Parece impossível, mas não é: peixes também podem se afogar

Peixes podem se afogar? Apesar de parecer impossível, a resposta é sim. E as mudanças climáticas podem tornar isso mais comum.

Como ocorre com todos os animais, a respiração (ou seja, trocas gasosas de oxigênio e gás carbônico) é fundamental para a vida. No caso dos peixes, ela ocorre, na maioria das espécies, por meio da passagem de água com oxigênio dissolvido pelas brânquias —conhecidas popularmente como guelras.

Se houver diminuição do oxigênio dissolvido na água, o peixe pode "se afogar" e morrer por sufocamento.

Ilustração da respiração marinha da maioria dos peixes através de brônquios com trocas gasosas
Ilustração da respiração marinha da maioria dos peixes através de brônquios com trocas gasosas Imagem: Reprodução/ Acervo pessoal/ José Sabino

Já aconteceu?

Em junho, milhares de peixes foram encontrados mortos na costa do Golfo do México, no estado do Texas (EUA), devido à alta temperatura da água na região. Eles surgiram boiando aos montes, conforme mostrou o Parque Municipal Quintana Beach na ocasião.

Temperatura tem relação com O2. Se a temperatura da água sobe, há maior agitação molecular, o que resulta na diminuição da pressão parcial de oxigênio dissolvido e, no limite, isso pode levar os animais —como peixes—, à hipóxia, ou seja, à diminuição da oferta de oxigênio aos tecidos.

O oxigênio é essencial para as funções das células. Se a queda de oferta for muito intensa, isso pode levar à redução da saúde dos tecidos e, por falta de oxigênio, o organismo pode morrer, explica o biólogo José Sabino, professor da UEMS (Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul).

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"Nos ambientes aquáticos [tanto marinhos quanto os de água doce], os organismos usam o O2 dissolvido na água para respiração", ressalta o doutor em ecologia, que trabalha com história natural e comportamento de peixes.

Mas é preciso diferenciar: O O2 usado para a respiração dos organismos aquáticos não é o oxigênio da molécula de água H2O e sim o O2 dissolvido "nos espaços" existentes entre as moléculas de água.

Quando ocorre o aumento da temperatura da água, os peixes —organismos cuja temperatura é regulada pelo ambiente— aumentam seu metabolismo, mas paradoxalmente pode haver perda de O2 dissolvido no ambiente e consequente estresse dos organismos.

"Se esse aumento de temperatura for superior aos limites de tolerância dos peixes, eles podem morrer", diz Sabino.

Riscos para os peixes

Os peixes representam o maior grupo de animais vertebrados do planeta: são aproximadamente 33 mil espécies, praticamente a metade de todos os vertebrados. Mas não são espécies homogêneas, afirma Sabino.

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Há espécies muito resistentes à baixa de oxigênio (com adaptações como respiração acessória), enquanto outras são bem sensíveis (pouco resistentes à baixa de oxigênio). Veja os tipos:

Algumas espécies de peixes têm respiração acessória: a piramboia, por exemplo, tem respiração pulmonar, e o pirarucu e o poraquê têm estruturas auxiliares na boca que ajudam/combinam a respiração branquial com a respiração aérea, ampliando as trocas gasosas. Espécies marinhas, como as que vivem em poças de maré, também resistem bem às altas temperaturas.

Outras têm maior sensibilidade às baixas de O2 dissolvido, como espécies de águas frias (as trutas, não nativas do Brasil, são um exemplo).

Mudanças climáticas

O aumento da temperatura das águas nos oceanos e rios representa um risco para os peixes, já que a maioria deles tem respiração branquial, ou seja, são nessas estruturas que ocorrem as trocas gasosas afetadas com águas mais quentes.

Será que espécies marinhas de peixes conseguiriam se adaptar à nova realidade de altas temperaturas das águas? A resposta é complexa.

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"As mudanças climáticas já estão presentes e pressionam negativamente muitas espécies, sejam marinhas ou continentais. O tempo biológico evolutivo é 'muito lento' e adaptações levam gerações e gerações para acumular alguma mudança populacional", diz Sabino.

Já as alterações ambientais são "muito mais rápidas" e é possível que tenhamos perda de espécies, ou pelo menos reduções expressivas das espécies mais sensíveis.

"Com as mudanças climáticas, que geram extremos de temperatura como os recordes registrados nos oceanos recentemente, é possível que muitas espécies mais sensíveis sofram consequências", diz o especialista.

Entretanto, mesmo em um cenário de pressões climáticas sobre muitas espécies de peixes, o grupo é tão variado que muitas delas exibem adaptações inclusive para a hipóxia.

Isso é especialmente detectado em peixes da Amazônia e do Pantanal. Por serem ambientes quentes, ao longo do processo evolutivo houve a seleção de estruturas que permitem que eles sobrevivam em condições de temperaturas mais elevadas.
José Sabino, professor da UEMS

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