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OPINIÃO

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Estaduais são injustos para os campeões e vices

Jogadores do Palmeiras comemoram o título do Campeonato Paulista 2020 - Cesar Greco/Palmeiras
Jogadores do Palmeiras comemoram o título do Campeonato Paulista 2020 Imagem: Cesar Greco/Palmeiras

14/05/2021 04h00

Os principais campeonatos estaduais do Brasil já estão em reta final. Superando percalços de datas e maratonas de jogos em decorrência das complicações da pandemia de Covid-19, os torneios serão encerrados nas próximas semanas para dar passagem às Séries A e B do Brasileirão, que começam ainda em maio. Desde já, inicia-se o processo de injustiça, tanto aos times campeões como aos derrotados.

Explico. Na elite do futebol nacional existe a imposição que o vencedor fez apenas a sua obrigação, ou seja, o time campeão cumpriu o seu dever de casa, sem que haja o merecido reconhecimento pelo feito. Já o clube que perde o título na decisão é visto como fracassado e que toda a temporada foi jogada ralo abaixo. A torcida já pede a cabeça do treinador e aponta que todo o trabalho realizado nos primeiros meses de temporada foi em vão.

Ouvi estas avaliações frias, inadequadas e maldosas ao longo dos meus 20 anos como atleta profissional. E elas ainda ecoam quando paro para escutar e conversar sobre futebol. Não há momento de serenidade para refletir que em alguns casos os times ainda estão em fase de preparação, com técnicos novos e elencos que passaram por reestruturação.

Nas vezes em que fui campeão estadual recebi apenas os parabéns e à rebote vinham as cobranças: "agora vamos ganhar um campeonato de verdade". As 'novas exigências' eram de conquistar a Copa do Brasil, a Libertadores ou o Brasileiro.

Com seis gols em 2021, Hulk se tornou o artilheiro isolado do Atlético-MG na temporada - Pedro Souza/Atlético - Pedro Souza/Atlético
Com seis gols em 2021, Hulk é artilheiro isolado do Atlético-MG e aposta na final diante do América
Imagem: Pedro Souza/Atlético

Acredito que a pressão maior entre os clubes da elite do Brasileirão está em Belo Horizonte e sobre os ombros do Atlético-MG, que encara o América-MG. Primeiro, pelo grande investimento de cerca de R$ 300 milhões que realizou para montar o seu elenco. Segundo, pelo fato de não enfrentar na decisão o seu maior rival: o Cruzeiro.

Mesmo com as condições adversas que o lado celeste tem passado, a balança se equilibra em clássicos, tanto que o Cruzeiro ganhou o único confronto entre as duas potências de Minas Gerais.

Já no Rio de Janeiro, a obrigação está nas mãos do Flamengo, obviamente. E não é só no Carioca que o Rubro-Negro é visto como franco favorito para ficar com o título. Por tudo que alcançou nos últimos anos - bicampeonato brasileiro e a campanha vitoriosa da Libertadores em 2019 -, o time da Gávea é apontado para levar mais um Estadual.

Mas calma. A rivalidade com o Fluminense pode encurtar este precipício de investimento na montagem dos times. Não é à toa que o Fla-Flu é sinônimo do famoso jogo de pebolim em diversos pontos do Brasil, mesmo que os bonequinhos sejam das cores azul e vermelha. Esta competitividade é até vista no hino do Flamengo, que menciona o rival em determinada estrofe: "E no Fla-Flu é um aí, Jesus!"

Vejo que em São Paulo é onde há mais justiça nos pareceres, visto que é o Estadual mais duro do país. São quatro grandes lutando pelo título. Neste ano, o São Paulo tem se empenhado para encerrar o jejum de mais de 15 anos sem ganhar o Paulistão, tanto que até poupou os titulares em duelo da Libertadores para seguir vivo no Estadual.

Somado a isso, São Paulo é o Estado com mais representantes na Série A do Brasileirão, com cinco times - sem contar com Ponte Preta e Guarani, que circulam entre a Primeira e a Segunda divisão do Nacional, além do Mirassol que tem feito ótimas campanhas nos últimos anos. Por isso que treinadores e jogadores dão muito valor ao torneio e sempre tem um time grande brigando até a última rodada para se classificar ao mata-mata, ou até lutando para não ser rebaixado.

Tiago Nunes durante treino do Grêmio, em Porto Alegre - Lucas Uebel/Grêmio FBPA - Lucas Uebel/Grêmio FBPA
Tiago Nunes assumiu o Grêmio após a saída de Renato Gaúcho no fim de abril
Imagem: Lucas Uebel/Grêmio FBPA

Miguel Ángel Ramírez, técnico do Internacional, na semi do Gauchão - Ricardo Duarte/ Internacional - Ricardo Duarte/ Internacional
Miguel Ángel Ramírez chegou ao Inter no início da temporada 2021
Imagem: Ricardo Duarte/ Internacional

Já no Rio Grande do Sul o equilíbrio fica por conta dos trabalhos recém-iniciados pelos novos treinadores da dupla Gre-Nal. E foi nestes clubes gaúchos que senti estes dois lados da moeda: a obrigação de ter sido campeão e a turbulência por ter deixado o título escapar.

Essa pressão acaba refletindo no Campeonato Brasileiro, que já tem o pontapé inicial logo no fim de semana seguinte ao término dos Estaduais. O treinador derrotado não pode falhar, uma vez que pode ser mandando embora caso titubei nas primeiras rodadas do Nacional.

O Estadual não é certeza de sucesso quando se ganha, e também não é certeza de fracasso quando se perde. Por tanto, acredito que estes torneios locais podem avaliados de uma maneira melhor, com análises caso a caso. Hoje há tanta gente destrinchando os números do futebol e comentando sobre o esporte que poderiam estudar afinco as campanhas e os rendimentos, tanto do conjunto como de cada atleta.

Por causa do calendário enforcado que os clubes enfrentam são forçados a disputar duas ou mais competições simultaneamente. E o Palmeiras é um ótimo exemplo disto, visto que ficou ameaçado de cair logo na fase de grupos do Paulistão, mas tem 100% de aproveitamento nas quatro partidas que disputou na Libertadores.

Ser campeão estadual não é sinônimo de uma temporada brilhante. Quando ainda estava no Grêmio, vi o Internacional ser campeão gaúcho. Porém, na sequência, o Tricolor teve uma forte arrancada nas primeiras rodadas do Brasileiro.

No nicho do futebol há uma grande certeza: o treinador que está parado no primeiro semestre já está se preparando para assumir algum clube ao fim dos Estaduais. Não ao acaso que o maior fluxo na troca de técnicos ocorre no intervalo de 15 dias após as decisões do Estaduais.

*Com colaboração de Augusto Zaupa