Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Equipe holandesa vira 'entreposto' de pilotos brasileiros
Esta é parte da newsletter do Flavio Gomes, enviada ontem (11). Na newsletter completa, apenas para assinantes, o colunista comenta o título da Stock Car conquistado pelo "interminável" Rubens Barrichello, em Interlagos. Quer receber antes o pacote completo, com a coluna principal e mais informações, no seu e-mail, semana que vem? Clique aqui.
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Nos anos 90, piloto brasileiro que se destacava por aqui e queria seguir para a Europa tinha um único destino: a equipe italiana Draco Racing, de Adriano e Nadia Morini. Por alguma razão insondável, ou perdida no tempo, o time enfileirou pilotos brasileiros em suas hostes e alguns deles foram muito bem-sucedidos e conquistaram títulos nas categorias de base. Para ficar em apenas três nomes, Rubens Barrichello, Felipe Massa e Augusto Farfus foram alguns dos que levantaram taças com a Draco em priscas eras.
Mas pela equipe passaram também, entre muitos outros, Ricardo Zonta, Bruno Junqueira, Gualter Salles, Rodrigo Sperafico e Marco Campos. Este último levou a Draco a dar seu passo mais ousado em 1995.
Talentosíssimo, Marco foi campeão da F-Opel em 1994 e os Morini chegaram à conclusão de que ele era o que mais se aproximava de uma linha de sucessão de Ayrton Senna, morto no mesmo ano. O Brasil, diga-se, ansiava por alguém que ocupasse esse lugar e Barrichello, embora fosse muito jovem, não era mais uma novidade e, incrivelmente, com pouquíssimo tempo de F-1 — duas temporadas —, já era visto com alguma desconfiança por torcedores acostumados às vitórias de Ayrton, Piquet e Fittipaldi nas famosas manhãs de domingo.
Para abreviar o caminho até a F-1 e não perder o menino, Morini resolveu montar uma equipe de F-3000, a categoria imediatamente anterior, "pulando" o que seria o caminho natural para o piloto brasileiro, a F-3 Inglesa — que naqueles tempos era quase obrigatória para quem quisesse se preparar bem para chegar ao topo. Tudo foi feito às pressas, porque Campos tinha um convite tentador para defender na F-3 a equipe WTS, que pertencia a Willi Weber, empresário de Michael Schumacher.
Foi um erro. A Draco não estava preparada para o salto sem escalas para a F-3000, Campos não fez um bom campeonato e o fim dessa história foi trágico. Na última volta da última etapa da temporada de 1995, em Magny-Cours, disputando o décimo lugar, que nem pontos dava, Marco sofreu um gravíssimo acidente e morreu. Seu carro decolou na traseira do italiano Thomas Biagi, capotou e caiu de ponta-cabeça sobre a mureta de proteção. Ele tinha 19 anos.
A Draco seguiu sua vida, outros brasileiros passaram por lá, mas em 2015 o time parou de competir e se transformou numa empresa de marketing esportivo. Hoje tem, como uma de suas parceiras, a MP Motorsport.
E, assim, chegamos à "nova Draco". A MP é holandesa, fundada em 1994, e foi a porta de entrada de dois pilotos brasileiros na F-2: Sérgio Sette-Câmara e Felipe Drugovich. O primeiro chegou a ganhar corridas pela equipe e hoje está na Fórmula E. O segundo chegou em 2020, saiu em 2021, voltou neste ano e conquistou o título da categoria, assinando com a Aston Martin como reserva na F-1.
Agora, outro brasileiro faz as malas para defender o time laranja: o brasiliense Pedro Clerot, 15 anos, que acabou de se sagrar campeão da Fórmula 4 nacional. A categoria estreou neste ano no Brasil com um grid de 14 carros e 18 etapas. O equipamento é o mesmo usado nas séries europeias, atribui pontos na jornada para a superlicença e é homologada pela FIA.
Clerot venceu sete corridas, subiu ao pódio 11 vezes, fez quatro poles e dominou o campeonato. Correndo com o número #69 da equipe Full Time (as equipes foram sorteadas entre os pilotos inscritos), terminou a temporada com 276 pontos, contra 213 de Lucas Staico, que neste domingo venceu a última etapa de 2022 em Interlagos. Pela MP, no ano que vem, Clerot vai disputar a F-4 Espanhola, que tem um nível mais compatível com as necessidades de ascensão rumo à F-3, depois à F-2 e, quem sabe, à F-1.
O "quem sabe" na última frase aí em cima é proposital e se fosse possível seria grafado em negrito e letras vermelhas gigantescas. Porque não tem a menor intenção de responder à recorrente pergunta "quem é o próximo brasileiro na F-1?", "em quem temos de ficar de olho?", "quem está vindo por aí?" e coisas do gênero. Clerot ganhou um campeonato relativamente fácil e embora os números chamem a atenção, é preciso medir forças com a molecada na Europa antes de sair por aí dizendo que o Brasil descobriu um novo Senna, Piquet ou coisa que o valha.
Na F-2, em 2023, por enquanto há apenas um brasileiro confirmado, Enzo Fittipaldi. O neto de Emerson é quem está mais perto de virar alguma coisa, porque há alguns meses assinou um contrato promissor com a Red Bull para fazer parte de sua academia de jovens pilotos, e estará na Carlin — um time forte com chances de brigar na frente. Enzo está de olho em 2024 porque é quando uma vaga se abre na AlphaTauri, a filial da Red Bull — o contrato de Yuki Tsunoda chega ao fim e o japonês não empolga ninguém. Helmut Marko, eminência parda da Red Bull, já avisou que se Enzo for campeão da F-2, a chance de estar na F-1 na temporada seguinte é muito grande.
Seja como for, acompanhar as trajetórias de Clerot na Espanha e de Enzo na F-2 — mais fácil, as corridas passam na TV — será exercício interessante no ano que vem para aqueles que esperam há anos pela volta do Brasil ao mapa-múndi das pistas.
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