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Paola Machado

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Anticoncepcionais orais prejudicam os resultados do treinamento físico?

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Imagem: iStock

Paola Machado e Raphael Carvalho*

Colunista de VivaBem e colaboração para o VivaBem

01/06/2022 04h00

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Muitos especialistas afirmam que os anticoncepcionais orais prejudicam o resultado de hipertrofia muscular e emagrecimento, contudo, fazer essa afirmação é muito simplista, superficial e pode ser um erro.

Os anticoncepcionais orais de segunda geração (que surgiram após 1970) podem aumentar a expressão dos fatores reguladores ligados ao crescimento muscular (miogênicos) e o número de células satélites que estão envolvidas no reparo e regeneração das fibras musculares, além da elevação de mionúcleos que permitiria o crescimento do músculo.

Então, os anticoncepcionais, como os de segunda geração (atualmente estamos na quarta geração desses medicamentos), poderiam até mesmo contribuir para a hipertrofia muscular e isso seria por conterem a progestina Levonorgestrel ou Norgestrel, que tem alta afinidade para a ligação ao receptor androgênico.

Além disso, o estrogênio também é um ligante para o receptor androgênico, assim, a ativação do receptor androgênico por meio da ligação de progestina ou etinilestradiol poderia ser o motivo do aumento da expressão de RNA mensageiro do receptor androgênico.

Isso é inclusive mostrado em estudos, como o de Oxfeldt e colaboradores, publicado em 2020. A pesquisa avaliou os ganhos em um treinamento de 10 semanas de mulheres que usavam anticoncepcionais e mulheres que não usavam.

Os resultados mostraram que ambos os grupos tiveram hipertrofia muscular de maneira significativa, no entanto, a expressão do RNA mensageiro do fator regulador muscular-4 (regulador do crescimento muscular) e de células satélites nas fibras do tipo II foram significativamente maiores nas mulheres que faziam uso de anticoncepcionais.

Dessa maneira, a ativação da via de sinalização do receptor androgênico pode ser uma das vias envolvidas na mediação de uma resposta anabólica melhorada nas mulheres que usavam anticoncepcionais de segunda geração.

Assim, o impacto dos anticoncepcionais no treino precisa ser mais aprofundado, a fim de não ficarmos na superficialidade de muitos profissionais que afirmam de maneira negligente que mulheres que buscam a melhora da saúde não deveria usar anticoncepcionais.

Anticoncepcional aumenta risco de morte?

Até mesmo quando se fala em maiores riscos de mortalidade em mulheres que fazem uso de anticoncepcional as considerações devem ser mais aprofundadas do que muitas vezes são feitas.

O estudo de Charlton e colaboradores foi feito com mais de 121 mil participantes, que foram acompanhados por 36 anos. Os pesquisadores concluíram que a mortalidade por todas as causas não diferiu significativamente entre as mulheres que já usaram contraceptivos orais e as que nunca usaram.

O uso de contraceptivos orais foi associado a certas causas de morte, incluindo aumento das taxas de morte violenta ou acidental e mortes por câncer de mama, enquanto as mortes por câncer de ovário foram menos comuns entre as mulheres que usaram contraceptivos orais, mas esses resultados referem-se a formulações de anticoncepcionais orais anteriores com doses de hormônio mais altas, em vez das formulações de terceira e quarta geração, agora mais comumente usadas, com doses mais baixas de estrogênio.

Em um outro estudo publicado em 2019, Nur e colaboradores avaliaram o impacto a longo prazo do uso de contraceptivos orais na mortalidade por todas as causas e por câncer.

Os resultados da pesquisa sugerem que as mulheres com câncer de mama que já foram usuárias de contraceptivos orais, em comparação com as que nunca usaram contraceptivos orais, não apresentaram maior mortalidade por todas as causas ou por câncer de mama específico, após o ajuste dos fatores de risco.

*Colaboração Dr. Raphael Carvalho, doutor e mestre em Ciências pela Universidade de São Paulo (USP).

Referências:

Charlton BM et al. Oral contraceptive use and mortality after 36 years of follow-up in the Nurses' Health Study: prospective cohort study. BMJ. 2014; 349: g6356.

Oxfeldt M et al. Molecular markers of skeletal muscle hypertrophy following 10 wk of resistance training in oral contraceptive users and nonusers. J Appl Physiol. 2020 Dec 1;129(6):1355-1364.

Nur U et al. A prospective investigation of oral contraceptive use and breast cancer mortality: findings from the Swedish women's lifestyle and health cohort. BMC Cancer. 2019 Aug 14;19(1):807.