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Inspiração pra fazer da atividade física um hábito


Ele correu maratona, fez tatuagem e viajou 10 horas de avião com um AVC

Fábio Ferri sofreu um AVC em 2019 e voltou a correr uma maratona este ano, em Chicago - Arquivo pessoal
Fábio Ferri sofreu um AVC em 2019 e voltou a correr uma maratona este ano, em Chicago Imagem: Arquivo pessoal

Bárbara Therrie

Colaboração para VivaBem

18/11/2022 04h00

Em 2019, Fábio Ferri, 48, viajou para Nova York na expectativa de fazer a melhor maratona da sua vida. Porém, seus planos foram estragados por uma forte dor de cabeça que começou na véspera da corrida —e, dias depois, ele descobriu tratar-se de um AVC. O publicitário ficou 12 dias na UTI, mas não teve sequelas, voltou a correr e este ano completou novamente uma maratona, batendo o próprio recorde. A seguir, ele conta sua história:

"Sempre gostei de praticar atividade física. Mas, em 2009, quando minha esposa engravidou, parei de fazer exercícios e descuidei da alimentação. Comecei a engordar e cheguei a 115 kg.

Disposto a voltar a ter hábitos saudáveis, decidi correr e o esporte mudou minha vida. Ganhei saúde física e mental, emagreci, fiquei mais disciplinado e aprendi a lidar melhor com o estresse e a ansiedade. A corrida virou minha terapia.

Como muitos corredores, comecei nas distâncias mais curtas (5 km e 10 km) e fui evoluindo. Em 2015, fiz minha primeira meia maratona (21,097 km) e isso me motivou a intensificar os treinos para correr uma maratona.

Estreei nos 42,195 km em 2017, na Maratona de Chicago (EUA). Durante o percurso, tive câimbra e precisei de atendimento médico. Sofri muito para correr os últimos 7 km, mas, apesar das dificuldades, a experiência foi sensacional, terminei a prova em 3h53min. A partir daí, decidi que tatuaria o logo, a data e o tempo de todas as maratonas que participasse.

Em 2018, fiz a Maratona de Berlim (Alemanha) e melhorei meu tempo na distância em 29 minutos —cruzei a linha de chegada em 3h24min. No ano seguinte, em janeiro, completei a Maratona da Disney (EUA) em 3h21min e também me inscrevi na Maratona de Nova York, a maior do mundo.

Fábio, volta aos treinos após AVC - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Imagem: Arquivo pessoal

Fui para NY no auge da minha forma física, meus exames estavam todos ok e a expectativa era eu fazer a melhor maratona da minha vida. Cheguei ao hotel no sábado, véspera da prova. À noite, tive uma dor de cabeça muito forte, como nunca tinha sentido antes. Tomei um remédio e fui dormir.

Acordei ainda mal e fui para a corrida com a cabeça latejando. Eu falava para mim mesmo: 'Eu treinei quatro meses para estar aqui, se concentra, esquece a dor e vai!'

No quilômetro 37, tive que fazer uma pausa para ir ao banheiro e voltei me sentindo ainda pior. Mesmo assim, segui correndo. Minha previsão era terminar a prova em 3h09min, mas finalizei os 42 km em 3h22min.

Tatuagem - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
A tatuagem que Fábio fez após correr a Maratona de Nova York
Imagem: Arquivo pessoal

Após cruzar a linha de chegada, tive uma crise de hipotermia, vomitei e fui atendido no posto médico. A dor de cabeça não parava. Voltei para o hotel, tomei um banho quente e fui fazer a tatuagem que prometi.

A última coisa de que eu me lembro nesse dia foi de encontrar o pessoal que treina na mesma assessoria esportiva que eu em um bar, para confraternizarmos. Tive um apagão ali.

Um amigo que estava comigo contou que eu fiquei parado, olhando para o nada e tomando uma cerveja —o que foi estranho, porque não bebo nada alcoólico. Ele notou que tinha algo de errado e me levou ao hotel. Não cogitei ir ao hospital lá nos EUA, só queria voltar para minha casa.

Na segunda, peguei um voo de 10 horas para o Brasil. Cheguei na madrugada da terça e só fui ao pronto-socorro à noite, após insistência de minha esposa, quando falei que a dor de cabeça estava insuportável.

Fabio, maratona de NY - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
O pôster de Fábio na Maratona de Nova York
Imagem: Arquivo pessoal

O médico me deu um soro, disse que provavelmente era por conta do esforço físico da maratona e me mandou de volta para casa.

Na quarta, trabalhei o dia todo com dor de cabeça e decidi retornar ao hospital. Contei ao médico que já fazia quatro dias que estava mal.

Inicialmente, ele suspeitou de meningite e pediu uma tomografia no crânio. O resultado foi surpreendente: tive um AVC (acidente vascular cerebral) hemorrágico, aos 45 anos.

Minha reação foi de espanto: 'Como assim? Tive um AVC e corri 42 km, fiz uma tatuagem, enfrentei 10 horas de voo!'

O neurologista explicou que eu tive o que chamam de AVC em evolução. Segundo ele, o primeiro sinal de alerta do AVC foi na véspera da corrida, quando senti a dor de cabeça pela primeira vez. Ao longo dos dias, a doença evoluiu, ou seja, corri 42 km e viajei de avião com um AVC

Ao me levar para a UTI, o médico disse que meu anjo da guarda estava de plantão, pois eu poderia ter morrido.

Fiquei 12 dias internado na UTI. Não fiz nenhum procedimento cirúrgico e esperei o próprio cérebro drenar o sangue. Tomei várias medicações e passei por uma bateria de exames, mas os médicos não conseguiram identificar a origem do AVC. Graças a Deus, não fiquei com nenhuma sequela.

Fábio, internado - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Imagem: Arquivo pessoal

A partir daí, iniciei um acompanhamento neurológico, nefrológico e cardiológico em conjunto com meu médico do esporte.

Busquei a segunda opinião de um neurologista para tentar entender o que tinha acontecido, mas ele não me ajudou a encontrar a resposta e ainda disse que eu nunca mais poderia voltar a correr. Saí do consultório arrasado.

Por recomendação dos médicos, fiz uma pausa e fiquei sete meses sem fazer atividade física. Foi estressante ficar parado. Só pude voltar depois de fazer vários exames e receber liberação médica para treinar.

Tive que recomeçar. Primeiro, voltei para academia e, depois de um mês, para a assessoria de corrida. No começo, não aguentava correr 3 km e pensei que nunca mais conseguiria fazer uma maratona novamente. Às vezes, ficava desanimado, mas quatro amigos me incentivavam e iam correr comigo em um parque perto de casa. Tive de ter paciência, ser resiliente e trabalhar muito bem minha cabeça.

Fabio, um ano depois de ter AVC - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Fábio, um ano depois de ter AVC
Imagem: Arquivo pessoal

Voltei a treinar para fazer os 42 km e, em 9 de outubro de 2022, lá estava eu novamente nos EUA para fazer minha primeira maratona pós-AVC, em Chicago. A prova, na verdade, era para ter sido realizada em 2020, mas foi adiada por causa da pandemia.

No começo, fiquei com medo de passar mal. Meu objetivo era terminar a prova bem, mas meu desempenho foi melhor do que eu esperava. Corri os 42 km em 3h17min e bati meu recorde pessoal. Fiquei muito feliz e me senti realizado.

Sou muito grato a Deus que me deu uma segunda chance de vida, e ao apoio da minha esposa, filha, família, amigos e de todos os profissionais que me ajudaram e acreditaram em mim.

Aprendi duas coisas nesse processo: a primeira é que nunca devemos ignorar um sintoma, por mais simples que ele pareça ser. A segunda é que devemos acreditar nos nossos sonhos."

Fabio Ferri maratonista - Arquivo pessoal  - Arquivo pessoal
Fábio com a medalha que conquistou na Maratona de Chicago
Imagem: Arquivo pessoal

1 - Como alguém saudável pode ter um AVC?

O acidente vascular cerebral (AVC) não é comum em pessoas saudáveis, que praticam exercícios regularmente, se alimentam bem, não fumam e não bebem. No caso de um atleta (mesmo amador), é preciso investigar se existe alguma condição que a pessoa desconhece e pode levar a um AVC, como uma cardiopatia congênita, pressão alta e arritmia cardíaca.

2 - Quais são os sinais mais comuns de um AVC durante a prática de exercícios?

Estes sintomas da doença são universais e podem aparecer em qualquer situação:

  • dor de cabeça súbita e intensa;
  • dificuldade para falar e entender o que outros estão falando;
  • perda da coordenação motora;
  • paralisia ou dormência no rosto, braço ou perna, em apenas um lado do corpo;
  • tontura que pode ser acompanhada por vômitos;
  • visão turva ou perda de visão em um ou ambos os olhos.

Caso a pessoa apresente alguns desses sintomas, é essencial procurar um serviço de saúde o mais rapidamente possível.

3 - É perigoso fazer atividade física intensa após se recuperar de um AVC?

Se o paciente teve um AVC isquêmico, é importante se certificar de que não existe qualquer sinal de arritmia, que durante o exercício realizado após a recuperação do AVC pode desencadear outro episódio de acidente vascular cerebral.

Caso a pessoa tenha sofrido um AVC hemorrágico, antes de reiniciar as atividades físicas é fundamental verificar se a pressão arterial está regulada e se não existe nenhum quadro de aneurisma, fatores que podem desencadear outro AVC.

4 - Quanto tempo após um AVC a pessoa pode voltar a fazer exercício físico?

Se a atividade física for de baixo impacto (natação, bike) e o indivíduo estiver bem recuperado, poderá fazer exercícios leves dentro de cinco dias. Mas isso pode variar, tudo depende do estado geral do paciente, que só poderá ser atestado pelos médicos cardiologista e neurologista. Não é recomendado voltar a fazer exercícios sem liberação médica.

5 - Como deve ser o retorno aos treinos após um AVC?

Para quem teve um AVC, a atividade física é importante para que o corpo se regenere, mas a intensidade precisa ser revisada. Nesse sentido, o mais indicado é se certificar de que o quadro está estável e o paciente esperar algum tempo até voltar a praticar exercícios físicos de alta intensidade. O retorno aos treinos deve ser gradual.

6 - Qual o perigo de demorar para buscar socorro após um AVC?

Um AVC é sempre preocupante e deve ser encarado como emergência médica. O socorro precisa ser imediato pois, quanto maior a demora para chegar a um hospital, maior o risco de a pessoa ter sequelas graves ou morrer.

Entre as sequelas mais comuns provocadas por um derrame estão dificuldade de falar; incapacidade de reconhecer pessoas e objetos, mesmos sem ter sofrido comprometimento da visão; perda de memória de curto e longo prazo; alterações motoras e a perda da capacidade de realizar movimentos simples.

FONTE: Wanderley Cerqueira de Lima, neurologista e neurocirurgião do Hospital Albert Einstein e da Rede D'Or, diretor do WCL Neurocirurgia.

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