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Depp x Heard: o que descobrimos após quase 2 meses do julgamento milionário

Matheus Brum

Colaboração para Splash, em Juiz de Fora (MG)

31/05/2022 04h00Atualizada em 31/05/2022 16h28

O julgamento entre os atores Johnny Depp e Amber Heard, que começou no dia 11 de abril, no estado da Virgínia (EUA), entrou na fase final na última sexta-feira (27) depois de revelar dezenas de detalhes sobre um relacionamento complexo e marcado por acusações de violência doméstica, estupro, manipulação e uso de drogas e álcool. Agora, falta o veredito.

Apesar de a ação ter exposto momentos gravíssimos do casal, a ação é sobre difamação. Depp, de 58 anos, pede US$ 50 milhões por Heard, 36, ter escrito um artigo no The Washington Post, em 2018, se colocando como vítima de violência doméstica. Ela não cita o ator, mas ele perdeu papéis no cinema por conta disso, por isso ingressou com uma ação por danos.

Há uma outra ação, em que Amber pede US$ 100 milhões de indenização porque a defesa de Depp disse publicamente que as alegações dela eram falsas.

Ao longo de quase dois meses, testemunhas depuseram, advogados se confrontaram e uma multidão acompanhou cada passo do julgamento. Veja abaixo um resumo do que foi dito pelos lados envolvidos.

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A atriz Amber Heard fala sobre o ex-marido, Johnny Depp
Imagem: Michael REYNOLDS/POOL/AFP

A defesa de Amber

Durante todo o julgamento, os advogados de Heard usaram testemunhas para relatar o uso excessivo de álcool e drogas por parte do ator. Ele não nega isso, mas diz que nunca agrediu a ex.

Testemunhas contribuíram para apresentar um Depp raivoso, que tentava controlar a carreira dela e com que ela se relacionava. Heard afirmou que ele a chutou nas costas no meio de um voo porque estaria com ciúmes de ela estar estrelando o filme "The Aderall Diaries" com o ator James Franco.

O ponto mais forte do julgamento, até agora, foi a acusação de que Depp estuprou a ex-companheira. Quem comentou os fatos foi a psicóloga Dawn Hudges, que ajudou no tratamento da atriz.

"Quando o sr. Depp estava bêbado ou drogado, ele a jogava na cama, rasgava sua roupa e tentava fazer sexo com ela", disse, em referência aos relatos que a atriz fez a ela. "Houve vezes em que ele a forçou a fazer sexo oral nele quando estava com raiva dela."

Heard descreveu ainda um ato de agressão sexual e disse ao júri que Depp inseriu uma garrafa de bebida em sua vagina e não parou mesmo quando ela estava sangrando. O incidente teria ocorrido em março de 2015 na Austrália, quando Depp estava filmando Piratas do Caribe.

Logo na primeira vez que depôs no processo, ela afirmou que brincou com uma das tatuagens de Depp antes de levar três tapas no rosto. "Você acha que é uma cadela engraçada?", teria dito o ator. As agressões, segundo ela, passaram então a ser frequentes.

Em outro episódio mencionado pela atriz, ela relatou que Depp "procurou drogas" em seu corpo e "vasculhou em sua vagina" atrás de cocaína, acreditando que a então companheira estava escondendo a droga. Ela descreveu o incidente como uma busca na cavidade em que ele "rasgou um de seus vestidos favoritos" no episódio.

Ainda foram mostradas mensagens de texto em que Depp diz explicitamente que queria sua ex-mulher "morta", em conversa com o ator britanico Paul Bettany.

"Vamos afogar Amber antes de queimá-la. Eu vou foder seu cadáver queimado para ter certeza de que ela está morta"!

"Esta é uma janela para o coração e a mente do pirata mais amado da América", disse Benjamin Rottenborn, advogado de Heard.

Quando perguntado sobre as mensagens, Depp disse que elas foram tiradas "diretamente" de uma cena humorística do Monty Python sobre bruxas sendo queimadas e afogadas.

Heard ainda afirmou que Depp pendurou um de seus cachorros — Boo, da raça teacup york — pela janela de um carro em movimento. "Ele estava uivando enquanto segurava o cachorro pela janela. Todo mundo no carro, eu nunca vou me esquecer, todo mundo congelou. [...] Ninguém fez nada, e eu também não. Porque não queria fazer qualquer coisa que pudesse fazê-lo reagir e derrubar o cachorro", relatou.

Para finalizar, Rottenborn defendeu que Depp "simplesmente não pode provar a eles que ele nunca abusou de Amber".

"Uma decisão contra Amber aqui envia a mensagem de que não importa o que você faça como vítima de abuso, você sempre tem que fazer mais. Não importa o que você documente, você sempre tem que documentar mais. Não importa o quão honesto você seja sobre suas próprias imperfeições e suas próprias falhas em um relacionamento, você tem que ser perfeito para que as pessoas acreditem em você", ressaltou.

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A advogada Camille Vasquez e Johnny Depp
Imagem: KEVIN LAMARQUE / POOL / AFP

A defesa de Depp

Já a defesa de Depp trabalhou para minar a credibilidade da atriz.

Para isso, apontaram que ela não fez a doação prometida à União Americana das Liberdades Civis dos US$ 7 milhões que Depp deu a Heard pelo acordo de separação, o que indicaria que ela não cumpre com suas palavras.

Também enfatizaram que não havia registros médicos sobre os supostos abusos contra ela e chamaram ex-companheiras do ator para reforçar que ele não é um marido ou namorado agressivo.

Depois, uma psicóloga contratada por Depp afirmou que a atriz teria transtorno de personalidade, impulsionado por um medo de abandono. A acusação apresentou áudios dela implorando para que o ator não a deixasse.

Outro ponto importante foi a apresentação, por parte de Depp, de um áudio em que Heard o desafia a falar para o mundo que é vítima de violência doméstica. "Diga ao mundo, Johnny", disse. "Diga a eles que eu, Johnny Depp —um homem— também sou vítima de violência doméstica."

Depp disse no seu depoimento que respondeu: "Sim, eu sou". "Ele sofreu persistente violência verbal, física e emocional de Heard", disse a advogada Camille Vasquez.

Também foi mostrado um trecho do diário da atriz, em que ela escreve "Desculpe, eu posso perder a cabeça. Sinto muito por ter te machucado", referindo-se a alguma briga com Depp.

O ator citou uma vez em que a ex arremessou uma garrafa de vodca contra ele. Segundo contou, ele teria ficado em choque e usado o sangue da ferida para escrever mensagens para Heard na parede.

O ponto mais polêmico foi quando Camille Vasquez apresentou fotos de Heard tiradas 24 horas depois que Depp a teria espancado. Na versão da atriz, a violência deixou hematomas, cortes e um nariz inchado, possivelmente quebrado, mas nas fotos apresentadas no julgamento ela não parecia machucada.

Vasquez sugeriu que Heard havia manipulado a foto, mas Heard negou: "Isso está errado. Eu não as retoquei". Um especialista em metadados analisou as fotos e disse que elas passaram por um programa de edição.

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Perito depõe e sugere que fotos do rosto de Amber Heard machucado foram editadas
Imagem: Michael REYNOLDS/POOL/AFP

Outro ponto negativo para Heard foi o depoimento de um executivo do TMZ, um dos sites de celebridades mais respeitados do mundo, que disse que a própria atriz teria enviado um vídeo de Johnny Depp batendo nos armários da cozinha. O site verificou o conteúdo e constatou que o vídeo estava cortado, tirando a parte final onde ela ria para a câmera.

No apresentação final, Vasquez ressaltou que era Heard a parte violenta do relacionamento. "O que a Sra. Heard testemunhou neste tribunal é a história de muitas mulheres. Mas a evidência esmagadora e o peso dessa evidência mostram que não é a história dele. Não é a história da Sra. Heard. Foi um ato de profunda crueldade, não apenas para o Sr. Depp, mas para os sobreviventes reais de abuso doméstico. A Sra. Heard se apresentar como uma figura pública representando abuso doméstico. Era falso, difamatório e causou danos irreparáveis", falou.

O que acontece agora?

O veredicto do júri, composto por sete pessoas, precisa ser unânime. Apesar das deliberações, isso ainda não foi alcançado.

O que está claro é que não haverá prisão para nenhum dos lados, apesar dos relatos de abusos, estupro e violência. Depp pode não conseguir a indenização e, em caso de Heard ser inocentada, terá que pagar as custas processuais dela.

Mas, se for condenada, Heard terá que desembolsar o alto valor, enquanto o ator tende a reconquistar sua reputação na indústria do cinema.

A atriz já relatou que se sentiu humilhada e enfrentou centenas de ameaças de morte diárias depois de testemunhar no julgamento.

Há ainda um efeito maior. A socióloga americana Nicole Bedera teme que o caso traga dificulte a vida das vítimas de violência sexual. Independentemente do veredito, as campanhas de amor e ódio geradas pelo caso inibem, a partir de agora, a manifestação das vítimas.

A maior empatia com os homens acusados é chamado pela filósofa Kate Manne de fenômeno 'himpathy', ou seja, a empatia exagerada que se dedica aos homens, lembra Bedera. Isso agora ganha outras proporções e afeta outras mulheres.

Na plataforma TikTok, a hashtag #IStandWithAmberHeard ("fique do lado de Amber Heard") foi clicada 8,6 milhões de vezes, enquanto #JusticeForJohnnyDepp ("justiça para JohnnyDepp") conseguiu cerca de 15,7 bilhões. (Com agências internacionais e BBC)