Topo

Página Cinco

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Livros para a molecada: opções nada abobalhadas

Pintura de Jean-Michel Basquiat - Reprodução
Pintura de Jean-Michel Basquiat Imagem: Reprodução

Rodrigo Casarin

Colunista do UOL

14/12/2022 04h00

Receba os novos posts desta coluna no seu e-mail

Email inválido

"Eu grito SAI!/ E correndo ele vai/ E faço zoeira/ Da sua carreira/ Eu não vou chorar/ Ele terá de voar/ E eu me divirto/ Com o seu faniquito/ NADA NA VIDA ME ASSUSTA.// Baderna e pancada/ De brigões na madrugada/ NADA NA VIDA ME ASSUSTA.// Panteras atrás do muro/ Estranhos no escuro/ NÃO, ELES NÃO ME ASSUSTAM NADA.// Na escola nova,/ um pesadelo/ Meninos puxam/ meu cabelo/ (Meninas imbatíveis/ De cabelos crespos/ incríveis)/ ELES NÃO ME ASSUSTAM NADA.// Não me mostrem sapos e cobras/ E esperem que eu grite./ O medo, se aparecer,/ Só nos meus sonhos existe."

É de uma força rara o pequeno "A Vida Não Me Assusta", publicado por aqui pela Caveirinha, selo infantil da Darkside, em tradução de Anabela Paiva. Editado por Sara Jane Boyers, no livro um potente poema de Maya Angelou, referência na luta pelos direitos civis e contra o racismo nos Estados Unidos, dialoga com a perturbadora e instigante arte de Jean-Michel Basquiat, grande nome das artes plásticas estadunidenses no século 20, um dos responsáveis por colocar o grafite no patamar que hoje ocupa. Resiliência e orgulho se aliam nesse volume pensado para crianças, mas que deve agradar também a marmanjos.

Também misturando poesia com ilustrações, mas agora com uma pegada bem mais terna e lúdica, algo onírica, temos "O Vestido de Afiya" (Olho de Vidro, tradução de Marcos Marcionilo). Ilustrado pela brasileira Anna Cunha, o livro nasce dos versos do jamaicano James Berry. Nele, a garotinha Afiya vê as aventuras de seus dias se transformarem me memórias que impregnam em seu vestidinho branco. "Afiya vai ao zoo/ e de lá volta junto com dois tigres,/ um nas costas, outro na frente.// Ela vai à praia/ e volta pra casa com os peixes/ agitados nas ondas/ do mar inteiro/ impresso em seu vestido", lemos num trabalho que se destaca pela sensibilidade.

Já "Entre Sonhos e Dragões" é mais pesado e inspirador. Publicado pela Companhia das Letrinhas e ilustrado por N. N., nesse infantil Adriana Carranca, autora também de "Malala, A Menina que Queria Ir Para a Escola", volta a olhar para garotas que precisam travar suas lutas entre guerras e regimes opressores. São três as afegãs que inspiram as protagonistas da narrativa que coloca a arte de rua, a música e o esporte como caminhos para tentar construir um mundo melhor: a boxeadora Sadaf Rahimi, a grafiteira Shamsia Hassani e a violoncelista Meena Karimi. Contada com graça, feita também de momentos bem duros, é uma narrativa de resistência em meio a um interminável ciclo de estupidez e violência.

Livros nada abobalhados para a molecada - Reprodução - Reprodução
Imagem: Reprodução

Há mais dicas de livros nada abobalhados para crianças pelo histórico da coluna - aqui, por exemplo, indico o excelente "Crianças", da María José Ferrada, junto com alguns outros. Para fechar as recomendações da vez, um que não é infantil, mas funcionará bem para o pessoal com seus 15, 16 anos - e também agradará adultos. Falo de "Fábulas Cabulosas e Outras Histórias Subversivas", escrito por Henrique Rodrigues, ilustrado por Arnaldo Branco e publicado pela Rocco. Em crônicas cheias de humor, ironia e bem-vindas pitadas de acidez, narrativas clássicas são recontadas para dialogar com questões caras ao nosso tempo.

Assim, as formigas penam com um sindicato pelego enquanto acusam as cigarras de parasitarem a Lei Rouanet. "Chapeuzinhx" se empenha num "textão sobre a dissolução das representações de gênero além do discurso acerca de pertencimento e territorialidade". Alice vive no país decolonial e a outrora branca vira Parda de Neve, a dona do La Parda Burguer. Já a lebre se queixa dos seguidores que irá perder após ser derrotada pela tartaruga. Como nas fábulas escolares, cada texto é finalizado com uma moral. Uma delas: "Tem gente que se esforça para ser jovial e mal consegue ser imaturo".

Você pode me acompanhar também pelas redes sociais: Twitter, Facebook, Instagram, YouTube e Spotify.