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Ricardo Feltrin

Novo "cabide" de empregos, Cinemateca deixa cineastas na mão

Fachada da Cinemateca Brasileira, em São Paulo - Danilo Verpa/Folhapress
Fachada da Cinemateca Brasileira, em São Paulo Imagem: Danilo Verpa/Folhapress

Colunista do UOL

27/09/2020 00h09

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Fechada desde o final do ano passado, a Cinemateca de São Paulo se tornou um órgão inoperante para a indústria audiovisual, mas está virando mais um suculento cabide de empregos para o bolsonarismo.

Enquanto a Secretaria especial da Cultura se ocupa e esforça em acomodar os candidatos à "boquinha", centenas de pedidos de cessão de imagens feitos por cineastas não só do Brasil, mas de outros países, estão sendo ignorados.

A Cinemateca tem um dos maiores acervos audiovisuais da América Latina e é fonte documental para cineastas e produtores de cinema, TV e streaming.

Sem esse material, muitas produções que já haviam sido afetadas pela pandemia de coronavírus se encontram agora impedidas de trabalhar pela falta de apoio e colaboração da Cinemateca.

Trata-se de uma entidade pública, fruto de uma doação privada à União.

No início de agosto, numa evidente violação contratual (sem falar no gesto autoritário), o governo federal, por meio da Secretaria de Cultura, levou até policiais federais para "retomar" o controle da Cinemateca, que fica sediada em São Paulo e era gerida pela Fundação Roquette Pinto.

O contrato só venceria em março de 2021 e o governo devia (deve) mais de R$ 14 milhões à fundação, que também é dona e responsável pela TV Escola —e que também foi expulsa do governo.

Além disso, o estatuto da Cinemateca proíbe não só que o governo a controle diretamente a Cinemateca como a tire de São Paulo (outro desejo dos bolsonaristas),

Palavras ocas

Embora tenha prometido "romper com a velha política", de ter atacado a esquerda por "aparelhar" órgãos públicos e de afirmar inúmeras vezes que, em seu governo, tudo seria "diferente", Jair Bolsonaro segue repetindo a mesmíssima cartilha dos inimigos.

Primeiro reproduziu o hábito dos petistas, que aparelharam a TV Brasil (EBC): tratou de encher o local de apoiadores (e filhos de apoiadores também).

Agora deu sinal verde para seus apaniguados ocuparem cargos também na Cinemateca.

Os "agraciados" com mais este trenzinho público da alegria são bolsonaristas e ex-funcionários de regionais do ministério do Turismo, que foram fechadas nos últimos meses.

Os forasteiros vão se dar mal

Nenhum desses grupos de "candidatos" aos cargos têm formação e nem sequer a menor noção do trabalho especializado exigido para a manutenção do acervo audiovisual.

Segundo especialistas ouvidos pela coluna, isso vai prejudicar ainda mais o órgão se e quando ele reabrir.

A Secretaria de Cultura é hoje o último bastião do chamado "olavismo" —os seguidores de Olavo de Carvalho.

Assim como seu "guru", radicado nos EUA, os olavistas acreditavam que a TV Escola e a Cinemateca eram "ralos" de dezenas de milhões de reais dos cofres públicos destinados à "esquerda".

Mal informados (ou apenas limitados cognitivamente), os "olavistas" já cometeram dois erros crassos em quase dois anos no poder.

Primeiro foi o erro grotesco (leia-se: Abraham Weintraub) de achar que podia expulsar os funcionários da Roquette Pinto e assumir a TV Escola.

Não podia, a emissora, a concessão e a marca pertencem à fundação (incrível, mas o ex-ministro não sabia disso).

Agora estão invadindo a Cinemateca, só que também já há suspiros de decepção.

Alguns esfomeados por cargos estão se queixando de que os salários pagos naquele órgão são muito baixos. E que seu orçamento é pequeno demais (para suas ambições, sejam lá quais forem).

Nada que mais uma canetada —e outra quebra de promessa eleitoral— de Bolsonaro não possa resolver um dia.

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