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Mara Gama

REPORTAGEM

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Consumidor quer comida em casa sem plástico descartável

Embalagem de isopor jogada na rua em São Paulo - Mara Gama
Embalagem de isopor jogada na rua em São Paulo Imagem: Mara Gama

Colunista do UOL

15/04/2021 06h00

Chega de tralha inútil e poluente. Uma pesquisa divulgada no início desta semana mostra que a maioria das pessoas que pede comida em casa gostaria de receber seus pedidos sem os plásticos habituais e que uma parcela já deixou de fazer pedidos em algum fornecedor pelo excesso de plástico de uso único que vem de lambuja.

O trabalho em casa e o isolamento social alteraram o fluxo da comida pronta dos escritórios para as moradias e turbinaram o mercado dos aplicativos de refeições no país. Com isso, os gastos com apps desse tipo cresceram 187% desde o início da pandemia. O iFood, que tem 70% do mercado, fez 48 milhões de entregas por mês em 2020 e aumentou sua oferta de restaurantes cadastrados em 63%. Esses dados são de um levantamento da Mobills Labs no Brasil.

Junto com cada pedido de refeição, no entanto, compulsoriamente, chegam talheres, copos, misturadores, canudos e sachês, que, se tinham alguma serventia possível no improviso das salas das empresas, são inúteis no ambiente doméstico. E aumentam o problema do acúmulo de resíduos que a pandemia vem acelerando.

Preocupadas com o aumento do plástico circulante e depois que duas enquetes em suas páginas detectaram o "incômodo" com o excesso de descartáveis entre os seus frequentadores, as equipes brasileiras do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) e da ONG Oceana resolveram entender melhor esse comportamento e testar a adesão a algumas alternativas.

O resultado dessa investigação está na pesquisa "Percepções sobre o plástico entre usuários de aplicativos de delivery". Encomendado ao Ipec (Inteligência em Pesquisa e Consultoria), o levantamento foi feito do dia 6 ao dia 14 de março de 2021, com 1.000 internautas brasileiros com 16 anos ou mais, das classes A, B e C, de todas as regiões, que fizeram pedidos por app de comida nos últimos seis meses.

Metade dos entrevistados diz que aumentou a frequência de pedidos por causa da pandemia: 30% declaram pedir comida pronta por aplicativo a cada 15 dias, 25% de uma a duas vezes por semana, 4% de três a quatro vezes por semana e 40% uma vez por mês ou menos.

Entre os dados mais relevantes, estão o de que 72% das pessoas gostariam de receber seus pedidos sem plástico descartável e que 15% deixaram de comprar em algum estabelecimento pelo excesso plástico de uso único que vem de lambuja no pedido.

Os campeões de inutilidade são canudos e mexedores: 53% dos entrevistados dizem não querer receber. Depois vêm garfos, facas, colheres, com 52% de rejeição; e copos de plástico com 47% (a pesquisa permitia apontar vários itens).

Mais da metade dos entrevistados gostaria que as sacolas de plástico (59%) e os recipientes de isopor (52%) fossem substituídos por materiais alternativos e menos poluentes que o plástico.

A pesquisa faz parte da campanha #DeLivreDePlástico, lançada em dezembro passado. A campanha pede que os aplicativos se comprometam a promover entregas livres de plástico e sugere metas quantitativas, como ter 100% dos pedidos com envio apenas a pedido do consumidor de guardanapos, canudos plásticos, sachês até 2023; ter ao menos 30% das entregas feitas com embalagens retornáveis e ter 100% dos restaurantes realizando entregas em sacolas retornáveis ou sem plástico até 2025. A campanha já contatou os dois maiores apps do mercado, iFood e UberEats, e não obteve resposta formal.

Para o coordenador da campanha Mares Limpos do Pnuma, Vitor Leal Pinheiro, os aplicativos têm papel fundamental para a eliminação dos descartáveis por seu contato frequente e a capacidade de influência sobre o modo de trabalho dos restaurantes associados a eles.

A pesquisa testou a adesão a essa ideia e obteve aval dos entrevistados: 86% declararam que os apps têm a mesma ou ainda mais responsabilidade que os restaurantes e deveriam se unir para oferecer aos clientes melhor experiência com esses serviços e 82% acreditam que as empresas de entrega deveriam deixar à escolha dos clientes a entrega dos itens de plástico. Ainda de acordo com o levantamento, 79% concordam que os aplicativos deveriam destacar em uma categoria específica os restaurantes que usam itens com materiais alternativos ao plástico e/ou embalagens retornáveis e 77% acreditam que os aplicativos deveriam se comprometer publicamente com metas de redução de itens de plástico descartável nos pedidos de refeições prontas.

De acordo com o estudo "Um Oceano Livre de Plástico", publicado pela ONG Oceana em dezembro passado, o Brasil gera mais de 325 mil toneladas de lixo plástico que vão parar no oceano, com danos ambientais e impactos na pesca e no turismo. O país é o maior produtor de plásticos da América Latina e produz anualmente 3 milhões de toneladas de plásticos de uso único, dos quais 13% são pratos, copos, talheres, sacos plásticos e canudos, que somam 200 bilhões de itens descartáveis por ano. A maior parte desse material não é reciclada.

No último dia 25 de março, o iFood lançou um plano de impacto ambiental declarando que vai reduzir o uso de plástico e se tornar neutro na emissão de carbono até 2025 e prevendo investimentos em veículos elétricos, no desenvolvimento de embalagens sustentáveis e na construção de uma nova central de triagem semi-mecanizada, em São Paulo, com potencial de aumentar as taxas de reciclagem na cidade e aumentar a renda dos cooperados.

Segundo a empresa, em dezembro foi iniciado teste com opção do projeto iFood Regenera, em que o cliente pode recusar talher de plástico, e 90% do público fez essa escolha.

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Nos dias 28 e 29 de abril, o Instituto de Embalagens, em São Paulo, promove o workshop online Embalagem & Sustentabilidade para tratar de temas como análise de ciclo de vida (ACV), reciclagem, rotulagem ambiental e uso de conteúdo reciclado pós-consumo nas embalagens, entre outros.