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"Pretos e dinheiro são palavras rivais? Não são!", afirma Gabriela Chaves

A economista Gabriela Mendes Chaves foi convidada do painel "Decodificando os códigos do empreendedorismo" - Divulgação
A economista Gabriela Mendes Chaves foi convidada do painel "Decodificando os códigos do empreendedorismo" Imagem: Divulgação

Isabella Garcia

Colaboração para Ecoa, de São Paulo

27/11/2020 10h27

Devido ao isolamento social causado pela chegada do novo coronavírus, a Feira Preta está com toda a sua programação 100% virtual, porém não menos relevante. Com curadoria de Rosyane Silva, o painel "Decodificando os códigos do empreendedorismo" reuniu ontem (25) Adriana Barbosa, a idealizadora do festival, o Konrad Dantas, mais conhecido como Kondzilla, dono do maior canal de música do Youtube do mundo, a Gabriela Mendes Chaves, economista e fundadora da NoFront Educação Financeira, que usa letras de rap para criar um pertencimento financeiro a pessoas periféricas e a Nathália Rodrigues, mais conhecida como Nath Finanças, orientadora financeira para baixa renda.

O informativo "Desigualdades Sociais por Cor ou Raça no Brasil", divulgado pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) revela que os negros são 75% entre as pessoas mais pobres. Quando essa análise se volta para detectar as pessoas mais ricas, os brancos são 70%.

Para a população preta, a saúde financeira ainda é um grande tabu, segundo a Gabriela e a Nathália. Essas pessoas geralmente vivem nas periferias e estão acostumadas a viver com pouco recurso. O assunto geralmente aparece no final do mês para tentar organizar como será a dinâmica de pagamento das contas. Como não sobra dinheiro, falar sobre educação financeira e investimentos é um assunto muito distante.

Por muitos anos, Nath Finanças não conversava sobre o assunto com os seus familiares. "A gente não sabe o que os nossos pais faziam para pagar as contas, pois isso não era compartilhado. Eles organizavam as contas do jeito deles e não falavam nada", comenta. Quando ingressou na faculdade de administração, ela passou a entender sobre educação financeira, e, a partir desse momento, decidiu usar seu conhecimento para ajudar pessoas a não se endividarem.

Foi no curso de economia que Gabriela Mendes Chaves percebeu que era possível conquistar as coisas por meio do investimento. Isso foi uma motivação para ela se debruçar nos estudos e entender esse universo. A partir daí, resolveu quebrar esse imaginário de que investimento não é coisa de milionário, "ele pode e deve ser feito pela dona de casa."

Existe um estereótipo social que distancia a população negra dessa questão. "Cresci ouvindo que preto e dinheiro não se combinavam e com uma certa rivalidade, pois quando um negro ascendia socialmente, era visto como capitalista", relata Adriana. Ainda hoje, quando a gente ascende, dá a sensação que não podemos usufruir disso, por isso precisamos nos desconstruir".

Apesar desse assunto ainda existir, a idealizadora da Feira Preta enxerga que a nova geração está ressignificando essa questão e celebra essa conquista.

Nathália atribui essa mudança à internet, que deu aos jovens acesso o conhecimento, a entender o que é tesouro direto, um investimento na bolsa de valores. Assim, começam a criar uma consciência financeira. Porém ela alerta: "não é porque um amigo está investindo que você tem que fazer o mesmo. Não é um vídeo de cinco minutos de como investir na bolsa de valores que vai te convencer. É necessário analisar as possibilidades com calma e fazer as coisas no seu tempo."

Gabriela parafraseia um trecho da canção dos Racionais MC's para analisar essa questão. "'Preto e dinheiro são palavras rivais?' Não, não são palavras rivais, e a gente precisa entender como se situar dentro do jogo para conseguir dar saltos. A educação financeira é uma transformação de geração. Hoje em dia, temos um movimento de que sim vamos falar de dinheiro, o que não existia no tempo dos nossos pais, onde a educação e o acesso à informação era extremamente difícil. Hoje a internet democratiza a informação e faz a juventude se questionar de uma série de coisas que a sociedade brasileira não via. A gente já está no espaço, só precisamos entender como vamos canalizar tudo isso e ter um avanço geracional."

Se nossos pais garantiram a nossa educação, o que vamos garantir para as próximas gerações?

Gabriela Mendes Chaves, economista e fundadora da NoFront Educação Financeira

A ascensão social não anula o racismo. Kondzilla relata uma série de episódios que mesmo no seu carro de luxo, em shoppings de alto padrão ou até na Galeries Lafayette, reduto do luxo em Paris, continua sendo perseguido pelos seguranças e confundido com os funcionários do local, pois a população acredita que um homem negro nesses locais está a trabalho e nunca se divertindo.