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Mara Gama

Design para evitar lixo, emissões e desperdício

Posto de reabastecimento de água do MyMizu - MyMizu.com
Posto de reabastecimento de água do MyMizu Imagem: MyMizu.com

Colunista do UOL

14/01/2021 04h00

O Fairphone, criado na Holanda, usa componentes plásticos reciclados para fazer aparelhos reparáveis, com partes modulares (o que facilita a desmontagem e troca de peças) e feitos para durar - desde 2013, só foram lançados três modelos. O Pimp my Carroça, do artista brasileiro Mundano, quer tirar os catadores de lixo da invisibilidade e batalha por remuneração justa para os serviços que eles executam pelo aplicativo Cataki. A plataforma mexicana Ecolana conecta consumidores, marcas, catadores e centros de reciclagem com um guia digital e um app. O MyMizu é um aplicativo de recarga de água do Japão. Ele localiza fontes gratuitas nas redondezas para que as pessoas possam reabastecer suas garrafas em vez de comprar água em recipientes plásticos.

Todos esses projetos atuam localmente, com soluções desenhadas para resolver problemas específicos, embora tenham em comum evitar a produção de lixo, sua disposição inadequada ou o desperdício de recursos. Mostram que as formas de transição para a economia circular não terão a mesma aparência nem acontecerão no mesmo ritmo em todos os lugares.

Essas iniciativas são usadas como exemplos para inspirar e chamar participantes para o concurso internacional No Waste Challenge, lançado na última terça, 12 de janeiro.

O desafio é uma parceria entre a plataforma holandesa de seminários, eventos, concursos e ativação de projetos What Design Can Do (WDCD) e a Ikea, a marca de origem sueca que popularizou o desenho moderno escandinavo e o mobiliário de baixo custo e que hoje tem mais de 400 lojas espalhadas pelo mundo (a próxima deve abrir no México no primeiro trimestre deste ano e será a primeira na América Latina).

Os candidatos podem enviar suas propostas online até abril, em quatro categorias: comunicação, produtos, espaços e sistemas e serviços. Os 10 vencedores levam 10 mil euros em financiamento e acompanhamento para aprimorar seus projetos e auxiliar a implementação em 2022.

O concurso sugere três eixos para as propostas:

  1. extrair menos - como usar menos recursos naturais e consumir de forma mais consciente?
  2. fazer melhor - como fazer produtos e materiais duráveis e regenerar sistemas naturais?
  3. atuar de maneira inteligente - como usar o lixo como recurso ou descartá-lo de forma mais responsável?

Para os candidatos brasileiros, foi feito um resumo dos principais problemas ambientais e de resíduos no Rio e em São Paulo, que pode auxiliar na direção de soluções de maior impacto, conta Bebel Abreu, da Mandacaru Design, que representa a What Design Can Do no Brasil.

A convocatória do concurso chama na chincha a comunidade do design para apresentar projetos que reduzam o desperdício e redesenhar sistemas de extração, produção e consumo ou tornar esses sistemas restauradores.

A ideia é que, historicamente, os designers incentivaram a superprodução, a extração e a busca sem fim por novidades, fazendo a roda do consumismo girar cada vez mais rápido, mas que o design também tem o poder de aumentar a conscientização e criar as mudanças necessárias para um mundo mais sustentável.

"Os designers estão em uma posição única para mudar a forma como as coisas são feitas e de que são feitas. Um número crescente de criativos já assumiu um papel ativo na transição para uma economia circular, experimentando materiais e processos", diz o fundador do WDCD Richard van der Laken.

O desafio convida à reflexão ampla sobre o desperdício como sintoma de problemas maiores e mais perversos e diz que para criar uma mudança de sistema real é preciso ousar abordar alguns dos "elefantes na sala", que enumera:

  • O capitalismo se mostrou incapaz de fazer as mudanças necessárias. O design pode ajudar a adotar diferentes sistemas, como o conceito de bens comuns?
  • O consumo excessivo e a superprodução estão levando o planeta além de seus limites. Como estimular alternativas que não impliquem comprar e possuir produtos?
  • A classe média global deverá ter 5,5 bilhões de pessoas até 2030. Como lidar com os comportamentos e valores destrutivos dessa classe antes que seja tarde demais?
  • A globalização gerou cadeias de abastecimento extremamente complicadas e vulneráveis. Como repensar fluxos de comércio e reduzir as emissões de gases de efeito estufa no processo?
  • A noção de "suficiência" é a resposta lógica ao mito do crescimento perpétuo. No entanto, não existe uma visão alternativa atraente de como isso pode parecer. Como as lideranças criativas podem ajudar a imaginar uma economia circular que funcione para as pessoas e para o planeta?

"O design nos jogou nessa situação caótica, agora precisa nos ajudar a sair dela". A frase do designer canadense Bruce Mau ("design got us into this mess, now it needs to get us out of it") é usada como mote para o concurso.

Para um mundo já abarrotado de lixo que segue firme na produção de bens descartáveis e na queima de combustíveis fósseis como se o espaço livre, o ar, a água, o solo, as florestas, a regeneração e os recursos naturais fossem infinitos, é uma ótima escolha.