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Salman Rushdie: a condenação à morte e as facadas em tempos tenebrosos

Salman Rushdie na Flip de 2010 - Leandro Moraes/ Uol
Salman Rushdie na Flip de 2010 Imagem: Leandro Moraes/ Uol

Rodrigo Casarin

Colunista do UOL

12/08/2022 16h08Atualizada em 12/08/2022 18h10

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"Eu passei boa parte da minha vida de escritor refletindo sobre o fanatismo, mesmo antes de 'Os Versos Satânicos'. E já acompanhava o crescimento do extremismo fundamentalista antes de ele se voltar contra mim", disse durante sua participação na Flip de 2010 Salman Rushdie, escritor que nasceu na Índia dominada pelos britânicos e cresceu numa família de muçulmanos.

Há pouco Rushdie foi esfaqueado no pescoço durante uma apresentação em Nova York. Ainda não se sabe a identidade nem as motivações do homem que subiu ao palco para cometer o atentado. Mas uma suspeita principal, uma ilação óbvia, vem à cabeça de quem conhece o mínimo da trajetória do escritor: o ataque tem a ver com as ameaças de morte que recebeu há mais de 30 anos.

Em 1988, Rushdie lançou o livro que transformou radicalmente sua vida. "Os Versos Satânicos" mistura fantasia, mitologia e religião para, numa narrativa de fundo autobiográfico, sondar respostas para a pergunta: quem sou eu? Só que a obra não caiu nada bem entre certos islâmicos radicalizados, que nela enxergaram supostas blasfêmias ao profeta Maomé. Na visão dos religiosos mais bitolados é inadmissível qualquer tentativa de se representar Maomé.

Rushdie foi jurado de morte no ano seguinte ao lançamento. O aiatolá Ruhollah Khomeini, então principal líder do Irã, emitiu a fatwa, uma condenação, decretando: o muçulmano que matasse o escritor garantiria o seu bom lugar na eternidade. Pelo assassinato, ainda foi oferecida uma recompensa bem terrena: 3 milhões de dólares.

A consequência? O livro foi banido em diversos países e, mesmo onde estava livre para circular, muitas vezes era evitado pelas livrarias, receosas com possíveis retaliações. Editores e tradutores ligados à obra foram vítimas de radicais. Após a condenação, Rushdie viveu cerca de 13 anos meio que escondido, sob constante proteção. Quando retornou à vida pública, cercava-se de todo um aparato de segurança, precaução que talvez andasse um pouco mais relaxada já pela distância daquelas ameaças.

Voltemos a Nova York. O ataque em si está consumado. Caso seja confirmado que ele tem ligação direta com a condenação emitida há 33 anos, será mais uma vitória da intolerância religiosa e dos truculentos nesses tempos tenebrosos.

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