH) de Zurique.

Produzido em parceria com o alemão Michael Hansmeyer, "Digital Grotesque" usa o chamado processo aditivo, que cria objetos sólidos a partir de modelos digitais através de sobreposição de camadas de materiais, provocando uma revolução no design. Tais projetos seriam impossíveis de desenhar manualmente.

O arquiteto suíço conta com a maior impressora 3D do mundo à disposição. Sua pesquisa se concentra no desenvolvimento de tecnologias de construção baseadas na interação de métodos de projeto computacional, fabricação digital e novos materiais.

Responsável por essas e outras obras que estão levando a arquitetura a uma outra escala, Dillenburger estará no Brasil nesta semana para compartilhar suas percepções sobre como a tecnologia pode evoluir o setor. Convidado pela ArcelorMittal, que reúne empresas do ramo do aço, ele dará palestra nesta quarta-feira (13) na Escola Politécnica da USP (Universidade de São Paulo).

Antes de embarcar para o Brasil, ele concedeu uma entrevista exclusiva a Tilt. Na conversa, ele classifica o computador como um verdadeiro parceiro. "Ele nos permite abordar escalas de projeto com detalhes que não pudemos modelar de maneira convencional", diz.

Tilt: Como foi o processo criativo de suas duas obras mais conhecidas, o Arabesque Wall e Digital Grotesque?

BD: Esses trabalhos exploram o possível impacto do design computacional e da fabricação digital na arquitetura. No processo de design desses projetos, o computador se torna um parceiro ativo, coprojetando com os arquitetos.

O computador se transforma em uma ferramenta de imaginação, que nos ajuda a descobrir um design que não poderíamos conceber. Além disso, nos permite abordar escalas de projeto com detalhes que não pudemos modelar de maneira convencional.

Tilt: Como será a relação entre arquitetura e algoritmos?

BD: A maioria dos arquitetos trabalha com computador e software há décadas, mas a maneira como projetamos com computadores e quais algoritmos estamos usando estão mudando. O sucesso da inteligência artificial que vemos em outras disciplinas também entrará no mundo do design. O Big Data relacionado à arquitetura tornou-se disponível recentemente. Portanto, a pesquisa nesse campo ainda está engatinhando.

Mas os primeiros experimentos em nosso laboratório e em outras instituições demonstram que a IA orientada por dados pode ter um grande impacto no design e na fabricação, na nossa profissão e nos edifícios que serão fabricados. A complexidade dos projetos de construção passará de um desafio para uma oportunidade, prestes a ser explorada.

Tilt: É possível dizer que as tecnologias digitais de construção estão provocando uma revolução na arquitetura contemporânea?

Benjamin Dillenburger: Elas têm o potencial de alterar todos os aspectos da arquitetura: do design, planejamento, fabricação à manutenção de edifícios. A indústria da construção acabou de iniciar o processo de digitalização, e algumas das tecnologias podem ser perturbadoras. A digitalização não está acontecendo de uma só vez, mas como uma evolução - uma mudança incremental.

Para dar um exemplo: já encontramos muita fabricação CNC [o processo de fabricação que utiliza computadores para automatizar máquinas e ferramentas em diversas etapas de produção] na construção de madeira pré-fabricada, enquanto quase não existem máquinas robóticas no canteiro de obras.

Tilt: Como arquiteto, de onde vem seu interesse pela ciência da computação?

BD: Trabalhar e pesquisar no campo das tecnologias digitais requer interesse em arquitetura e ciência da computação, o que eu tive desde o início.

Durante meus estudos, tentei pela primeira vez projetar arquitetura através do algoritmo de script. Este foi um momento chave para eu entender o potencial da tecnologia da informação nesse campo.

1 - Montagem do Digital Grotesque, do arquiteto suíço Benjamin Dillenburger - Divulgação - Divulgação
Montagem da obra Digital Grotesque, criada com impressora 3D
Imagem: Divulgação

Tilt: Como você acha que nossas cidades serão daqui a dez ou 15 anos?

BD: Antes de tudo, as cidades continuarão crescendo, pois a urbanização do nosso planeta ainda está aumentando. Esperamos que nossas cidades possam oferecer espaço acessível e um ambiente de construção sustentável, mas também diverso e estimulante. Esse será um dos temas da minha palestra.

Tilt: Pode falar mais sobre sua impressora 3D? Existem equipamentos similares em todo o mundo?

BD: Nosso processo de extrusão de concreto no laboratório de fabricação robótica da ETH Zurique pode ser considerado como o que tem a maior impressora 3D do mundo, com um leito de impressão de 40 x 10 x 5 metros. Mas estamos trabalhando com diferentes sistemas de impressão 3D.

Às vezes, podemos usar ou adaptar máquinas existentes. Às vezes, precisamos desenvolver novos processos de impressão. O campo da fabricação aditiva está crescendo, várias abordagens de impressão 3D em larga escala são investigadas na academia mundial. Paralelamente, a indústria da construção também começa a reconhecer o potencial.

Tilt: Os projetos em larga escala de arquitetura se tornarão cada vez mais comuns?

BD: A fabricação de aditivos e a fabricação robótica ganharão cada vez mais relevância. Muitos de nossos fluxos de pesquisa são desenvolvidos em cooperação com parceiros do setor, com a clara ambição de aplicar essas tecnologias na prática e escalá-las para projetos maiores. Mas a fabricação digital é um campo muito diversificado, com muitas abordagens diferentes, que também refletem a diversidade da arquitetura em geral.

Tilt: Quais são suas referências no Brasil? Você tem obras favoritas no Rio de Janeiro, São Paulo ou Brasília? O que você gostaria de conhecer?

BD: Eu já tive o privilégio de visitar todas as cidades mencionadas e descobrir uma arquitetura fantástica, originária do modernismo brasileiro e da arquitetura contemporânea, desde habitação social a projetos de museus. Infelizmente, até agora, eu não conseguia ver muito da natureza única que o Brasil tem para oferecer.

Tilt: Quais são seus trabalhos favoritos?

BD: Encontro inspiração em vários projetos. As características compartilhadas de minhas obras favoritas são que elas transcendem a arquitetura do mero edifício —uma arquitetura que se torna parte da cultura e fornece identidade e interação. Portanto, gosto de ver a arquitetura sendo ativamente usada e experimentando espaços que abordam todos os sentidos.

Arabesque Wall  - Divulgação - Divulgação
Arabesque Wall é outra importante obra do arquiteto
Imagem: Divulgação

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